A crise econômica que já fechou 3,2 mil postos de trabalho em 2016 em Caxias do Sul tem reflexos negativos também na saúde pública da Serra. O pronto-socorro do Hospital Pompéia e o Pronto-Atendimento 24 horas (Postão) vêm recebendo, gradualmente, cada vez mais pacientes que poderiam ser atendidos nas 47 unidades básicas de saúde (UBS), distribuídas em diferentes regiões da cidade. As dificuldades financeiras e as demissões, porém, afetam a manutenção dos planos de saúde – quem perde o emprego normalmente fica sem o benefício ou não consegue pagar as mensalidades. Por isso, as duas instituições fazem um apelo: que só procurem a emergência quando for realmente grave.
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– Acaba atrapalhando. Não posso recusar (o atendimento), e com o pronto-socorro cheio, o médico plantonista gasta mais tempo com esses pacientes (de baixa complexidade), trazendo dificuldades a quem realmente tem prioridade – alerta o diretor-técnico do Pompéia, Mário Fedrizzi.
Na semana passada, o hospital pediu, por meio de nota, a colaboração da sociedade para não sobrecarregar os profissionais: "O pronto-socorro é direcionado para urgência e emergência, o que abrange situações de risco iminente de morte, como politraumatizados, grandes queimados, acidentados, suspeita de infartos, derrames, fraturas, crises convulsivas e perda de consciência, entre outras. Entendemos que a instabilidade da economia levou ao desemprego, e, por consequência, à perda dos convênios privados de saúde pelos trabalhadores, o que acaba por sobrecarregar o sistema público de saúde." Além de Caxias, o hospital também é referência em atendimento de alta complexidade para diversas cidades da região.
São casos de menor gravidade contusões leves, dores crônicas, lombalgia e dor de garganta, por exemplo. A secretária municipal de Saúde, Dilma Tessari, reconhece o problema, mas assegura que os cerca de 380 médicos das unidades básicas de saúde (UBSs) têm condições de suprir a demanda normal.
– O Postão, às vezes, é quase um hospital (pela quantidade de gente). As pessoas têm pressa, querem atendimento imediato. O importante é que a prioridade seja a quem precisa mais – esclarece.
'Nunca conseguimos atendimento'
O caso da aposentada Vicentina Munereth ilustra o calvário de quem não pode manter um plano particular e recorre ao Sistema Único de Saúde (SUS). Com dores na nuca e tontura, ela tentou ser atendida na UBS do Diamantino, onde mora, mas desistiu. Na tarde da última sexta-feira, era avaliada na antessala da emergência do Hospital Pompéia, junto com mais de 15 pessoas.
– Nunca conseguimos atendimento, tem de ir de madrugada para tentar. O exame leva um ano. Preferia o bairro, é perto. Mas fazer o quê? Fui para onde me receberiam – argumenta ela.
De acordo com o enfermeiro Eder Madeira, responsável pela emergência do Pompéia, há um médico, dois enfermeiros e cinco técnicos em enfermagem por turno – a cada seis horas as equipes são trocadas. Eles dão conta, em média, de 30 situações graves por dia – o mesmo número de casos não graves. Como são obrigados a atender todo mundo, quem perde são os pacientes à beira da morte.
– O pessoal chega aqui achando que encontrará o especialista e fará os exames. Temos uma fila de semanas de espera para ressonâncias magnéticas e tomografias. Só tratamos a queixa principal, por causa da limitação financeira e de recursos humanos. É preciso conhecer e procurar a rede básica – ressalta Madeira.
O problema é que as UBS, também deficitárias, não dão conta da alta procura de casos corriqueiros como o de Elias Rodrigues de Sá, 27, funcionário de uma empresa de energia elétrica. Com lombalgia, ele recorreu ao pronto-socorro do Pompéia na semana passada, depois de tentativas frustradas no postinho do bairro Serrano.
– Disseram que nem teriam o que fazer e falaram para eu tentar outro lugar. Não conseguia dormir à noite de tanta dor. O diagnóstico é desgaste na coluna. Ao menos serei medicado e obterei atestado – justifica.