A discussão sobre a falta de espaço para apreciadores do som automotivo de Caxias do Sul parece não ter fim. Esperança entre os apreciadores do hobby, o uso de vagas do estacionamento do futuro Ecoparque, localizado próximo ao Jardim Botânico, foi descartado pela Secretaria do Meio Ambiente em uma reunião na Câmara de Vereadores na terça-feira. Sentindo-se marginalizados, os apaixonados por som tentam encontrar um lugar legalizado para aumentar o volume sem incomodar a vizinhança.
– Sabíamos que era uma ilusão, já que o Ecoparque não resolveria nosso problema. Precisamos de apoio dos órgãos públicos para solucionarmos a questão. Nosso sonho é ter um local distante de residências e possível de criar uma boa estrutura para os encontros. Só assim vamos conseguir retirar das ruas os mais de 5 mil adeptos do som automotivo – afirma Leonardo Nascimento dos Reis, 41 anos, empresário e presidente da Associação do Som Automotivo Caxiense.
Para o produtor de eventos Fernando Gomes, 31, Caxias precisa investir em lugares adequados para os jovens se divertirem.
– A prefeitura ajuda em carnaval, rodeios, futebol e academia para idosos, mas esquece dos jovens da cidade. Estamos na luta há anos mas, sem apoio, esbarramos em muita burocracia e nada vai para frente. Só queremos um lugar para realizar as nossas competições, para levar nossa família, tomar um chimarrão e curtir nosso som sem incomodar – conta Gomes, que também é membro da associação.
Ter um lugar seria a solução de muitos outros problemas enfrentados, acreditam os associados. A ideia de que quem gosta de som automotivo é baderneiro também seria extinta, avaliam eles.
– A partir do momento que se tem um espaço legalizado, se pode chegar no pessoal que fica na rua e cobrar para que saiam dali. Obviamente, será um trabalho progressivo, mas será possível separar os baderneiros daqueles que são conscientes. Vai ser mais fácil até para a Brigada Militar atuar – diz Karina Ferraso, 34.
Segundo Reis, mais do que acabar com o barulho em áreas residenciais, a associação também quer cadastrar todos os apaixonados pelo som automotivo. Ele lembra ainda que muitos dos que possuem som em seus veículos têm consciência de que há um limite para o volume.
– Mas antes precisamos de um lugar para começar o trabalho de conscientização com esse público, que não tem para onde ir e escolhe as ruas para se divertir. Sabemos que tem algumas exceções, mas a maioria não é baderneiro, somos pessoas do bem, temos família e só queremos nos divertir – ressalta ele.
Mercado de trabalho é prejudicado pelo preconceito
A marginalização do som automotivo estaria afetando também o mercado de trabalho de quem fornece equipamentos e instala os acessórios. Em dois anos, o comércio de Caxias do Sul perdeu 50 lojas de venda de materiais para a prática da modalidade.
– O universo do som automotivo gera empregos para quem trabalha com carpete, instalação de som, pintura de automóveis e reboques, músicos e produtores de evento. Eu vivo desse comércio e precisei parar de investir, porque o trabalho diminuiu. Pode ser a crise econômica, mas o impacto maior é por conta do preconceito. A gente tem família e também não gosta de baderna na frente de casa. As pessoas precisam separar isso, porque nem todo mundo que tem caixas de som no carro fica na rua atrapalhando o sossego dos outros – desabafa Jonatan da Rocha, 30 anos, que trabalha como DJ.
A Associação do Som Automotivo não sabe informar o quanto este mercado movimenta. Mas, para se ter uma ideia, um único evento de carros com som adaptado gira, no mínimo, R$ 15 mil.
– Não é um hobby barato. Um reboque com caixas de som pode custar cerca de R$ 20 mil. Sem contar que tem quem invista muito mais. O pessoal capricha na estética, quer um equipamento bacana, por isso sai caro – afirma o presidente da associação, Leonardo Reis.
Segundo o pedreiro Zenomar Camejo Saraiva, 28, o som automotivo é muito mais do que apenas a prática de ouvir música em volume alto.
– Eu, por exemplo, não invisto em equipamento apenas por gostar de som alto. Eu gasto pela estética, para ter algo bom e bonito. Mas a gente que tem amigos que vivem desse ramo sabe que o preconceito tem prejudicado o mercado. Os preços subiram em função da baixa nas vendas. Se é para investir, quero investir em algo bom, mas nos últimos anos está difícil – conta.
Perturbar o sossego é crime
O problema do sossego seria simples de resolver, afinal, é só baixar o volume. No entanto, o som alto em automóveis parados em ruas de Caxias vira, constantemente, caso de polícia. A rivalidade leva a desentendimentos, brigas e provoca até mortes.
Ruth da Silva Catuzzo, 23, e Romário Rodrigues, 31, possuem caixas de som no carro e já mudaram algumas atitudes por conta de problemas com vizinhos. Eles também afirmam que se a cidade tivesse um lugar legalizado, iriam sempre para lá.
– De forma alguma queremos incomodar os outros. Só gostamos de reunir nossos amigos e curtir um som. A gente não fica mais parado nas ruas com o porta-malas aberto e com o som ligado. Agora, curtimos enquanto andamos de carro pela cidade – garante Ruth.
Para o vereador Arlindo Bandeira (PP), que nos últimos meses tem buscado formas de ajudar os adeptos ao som automotivo, somente uma área destinada a esse público pode solucionar os casos de reclamações por barulho.
– É preciso tirar esse pessoal da área central e dos postos de combustíveis, mas não apenas descartá-los em um lugar qualquer. Tem que ter estrutura, garantir a segurança e legalizar os encontros – ressalta.
De acordo com a Brigada Militar (BM), ocorrências de perturbação do sossego são as mais atendidas durante a noite. Somente entre abril e maio, 122 chamados foram verificados.
– A BM procura fazer o que pode, mas não podemos simplesmente chegar e expulsar as pessoas. É preciso fazer um trabalho de conscientização. Há bairros com maior incidência, como o São Pelegrino, mas o problema é antigo. Com o frio, a demanda diminui. Mas aos finais de semana de pagamento, entre 21h e 2h, há um aumento nas ocorrências deste tipo – revela o subcomandante do 12º BPM, major Emerson Ubirajara.
O QUE DIZ A LEI
Em Caxias, a Política Municipal do Meio Ambiente determina que, em zona residencial, o limite de som é de até 60 decibéis durante o dia e de 55 decibéis à noite. Em zona industrial, o limite é de até 70 decibéis no período diurno e de 60 decibéis no noturno. Em caso de descumprimento, a lei prevê multas que variam de R$2.243,70 a R$74.790,00. O horário permitido para emissão de sons é das 5h até as 22h.