O zoo da Universidade de Caxias do Sul (UCS) está fechado desde março de 2020 para visitação do público por lazer, e assim deve permanecer ainda por tempo indeterminado. A reabertura do espaço, que conta com mais de 100 animais no plantel, depende de uma reforma completa. Atualmente, o zoológico está aberto apenas para visitações educativas, mediante agendamento, para alunos das redes privada e pública e de Ensino Superior. A coordenação pretende fazer uma revitalização e busca ajuda financeira para isso.
O zoo tem 26 anos, foi aberto em 18 de maio de 1997, e está com a arquitetura ultrapassada, de acordo com o coordenador da Clínica Veterinária e do Jardim Zoológico, Leandro do Monte Ribas. A demanda de acolhimentos de animais da região foi a motivação para a abertura do espaço, portanto, o zoo da UCS não tem um fim comercial, mas de centro de reabilitação. Ribas afirma que a revitalização vai dar maior comodidade aos animais e trazer uma experiência mais atrativa, com apoio da tecnologia, para os visitantes:
— Estamos em fase de captação de recursos, buscando apoio de empresários e empresas que têm seus impostos e podem descarregar no zoo. Também buscamos editais estaduais, federais e do Ministério Público.
Os interessados em fazer as doações devem entrar em contato pelos canais de atendimento da UCS, entre eles o telefone (54) 3218-2100. Imagens do projeto ainda não podem ser divulgadas, segundo o professor, mas a ideia é retirar as grades e colocar vidro ou acrílico no entorno do recinto, dependendo a espécie do animal. Isso dará melhor visão dos animais para o meio externo, sem ter aquela imagem com as grades. Nos recintos, terão alguns locais onde o animal poderá optar por se abrigar caso não queira aparecer para os visitantes.
O público terá acesso a totens para conhecer a espécie do animal. Em ambientes de animais com hábitos noturnos, haverá câmeras de monitoramento para a visualização enquanto o animal dorme.
Ribas garante que, mesmo sem a visitação livre, o espaço está em pleno funcionando e não há corre risco de fechar, já que se trata de um patrimônio educacional, ambiental, cultural e turístico. Mais de 9 mil estudantes passam por ano e 80 mil pessoas circulavam para o lazer ambiental até 2020.
Rotina dos acolhidos
Atualmente, cerca de 110 animais estão acolhidos no zoo, dentre eles mamíferos, répteis, aves. Todos que já sofreram algum tipo de trauma, como atropelamento, maus tratos ou os mais diversos crimes ambientais. Os animais estão estáveis, bem tratados, com a alimentação adequada e com comportamento normal para a respectiva espécie, esclarece a bióloga Claudia Borges Machado, 52 anos:
— Eles estão acostumados ao trato humano, portanto, não sofreram alterações durante o fechamento do zoo. Os animais do plantel estão tranquilos, porque sempre há gente no local. Assim como nós humanos, quando há barulho excessivo ficamos estressados, mas nada fora do normal.
Além da bióloga, os animais são cuidados pelo médico veterinário Gabriel Guerreiro Fiamenghi, 28 anos, e a dupla comanda o restante da equipe, que é formada por quatro auxiliares gerais e outros cinco estagiários. Composta por alunos da UCS e de outras instituições. A equipe cuida do tratamento diário dos animais, da saúde física e sanitária. O objetivo é que os animais resgatados voltem ao seu habitat, mas, se não for possível, ficam recolhidos no zoo.
— Os animais são tratados na clínica veterinária e depois fazemos a avaliação se têm condições de voltar ao meio ambiente ou ficarão no zoo. Eu visito eles todos os dias. Temos uma rotina de cuidados com sanidade, saúde e alimentação dos bichos. Fazemos o manejo entre os espaços dependendo de cada espécie, limpeza dos ambientes, entre outros trabalhos — relata Fiamenghi.
Dentre os moradores estão um gavião que levou um tiro na asa e por isso ela foi parcialmente amputada. Esse animal já não consegue e não teria condições de sobreviver sozinho na natureza. Outro é um furão, que é carinhosamente chamado de Jatobá. É cego e veio de Santa Maria. O macaquinho Kong teve o rabo amputado e isso dificulta a a locomoção em galhos de árvores. A Julieta é uma capivara resgatada em Farroupilha. Teve fratura de incisivos (dentes) e desenvolveu uma condição crônica, portanto, precisa de cuidado odontológico periódico. E a Pipoca é um quati, órfã, que foi resgatada em Passo Fundo e se tornou um dos animais preferidos de Fiamenghi.
No local, 90% dos animais foram recolhidos na Serra, mas todos os animais são do bioma da Mata Atlântica, segundo o médico veterinário. A idade deles varia, desde pequenos órfãos até a uma jaguatirica e uma gralha com mais de 20 anos e uma araras, a mais velha do zoo, que ultrapassa os 30 anos.
Os animais normalmente se alimentam com ração, específica de cada espécie, frutas da estação, vegetais e grãos. Todos os custos relacionados ao zoo são exclusivos da universidade. Segundo Ribas, o custo mensal gira entre R$ 50 e R$ 60 mil.
O baixo fluxo de visitações do público permite que as espécies sintam-se mais à vontade, com os respectivos comportamentos típicos. A entidade defende que o zoo é um patrimônio de preservação da fauna regional. Diversos animais, principalmente aves, costumam frequentar o pátio, que conta com alimentação disponível em comedouros e bebedouros. Um dos exemplos é uma ave da espécie tapicuru, em que um casal faz ninho para a reprodução nas árvores à beira do lago.
Síndrome de Nazaré
A novela brasileira Senhora do Destino, exibida em 2005 pela TV Globo, deu vida à icônica Nazaré Tedesco, personagem que durante a trama roubou um bebê. O médico veterinário Gabriel Fiamenghi brinca que muitas pessoas tem essa "Síndrome da Nazaré" e levam para casa animais silvestres. A intenção pode até ser de salvar aqueles que aparentemente estão em situação de vulnerabilidade, contudo, com este ato emocional prejudica-se a vida do "resgatado". Esse caso ocorreu com a Alice, a pequena fêmea da espécie gato maracajá.
— Alguém viu a Alice sozinha, sem a mãe por perto, pegou e levou para casa. Não sabemos quanto tempo ficou em Bento Gonçalves até que um órgão ambiental fosse acionado. Diante da pequena órfã ter sido retirada da mãe e não saber sobreviver sozinha, ela foi condenada a viver sob cuidados humanos para o resto da vida — afirma Fiamenghi.
Em determinadas espécies é comum os animais adultos esconderem os filhotes e sair para caçar, na busca de alimentos. Assim como os gatos maracajás, é normal o filhote ficar períodos do dias sozinho. A orientação do veterinário é que as pessoas não recolham o bicho se ele não estiver em real situação de risco. Caso se depare com algum animal silvestre, o pedido dos especialistas é que a pessoa ligue para um órgão ambiental e solicite orientação.
Fiamenghi explica que, nesta época de primavera, é comum os pássaros pequenos sairem dos ninhos em busca de alimentos e aprenderem a voar sozinhos. Muitas pessoas acreditam que eles estão em situação de vulnerabilidade, quando caem do ninho, e decidem resgatá-los sem o devido conhecimento dos procedimentos corretos. Essa ação, segundo o médico, não é benéfica ao animal.
Os órgãos ambientais, após o recolhimento do animal, entram em contato com a equipe da UCS e fazem o encaminhamento do resgatado para o atendimento. Não é possível uma pessoa fazer o resgate e entregar direto na instituição. Também, segundo Fiamenghi, não é possível a adoção destes animais para o manejo, pois há uma legislação específica.
Outra orientação repassada pela equipe da UCS à população é a questão da alimentação. A bióloga Claudia Machado explica que todos os animais têm a alimentação adequada para a espécie. Portanto, não é recomendado que se dê alimento aos animais. Aos finais de semana, é comum que a população circule nas margens do zoo e jogue alimento para aqueles animais que estão em recintos mais próximos das grades, ou até no lago. Contudo, esse alimento geralmente é pão, que ocasiona problemas de saúde aos animais.
— Além do alimento, muitas pessoas deixam os plásticos jogados na volta. Já encontramos um plástico na barriga de um peixe. Cachorro quente no recinto da puma. A capivara Juju ganhou pão há poucos dias e teve cólicas. Então, pedimos encarecidamente que não alimentem os animais do zoo — reforça Gabriel Fiamenghi.