Banco ajustado, cinto de segurança afivelado e olhos atentos ao trânsito de ruas e rodovias. A profissão que transporta cargas e passageiros e conecta histórias é homenageada nessa terça-feira (25), em uma alusão àqueles que diariamente transitam por centenas de quilômetros e contribuem para a logística das cidades.
Motoristas de aplicativos, táxis, ônibus e caminhões não movimentam apenas o trânsito, mas também suas vidas quando embarcadas atrás do volante. São homens e mulheres que encontraram na profissão um trabalho dinâmico em que nenhum dia é como o outro.
Quando lotado, um ônibus articulado pode transportar até 142 passageiros. Do Centro a Ana Rech, um dos veículos da Linha 02 do transporte público de Caxias do Sul, completa o trajeto em 2h40min, conduzido pela primeira mulher a dirigir um ônibus desse tipo em Caxias do Sul. Patrícia Maria Novello, 46 anos, é natural de Cambará do Sul e foi inspirada pelo pai que decidiu, ainda criança, que seria motorista um dia.
— Desde que via meu pai chegar em casa com o caminhão dizia que queria ser motorista. Tem que ter muita paciência, responsabilidade e foco — disse.
Mas as centenas de pessoas transportadas por ela não imaginam a história de vida de quem encontrou no trabalho forças para continuar. Patrícia perdeu seu primeiro filho no parto em 1997, logo depois de perder o pai caminhoneiro. Informada pelos médicos que não conseguiria mais engravidar, buscou na adoção o sonho de ser mãe. Cerca de um ano depois, engravidou de gêmeos. Com três filhos já adultos e motorista de ônibus, o sonho estaria concretizado não fossem novos obstáculos a serem enfrentados.
— Perdi mais um filho, assassinado com 21 anos. O trabalho foi muito importante porque foi onde eu me segurei. Sempre amei dirigir e foi o que me segurou, além da minha neta que hoje mora comigo — salientou.
Patrícia é mãe de Henrique Camícia, que em 2021 foi morto por engano em uma serralheira no bairro Diamantino, em Caxias do Sul. À época, o jovem deixou a pequena Manuela, com então três anos, hoje cuidada pela avó durante a semana.
— Dirigir um ônibus desse tamanho não é nada perto disso tudo. Encontramos situações diferentes todos os dias, tem que estar muito equilibrado para tirar de letra esses obstáculos. Ser motorista é minha realização, esqueço o mundo lá fora quando estou dirigindo — afirmou.
Antes de encarar as ruas, sempre a partir das 14h40min, onde embarca no ônibus a ser conduzido, Patrícia acorda cedo, leva a neta para a escolinha e ainda encontra tempo para cursar o primeiro semestre de técnico em enfermagem.
— É mais um desafio. Escolhi o curso para vencer o medo de sangue, ainda é uma espécie de trauma que tenho e quero ajudar outras pessoas — disse.
"Quando criança só pensava em ser caminhoneiro"
Enquanto Patrícia recolhe passageiros nas paradas de ônibus, na Estação Rodoviária de Caxias do Sul, Valdoir Pedro Barcarol, 71, os aguarda. Taxista há 42 anos, Barcarol é o motorista mais antigo do ponto 1 da cidade e ainda tem a experiência de 10 anos como caminhoneiro.
— Quando criança só pensava em ser caminhoneiro. Morava em Galópolis, na beira da BR-116, vendia uva na beira da estrada e cresci vendo os caminhões subirem a serra. Achava bonito, sempre fui apaixonado — contou.
O dia de expedição da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) é lembrado com exatidão. O 18 de março de 1972 lhe deu a oportunidade de exercer a profissão remunerada, dirigindo. Nunca mais parou e nem planeja. Depois das viagens ao Rio de Janeiro carregando cebolas, a concessão do táxi deu a oportunidade de permanecer na cidade e construir a família, hoje formada por três filhos e três netas.
— Caminhão é sofrido, não se para em casa. Graças a Deus ainda tenho saúde e condições de trabalhar. Em casa não consigo ficar parado.
E quando está nas ruas, Barcarol leva na carona a santa da qual é devoto. No porta malas, faz questão de mostrar a imagem de Nossa Senhora de Caravaggio fixada com um imã na lataria interna. É muito por conta da passageira divina que o taxista agradece o fato de nunca ter sido assaltado, por exemplo.
— Tem que estar sempre muito atento, estamos sujeitos a isso, é complicado. O movimento de passageiros também diminuiu depois do Uber, cerca de 60%. Então, as coisas vão mudando, o trânsito também tem dias que é fogo, mas não saberia fazer outra coisa se não dirigir para os outros — afirmou.