A Caxias do Sul que na próxima terça-feira completa 133 anos é feita de pessoas que vêm e que vão. Que chegam e que vão embora. Que param ou apenas passam. Num destes pontos de parada ou de passagem quase obrigatória, de frente para a Praça Dante Alighieri, Cláudia e Jeanete estão a postos para servir um café bem quente e um pão de queijo saboroso, na lancheria que talvez carregue o nome mais objetivo do qual se tenha notícia: Café Pão de Queijo.
Cláudia da Rocha de Rezende, 57, é a proprietária. Jeanete Kraemer, 51, a mais antiga funcionária da casa instalada na Avenida Júlio de Castilhos, uma destas que no verão também chamam a atenção pelas máquinas de sorvete italiano - espécie de patrimônio da calçada da Júlio. Desde meados dos anos 1990, quando Cláudia e o esposo, José Antônio Rezende (falecido há um ano e meio, aos 64 anos) adquiriram o negócio do antigo proprietário, lá se vão três décadas que ficariam bem registradas num livro de memórias.
_ São tantos clientes que se tornam amigos. Pessoas que vinham com seus namorados, que depois casaram e hoje vêm com seus filhos. A gente chega a se sentir parte da família - conta a proprietária
Embora pequeno no tamanho, sem mesas e tendo apenas o balcão como espaço para o lanche dos clientes, o lugar se faz grande pelo acolhimento. Das 7h45min às 18h30min, chegam pessoas que muitas vezes já tomaram seu café em casa mesmo, e que só estão a fim de conversar. Chegam recém-chegados à cidade, que mal sabem para onde vão. Chegam antigos conhecidos que nem lembram de onde, só lembram que se conheciam. Mas sendo um ponto de encontro há tanto tempo, é comum também que haja espaço para certo saudosismo. Especialmente das pessoas que um dia passaram pela porta para ir embora sem ninguém ali saber que seria a última vez.
- Estando há tanto tempo atrás do balcão, é inevitável. A gente sente saudade das pessoas que se foram. Principalmente na pandemia, muitos frequentadores perderam a vida para o vírus. Foi um período muito difícil - recorda Jeanete, moradora do Desvio Rizzo que pega o primeiro ônibus para chegar antes das 6h ao trabalho.
DA TAÇA DEMORADA AO COPO APRESSADO
Bem como as vidas de clientes que chegam e vão, pelos olhos de Jeanete e Cláudia passam a história deste segundo centenário da cidade. Como que de camarote, viram a revitalização da Praça Dante e a abertura da Avenida Júlio de Castilhos para a passagem de veículos, em 2004, quando se desfez o antigo calçadão. Foi uma mudança que favoreceu o negócio, segundo a proprietária:
- Hoje circula muito mais gente. Antes, com o calçadão, as pessoas sentavam nos bancos, paravam para ficar mais tempo. Para nós é melhor que haja esse fluxo maior.
Numa Caxias que acompanha as transformações da sociedade e se abre cada vez mais para novos sotaques e etnias, o Café Pão de Queijo viu as rotinas se tornarem mais aceleradas. Clientes que antes se davam ao luxo de parar para um café no balcão, hoje pedem sua bebida no copo de isopor para tomar em movimento. Isso quando não são interrompidas na sua hora do lanche para atender a um compromisso inesperado avisado pelo smartphone.
São novas tendências, novas realidades e novos hábitos que mudam a vida na cidade, mas sem que o caxiense deixe de ter nas suas antigas lanchonetes, onde outras Claudias e Jeanetes também atendem com sorriso no rosto e ouvidos atentos para a escuta, lembranças do que é essencial para a vida na cidade ou para a própria experiência humana.