O ano de 2023 não deve marcar o retorno das escolas de samba para os tradicionais desfiles de rua em Caxias do Sul. Para isso, seriam necessários meses de planejamento comunitário, investimentos financeiros e organização junto ao poder público, o que não ocorreu de maneira efetiva ao longo do ano que se passou. A prefeitura ainda não dá detalhes do que planeja com as entidades para o Carnaval, pois justifica que está finalizando o plano e irá divulgar informações na semana que vem. Nos bastidores, corre a notícia de que estão previstas atividades em um palco, no dia 4 de março, na Rua Plácido de Castro.
A última festa que envolveu competição entre as escolas ocorreu em 2016, tendo a Macha Verde como a campeã do Carnaval de Rua — os desfiles ocorreram em duas noites, reunindo mais de 25 mil pessoas. Sem a destinação de recursos por parte da prefeitura, a festa popular não foi realizada nos três anos seguintes. Em 2020, uma retomada da folia chegou a ser ensaiada, com dois desfiles e apresentação de outras três baterias de escolas de samba. Entretanto, veio a pandemia, o cenário já fragilizado piorou e as programações municipais acabaram sendo canceladas em 2021 e 2022.
Depois de tantos anos sem o som da bateria nas ruas, os relatos são de desmobilização dos integrantes, falta de recursos para qualquer movimentação e pouca expectativa sobre o que virá nos próximos anos.
Mesmo assim, tem quem lute com os poucos recursos disponíveis e não pretenda desistir da folia, mesmo de maneira mais enxuta, mas não menos animada e carregada de paixão. É o caso da Associação Cultural Esportiva São Vicente que prevê uma festa de Carnaval nas ruas do próprio bairro no dia 25 de fevereiro. Terá homenagens a sambistas da região, exposição de elementos carnavalescos, painel de fotos, entre outras atrações envolvendo os moradores. Há poucos dias, uma festa com as crianças, que não pôde ser realizada no Natal, reviveu o sentimento no bairro.
— Continuamos ativos, na lida. Nos dois últimos anos, fizemos alguns eventos, claro, que bem mais fracos, mas continuamos. A São Vicente nunca parou — garante a presidente, Carla Patrícia Borges da Fonseca.
É com tristeza que ela fala sobre a ausência do carnaval de rua caxiense:
— Tenho, para mim, que o nosso carnaval de rua não pode morrer por tão pouco. Eu acho que precisamos nos unir cada vez mais para que ele volte a acontecer. Sou uma pessoa otimista: se me dissessem que vai ter desfile, eu movimento minha diretoria e daqui 20 dias estaríamos lá — afirma a carnavalesca.
"É como se pulsasse a nossa vida", diz presidente sobre desfiles
A reportagem contatou representantes de cinco escolas caxienses nesta semana, mas teve retorno de apenas três. Entre as contatadas, somente a São Vicente prevê alguma programação para este ano. A percepção é de que depois de tantos anos sem um engajamento forte municipal o envolvimento dentro das próprias escolas de samba se fragilizou.
— A nossa festa popular é o Carnaval. É onde temos o direito de fazer a alegria na avenida. As batidas da bateria trazem uma alegria para a gente. É o momento em que a gente batalhou, sofreu, correu atrás, sem muitas condições, mas colocamos a escola na avenida. O dia do desfile é uma emoção enorme, é como se pulsasse a nossa vida — descreve, emocionada, a presidente da Imperatriz do Vale, Teresinha Aparecida Duarte.
Embora não tenha folia programada para este ano, Teresinha garante que a agremiação, fundada em 2004, não foi desativada e, havendo uma organização para um desfile futuramente, a comunidade se mobilizará para colocar "o bloco" na rua. Ela também acrescenta que integrantes da "Azul e Branco" devem se unir à possível programação da prefeitura no dia 4 de março.
— É como a letra diz: 'Somos Imperatriz até morrer'. Enquanto a gente existir, tiver pessoas que participaram do carnaval, a Imperatriz vai continuar, de alguma forma ou de outra — acredita a líder da escola de samba.
Mas, então, o Carnaval de Rua ainda tem chances de ser retomado em Caxias do Sul? A presidente da Nação Verde e Branco, Rosaura Moreira Pinto, acredita que sim, mas pondera que é preciso, primeiramente, ter o retorno de repasse de verbas municipais.
— O dinheiro da prefeitura é pouco, mas é um incentivo. É um começo. Depois, vamos tocando almoço, jantas, roda de samba e, muitas vezes, como é o caso da Nação, se recorre ao empréstimo de banco. Com o recurso, se comprava os tecidos, consertava os instrumentos estragados... A gente ia no 'bruto'. Precisa retornar as verbas para esse pontapé inicial — diz Rosaura, acrescentando que há necessidade de prestar conta de tudo que é investido com o recurso do poder público.
Em 2016, último ano em que as escolas organizaram os desfiles com dinheiro público, o município gastou cerca de R$ 380 mil (R$ 200 mil a menos do que em 2015). A premiação para as escolas ficou em R$ 318 mil, divididos entre nove agremiações. A campeã recebeu R$ 57,9 mil, e a vice, R$ 45,4 mil. A partir de 2017, o corte foi total.
Em 2020, o único valor investido pelo poder público nas apresentações foi de R$ 1.014, destinado para a colocação de banheiros químicos no local do evento. A prefeitura também forneceu estruturas para a montagem de palco, som e fechamento das ruas por onde passarão as escolas. Neste ano, a prefeitura ainda não detalhou a programação e investimentos.
Folia na Capital
Ao contrário de Caxias, a Capital do RS já anunciou a festa de Carnaval para este ano. O desfile de 2023 de Porto Alegre acontecerá nos dias 3 e 4 de março no Complexo Cultural do Porto Seco. O evento vai contar com R$ 2,2 milhões em recursos do Fundo Municipal de Apoio à Produção Artística e Cultural de Porto Alegre (Fumproarte), da Secretaria Municipal da Cultura e Economia Criativa, e de emendas parlamentares, destinados por edital.
Serão contemplados com a verba 21 projetos de várias agremiações carnavalescas da Capital, além de empresas de serviços e eventos que realizarão atividades ligadas aos desfiles.