Há cerca de quatro meses, a aposentada Geci dos Passos da Fonseca, 68 anos, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), que resultou em dificuldades motoras no lado esquerdo do corpo. A mão não fazia o movimento básico de abrir e fechar. Andar era outra dificuldade, porque faltava força e controle na perna esquerda. Sentar por muitos minutos era quase impensável. Mas tudo começou a mudar há três meses, quando ela iniciou o tratamento na Clínica Municipal de Reabilitação de Caxias do Sul. O serviço, que funciona junto ao Centro Especializado de Saúde (CES), completou seis meses de implantação na semana passada e contabiliza mais de 4,6 mil atendimentos gratuitos nas áreas de Fisioterapia e de Fonoaudiologia.
Moradora do bairro Nossa Senhora das Graças, Geci conta que soube do serviço após buscar atendimento na Unidade Básica de Saúde (UBS) do bairro Esplanada, depois de ficar hospitalizada por três dias. Na clínica, em dois atendimentos semanais, a aposentada tem acesso a aparelhos como esteira, bicicleta e bolas fisioterápicas, fundamentais para a recuperação dos seus movimentos. Tudo acompanhado de perto por um profissional.
— Aqui temos um contato muito próximo, é muito bom. Antes, eu não conseguia fazer nada. Depois que eu comecei aqui, já consigo fazer comida, coloco as roupas na máquina. Não tomava banho sozinha, era só sentada na cadeira. Agora, comecei a evoluir, porque o André (fisioterapeuta) me incentiva — avalia a aposentada.
Geci deve ganhar alta dos atendimentos até o fim deste ano e dará lugar a outro paciente em suas sessões semanais. A proximidade com os profissionais que atuam no local, mencionada por ela, é relatada também por quem presta os atendimentos. O fisioterapeuta André Borges da Rosa destaca que este contato personalizado é um diferencial para a evolução da condição de saúde do paciente.
Este fator é propiciado pelo protocolo de atendimento adotado pela clínica ao longo destes seis meses: cada sessão de fisioterapia dura em torno de 45 minutos e um profissional atende apenas um paciente por vez, sendo que duas pessoas podem utilizar o espaço simultaneamente. Este cenário, conforme André, se difere de clínicas convencionais, onde, às vezes, um único fisioterapeuta atende diversos pacientes ao mesmo tempo. Nesta área, a equipe da clínica conta com cinco profissionais.
— Fazemos um atendimento individualizado, o que melhora muito a forma de tratamento, porque o foco não fica somente na doença, vemos o indivíduo como um todo. Dentro disso, conseguimos captar no paciente várias outras questões, como a parte psicológica, nutricional, medicações que ele usa, outros traumas que sofreu. São coisas que não conseguimos se tivermos que atender várias pessoas ao mesmo tempo, como é basicamente um padrão na Fisioterapia. Somos privilegiados neste sentido — explica André, ressaltando que são ofertadas, no máximo, 40 sessões fisioterápicas para os casos mais graves, podendo ainda o paciente ser direcionado para clínicas conveniadas, mediante avaliação da equipe.
Quem pode e como buscar o serviço
O perfil de quem busca atendimento na Clínica Municipal não mudou desde a implantação, em maio. Continuam sendo atendidas pessoas com sequelas pós-covid 19, doenças respiratórias crônicas, doenças musculoesqueléticas e sequelas de AVC (caso da dona Geci), bem como pacientes pediátricos que já estão em atendimento no CES. O serviço funciona de segunda a sexta-feira, por agendamento.
Os encaminhamentos são realizados pela Rede Municipal de Saúde, por meio da Unidade Básica de Saúde (UBS) de referência, médicos especialistas ou fisioterapeutas da rede, conforme diagnóstico clínico. Na área de fonoaudiologia, que já existia no local e foi integrada aos serviços de fisioterapia, são ofertados 50 novos horários a mais por mês.
André comenta que quem busca ajuda para tratar sequelas da covid-19, por exemplo, não chega ao local somente com queixas voltadas à respiração:
— Geralmente, são pessoas que relatam dificuldade em atividades diárias, com muita fadiga a pequenos esforços, fraqueza muscular. Então, focamos na parte física e respiratória. Outra questão é a parte psicológica. Percebemos o receio destes pacientes em pegarem covid novamente, justamente por terem ficado muito debilitados — detalha o profissional.
Faltas preocupam
O diretor-executivo da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Dino de Lorenzi, diz que os seis primeiros meses da Clínica Municipal de Reabilitação são avaliados positivamente. Um dos motivos é porque ajudou a tirar pessoas da fila de espera pelos serviços — uma demanda reprimida que foi acentuada pela pandemia de covid-19.
Contudo, o que gera preocupação do poder público é o número de não comparecimentos no período, o qual representa quase um quarto dos atendimentos. Ao todo, nos seis meses, foram contabilizadas 1.229 faltas, sendo 884 na parte fonoaudiológica e 345 na área fisioterápica.
— Precisamos alertar a população para que não deixe de ir, porque isso está tirando a vez de outras pessoas. É um número bastante significativo — avalia o diretor da SMS.
Além do alerta aos usuários, Dino ainda acrescenta que há a projeção futura de ampliação de espaço e de equipe:
— As pessoas precisam muito deste tipo de atendimento, porque a pandemia deixou marcas e há o próprio envelhecimento da população. É um atendimento caro, que nem sempre é disponibilizado pelos planos privados.
Sobre a clínica
:: O espaço foi implantado no dia 17 de maio no prédio do Centro Especializado de Saúde (CES) em uma sala reformada.
:: A equipe é composta por cinco fonoaudiólogos e cinco fisioterapeutas.
:: 4.636 atendimentos foram realizados até 31 de outubro, sendo 1.755 na Fisioterapia e 2.881 na Fonoaudiologia.
:: No período, foram registradas 1.229 faltas.
:: Além deste local, os pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) também continuam sendo direcionados para o Centro Integrado de Saúde da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG), Centro Clínico Universidade de Caxias do Sul (Ceclin) e clínicas conveniadas.