Em uma ação realizada entre os dias 20 e 26 de abril, os auditores-fiscais do Ministério do Trabalho (MTE), do Ministério Público do Trabalho (MPT) e agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) resgataram 80 trabalhadores em situação análoga à escravidão, na localidade de Morro Chato, em Bom Jesus, na Serra Gaúcha. Eles também foram vítimas de tráfico de pessoas e de promessa enganosa de emprego e são da Bahia, Paraíba e Maranhão.
Segundo os auditores-fiscais do Ministério do Trabalho, aliciadores de mão de obra, popularmente conhecidos como gatos, atuavam em nome do empregador no interior dos estados do Nordeste brasileiro, oferecendo emprego na colheita de maçã em São Joaquim, na Serra de Santa Catarina. A vaga de emprego prometida assegurava também boas condições de alimentação e de alojamento.
Entretanto, o destino final era a cidade gaúcha e, durante o deslocamento, os trabalhadores tiveram que arcar com os custos da viagem e alimentação, chegando ao local de trabalho já com dívidas com o empregador. Além do transporte de ida para a colheita, o de volta aos estados de origens só seria custeado, parcialmente, caso o trabalhador atuasse até o final da colheita. De acordo com os auditores, as carteiras de trabalho não foram assinadas antes da viagem, conforme determina a lei, o que deixou os trabalhadores sem segurança sobre as condições de trabalho.
— Foi uma operação bem delicada, envolvendo muitas pessoas, foi o maior resgate de trabalho escravo feito no Estado, um dos maiores do país, pelo número de trabalhadores. E tinha todo um receio de divulgar antes e atrapalhar a conclusão da operação, porque é uma situação bem delicada. Tu vai lá, faz o resgate, e aí tem que esperar os trabalhadores receberem o pagamento da rescisão, receberem a documentação, serem colocados no ônibus e retornarem de onde vieram — explica o gerente do MTE em Caxias do Sul, Vanius Corte.
Após a notificação da Inspeção do Trabalho, o empregador custeou o retorno dos 80 trabalhadores aos seus estados de origem, que ocorreu na madrugada de quarta-feira (27), e comprometeu-se com o pagamento dos direitos trabalhistas das vítimas. No total, serão pagos R$ 312 mil em verbas rescisórias.
O Ministério Público do Trabalho (MPT) firmou acordo com o empregador para o pagamento de danos morais individuais aos trabalhadores, no total de 80 mil reais. O caso segue em apuração no MPT, com o procurador de Caxias, Rodrigo Maffei.
Em paralelo, os Auditores-Fiscais do Trabalho emitiram as guias de Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado, pelas quais cada um dos resgatados faz jus ao recebimento de três parcelas de um salário mínimo (R$ 1.100,00) cada.
Por não se caracterizar como flagrante, nenhum envolvido foi preso.
— No momento em que foi verificada a situação, o empregador e os gatos não estavam, por isso, não houve prisão — explica Corte.
Condições degradantes
Os agentes envolvidos na operação identificaram onde os 80 trabalhadores estavam mantidos, péssimas condições de higiene e conservação do alojamento. No local, não havia fornecimento de roupas de cama e cobertores e nem de água potável, a qual apresentava coloração escura, com trânsito de animais no local da captação.
Fraudes trabalhistas
Diversas fraudes trabalhistas também foram constadas pelos auditores-fiscais. Além da ausência de assinatura da Carteira de Trabalho, foram encontrados contratos de trabalho assinados, mas com campos de datas e salário em branco. Os cartões de ponto também não eram preenchidos pelos próprios trabalhadores.
O pagamento do salário também era abaixo do determinado pela legislação. Conforme o MPT, os trabalhadores não recebiam nos dias de chuvas, pelo interrompimento da colheita e, com isso, acabavam recebendo um valor abaixo do piso salarial da categorial, em média de R$ 1,5 mil.
Em nota, o Ministério Público do Trabalho afirma que as rescisões também foram fraudadas e calculadas abaixo do piso, com a informação de datas incorretas de admissão, reduzindo o tempo total de trabalho, e a omissão de parcelas como o décimo-terceiro salário e férias.