Apesar de a quantidade de focos do mosquito da dengue terem ultrapassado, em pouco mais de três meses, o total registrado no ano passado em Caxias do Sul, o problema continua sendo tratado com descrença por parte da população. A constatação é a da diretora técnica da Vigilância Ambiental em Saúde, Sandra Tonet, que pede para que os moradores acreditem nos riscos da doença e atendam os agentes de combate às endemias que trabalham de porta em porta coletando amostras e esvaziando recipientes com água parada.
Na última atualização da Vigilância Ambiental em Saúde de Caxias do Sul eram 493 pontos com larvas do mosquito Aedes aegypti. O crescimento é de 136% em relação ao ano passado. Além disso, são cinco casos da doença confirmados no município — dois pacientes contraíram a doença na cidade e três foram infectados em outras regiões. Outros 24 exames ainda aguardam o resultado do Laboratório Central de Saúde Pública do Estado. As denúncias também de possíveis criadouros também aumentaram (leia mais abaixo).
No bairro Cruzeiro, local de maior incidência de focos, a reportagem acompanhou o trabalho da agente de combate às endemias Adriana Pereira de Lima. A profissional mostrou a facilidade em que o mosquito se prolifera e a importância da atenção redobrada para pequenos detalhes que podem passar despercebidos.
Há 13 anos no combate ao mosquito da dengue, Adriana diz nunca ter presenciado situação parecida em Caxias do Sul. Segundo ela, nos últimos dias é possível flagrar e, quando possível, capturar insetos adultos, o que representa o estágio final da evolução do mosquito fase em efetivamente ele transmite a dengue.
— Notamos que se intensificou a presença de focos no ano passado, mas agora é mais crítico. O morador precisa entender que mesmo não tendo água parada na sua residência pode ter a presença do mosquito adulto e é importante que nos deixem fazer o trabalho — alertou Adriana, enquanto coletava larvas em uma caixa d’água nos fundos de um terreno da Rua Nepomuceno Diniz Vargas.
Moradores do Cruzeiro há 20 anos, Olimpio e Dosolina Salvadoretti ficaram surpresos e assustados com o que a visita constatou naquela manhã. Segundo eles, os reservatórios haviam sido limpos recentemente, mas a falta de uma tela de proteção no cano de vazão d’água bastou para que o inseto conseguisse depositar os ovos nas paredes da caixa.
— Eu fiquei com muito medo, perdi um irmão para a (febre) chikungunya. Ele morava na Bahia, contraiu a doença em uma viagem ao Mato Grosso e não resistiu. Eu sei do que o mosquito é capaz — revelou a aposentada de 79 anos.
A preocupação é compartilhada pela vizinha de Dosolina, que abriu as portas da empresa para que Adriana pudesse verificar os fundos do local. Por lá, lonas bem esticadas cobriam materiais depositados e não possibilitavam o acúmulo de água, mas um pequeno recipiente cheio d’água precisou ser esvaziado.
— Tem que ficar atenta né, agora com essas chuvas pode ser que acumule água e a gente não se dê conta de esvaziar. Um vizinho tem que cuidar do outro — afirmou a empresária Sônia Lando, 62, ao se despedir da agente que já partia para outro local.
Mais denúncias
Na administração municipal, as denúncias triplicaram. De acordo com a diretora técnica da Vigilância Ambiental, Sandra Tonet, o normal eram de 20 a 25 denúncias por dia, agora mais de 70 pessoas procuram diariamente os canais da prefeitura para solicitar a presença dos agentes nos bairros. Segundo ela, são relatos de terrenos baldios e pedidos de dedetização em pontos onde a conscientização e o cuidado poderiam resolver o problema.
— Não dá pra dizer que 100% da população está despreocupada, a gente vê uma parte que busca informação, mas não estamos encontrando larvas em terrenos e sim em residências, em recipientes visíveis que abrigam as larvas. A nossa orientação é a prevenção, não indicamos o uso do inseticida, pois não sabemos como a população vai manusear — revelou Sandra.
Atualmente, ainda de acordo com a Vigilância Ambiental em Saúde, 12 áreas de Caxias do Sul estão recebendo a aplicação de inseticidas por serem locais com casos suspeitos de moradores que contraíram a doença, uma vez que é apenas nessas condições que ocorre o manuseio dos produtos.
Dificuldades no acesso às propriedades
Dos quase 500 focos comprovados em Caxias do Sul, 81% foram flagrados em residências, mas os locais que motivam a maioria das denúncias também, segundo a prefeitura, estão no radar dos agentes, mesmo que o primeiro acesso tenha sido impedido por algum motivo.
— São pontos estratégicos como borracharias, lixões e terrenos baldios. Quando há dificuldade, o agente traz a demanda e conseguimos localizar o proprietário através do endereço. Ai quem vai é o fiscal, após agendamento, que notifica e comunica o prazo para a regularização — explicou, Sandra.
Na visita ao bairro Cruzeiro, um portão fechado com cadeado, por exemplo, impossibilitou a visita da agente que verificaria se o local continha água parada. Por um pequeno buraco na tela, Adriana até tentou acessar o local, mas preferiu não arriscar.
— Se tem como, a gente entra e verifica, mas aqui não dá. É frustrante, temos que encontrar o proprietário — afirmou.
A Secretaria da Saúde (SMS) alerta que pessoas com diarreia, febre, dores musculares, dor de cabeça e atrás dos olhos devem procurar atendimento médico. A partir da notificação de casos, uma varredura é feita pela Vigilância.