Após dois anos fora do mercado de trabalho, Carolina Piedrahita Valencia, 31, tinha planos de, em 2021, voltar a trabalhar, mas, por enquanto, está sem perspectiva de conseguir alguma vaga. Mesmo depois de distribuir currículos em inúmeras empresas, a colombiana, que mora há três anos em Caxias do Sul — e há 11 anos no Brasil — sequer é chamada para entrevistas. O motivo, segundo ela, é algo comum a muitos imigrantes que vivem no município: visto vencido, sem previsão para renovar.
Dentre todas as restrições que ocorreram a partir de março de 2020, em função da pandemia, os atendimentos das unidades da Polícia Federal (PF) referentes aos serviços de emissão de Passaportes e de Regularização Migratória de imigrantes, também foram alterados, limitando-se apenas a situações consideradas de extrema necessidade avaliadas por cada unidade, ainda que houvesse agendamento prévio.
— Em agosto, meu marido, que também é colombiano, e eu entramos com o pedido de renovação porque tínhamos o visto que venceria em setembro. Fizemos os encaminhamentos, pagamos a taxa e não conseguimos agendamento. Por estar empregado, meu marido conseguiu um ofício que prorrogou a validade dos documentos dele por três meses, algo que agora já está vencido também. Desde setembro, não conseguimos falar mais com ninguém do setor responsável, não nos atendem por telefone e não dão nenhum tipo de retorno — afirma Carolina, que além de ficar sem emprego, também está preocupada com a situação do marido.
— Ele ajuda a família dele e eu não estou mais conseguindo ajudar a minha, que também ficou na Colômbia. Fico pensando várias coisas: que daqui a pouco podem querer demitir ele, que não vai poder nem encaminhar o Seguro Desemprego, ou, ainda, que daqui a pouco podem simplesmente mandar embora do país todos que estiverem ilegais. Temos um filho de sete anos e uma filha de dois anos que nasceram aqui, me preocupa muito toda essa situação — completa.
Assim como o casal colombiano, imigrantes de diversas nacionalidades que vivem, hoje, no Brasil, enfrentam o mesmo problema. Sem conseguir atendimento para a renovação do Registro Nacional Migratório (RNM) e a Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM), os demais documentos, como a Carteira de Trabalho, também perdem validade. Um ofício publicado pela Defensoria Pública - Geral da União (DPGU) em agosto, tendo em vista as restrições no atendimento prestado pela PF, determina que "consideram-se prorrogados os prazos de vencimento de protocolos, carteiras e outros documentos relativos às atividades de Regularização Migratória, incluindo certidões para instruir os procedimentos, situação que perdurará até o final da situação de emergência de saúde pública ou da divulgação de nova orientação da PF".
Na prática, porém, o documento ainda gera incertezas em diversos departamentos públicos, assim como na iniciativa privada, não se sobrepondo aos inúmeros entraves burocráticos que surgem diante da falta de renovação dos documentos. A agência do Sine/FGTAS de Caxias do Sul confirma que tem recebido demandas de imigrantes com documentação vencida desde o ano passado.
— No encaminhamento presencial do Seguro Desemprego ficamos sem conseguir dar andamento, por exemplo, enquanto no procedimento online ele ainda é possível porque não há exigência dessa documentação. Quanto às vagas de emprego, estamos fazendo de tudo para atender. A contratação de imigrantes sempre foi mais complexa, porque envolve diversos órgãos e, agora, com essa situação, a barreira tem sido maior por parte das próprias empresas, que também ficam com receio — afirma o coordenador da agência, Mauricio Giusto Adamatti.
PF diz que atendimentos estão ocorrendo
Estrangeiros que procuraram o Posto de Imigração da Delegacia de Polícia Federal em Caxias do Sul, localizado no shopping Villagio Caxias nesta semana foram informados de que o atendimento estaria normalizado, porém o agendamento, que deve ser feito pelo site, segue indisponível.
À reportagem, por e-mail, a PF afirmou que "a pandemia gerou uma demanda reprimida nas atividades pertinentes à Polícia de Imigração sobretudo na expedição de passaportes e registro de imigrantes". De acordo com o delegado da PF, Claudino Sebaldo Alves de Oliveira, chefe da delegacia local, os atendimentos foram reiniciados de forma gradativa em 3 de novembro. "Enfrentamos problemas técnicos (já resolvidos) que dificultaram os atendimentos. Atualmente, porém, estamos atendendo normalmente", afirmou, no e-mail.
Segundo ele, atualmente, a unidade está atendendo de 12 a 15 imigrantes por dia, que seria a capacidade máxima, representando de 240 a 300 imigrantes atendidos por mês. O delegado afirmou, ainda, que "mesmo durante a paralisação dos atendimentos, aqueles imigrantes que tinham oferta de emprego e procuravam atendimento, eram atendidos". A PF desconhece quantas pessoas estariam hoje em situação irregular e quantas estariam em espera para a renovação dos documentos. Os principais países de origem desses imigrantes seriam, de acordo com a PF, Haiti e Venezuela.
Em relação ao agendamento online, a PF disse que a abertura de horários é feita a curto prazo, de um dia para outro, ou dentro de dois dias, sob a justificativa de que, quando os horários são abertos a longo prazo, a taxa de não comparecimento é alta.
* Com Vitória Lovat.