A busca constante por alternativas de subsistência faz parte da história da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), que presta serviço educacional, assistencial e de saúde a cerca de 420 pessoas com deficiência intelectual e múltipla em Caxias do Sul e completou 63 anos de trajetória no último dia 6 de setembro. Diante do cancelamento de eventos — em função da pandemia — que representavam uma fatia importante na manutenção dos serviços prestados pela entidade, a atual gestão, liderada pela presidente Bernardete Pavan Vezaro, encara o desafio de equilibrar as finanças e preservar os atendimentos de forma adaptada e segura, tanto para os profissionais, quanto para os usuários e seus familiares.
— Desde março estamos lutando para sobreviver, planejando um dia de cada vez porque tudo muda muito rápido. Nossa receita está 20% abaixo do que era antes, fizemos todos os cortes possíveis, reduzimos o quadro e agora vamos buscando alternativas para manter os serviços — relata a presidente, que, neste ano, cumpre o terceiro mandato à frente da entidade à qual se dedica como voluntária há 15 anos, sendo os últimos seis voltados para a área social.
— Comecei a convite de uma amiga, depois desenvolvi várias atividades, incluindo na área financeira. Estamos sempre buscando alternativas para complementar os recursos — afirma Bernardete.
Ela conta que, entre janeiro e março, a projeção de eventos e atividades agendadas para o ano de 2020 apontava um crescimento que garantiria recursos além dos já obtidos por meio de repasse público e doações da comunidade.
Apesar do cenário adverso estabelecido a partir de março, Bernardete diz perceber uma mobilização solidária ainda maior por parte da comunidade, em relação à Apae.
— Estão ocorrendo campanhas por meio de lives e o pessoal está colaborando. Quando está todo o município em crise, as pessoas se tornam mais prestativas. Não vamos ter eventos como a Feijoada, a Festa Junina... O calendário que comercializamos todos os anos atrasou um pouco, mas vai ser lançado em breve, sendo um dos principais meios para angariarmos recursos neste ano — completa.
Calendário será comemorativo
Mesmo em meio às dificuldades, ações de sucesso realizadas em prol da Apae são motivo de celebração. Ao completar 15 anos, o projeto de calendários comercializados todos os anos pela entidade ganhará, desta vez, uma edição comemorativa, com a temática de debutante e participação de João Pulita como convidado especial. O lançamento, inicialmente previsto para 24 de setembro, foi adiado e ainda não possui uma data confirmada. De qualquer forma, a organização do projeto afirma que ele está em fase de finalização e que, em breve, terá a data de lançamento divulgada, em evento que deve ocorrer de forma virtual.
"As famílias estão mais envolvidas", diz diretora
Na Escola Especial Dr. Henrique Ordovás Filho, da Apae, as aulas presenciais poderão ser retomadas a partir do dia 12 de novembro, junto das demais escolas de séries iniciais do Ensino Fundamental, conforme cronograma do governo do Estado. O retorno depende, ainda, do contexto de contágio por coronavírus na região, que reflete na classificação de bandeiras para cada região no Modelo de Distanciamento Controlado, flexibilizado na Serra. Ainda diante das incertezas da retomada, a equipe de educação da Apae segue atuando a pleno vapor desde abril, com o desafio da adaptação ao ensino remoto aos cerca de 90 estudantes com necessidades especiais que são atendidos.
— Inicialmente não acreditávamos nesse ensino a distância por entendermos a dificuldade que os alunos possuem, alguns deles com mais comprometimento pela deficiência intelectual e física. Mas, a participação das famílias nos surpreendeu, elas estão mais envolvidas do que antes e, com isso, conseguimos garantir que aproximadamente 70% dos alunos consigam manter uma boa participação por meio das atividades a distância — relata a diretora do educandário, Eni Tasca.
Um exemplo de envolvimento é o de Sidney Deitos, 52 anos. Com dois filhos matriculados na escola especial, além da mulher, que também tem deficiência, ele tornou-se um elo fundamental entre a Apae e os meninos. Mesmo quando esteve debilitado após uma operação no joelho, conseguiu carona para deslocar-se do bairro Sãe Caetano, onde vive, até o Cinquentenário, onde retira as atividades da semana preparadas pelos professores.
— Para mim, a pandemia não muda nada porque quando a gente constrói uma família precisa ser responsável, é um prazer fazer isso. Estudam aqui desde pequenos (os dois filhos) e isso ajudou muito no desenvolvimento deles. Eu estudei só até a quarta série, tem coisas que até eles passaram a me ensinar agora — relata o pai, que é operário do setor industrial de Caxias do Sul.
Na terça-feira (15), sabendo da reportagem, ele foi acompanhado por um dos filhos, Guilherme Deitos, 18, que pôde matar, pelo menos um pouco, a saudade que diz sentir da escola e dos professores. Pilchados, ambos homenageavam a tradição gaúcha, celebrada na programação escolar mesmo com o distanciamento, por meio das atividades entregues semanalmente.
— Nesta semana recebemos sobre a dança chula, essa eu ainda não fiz — relatou Guilherme.
Atendimento essencial
Duas vezes por semana, a pequena Vitória Boeira Biazus, de dois anos, recebe atendimento de fisioterapia na sede da Apae, em Caxias do Sul. De acordo com a mãe dela, Paola da Costa Boeira, 21, a manutenção do serviço, que chegou a ser interrompido no início da pandemia, é essencial para o desenvolvimento da menina, portadora de deficiência neurológica.
— Faz quase um ano que trago ela porque a médica entendeu que a fisioterapia seria importante. Ela realmente se desenvolve muito melhor e deu para perceber o quanto é importante porque no tempo em que ficou sem a evolução simplesmente parou — relata a mãe.
:: COMO AJUDAR
A Apae está arrecadando alimentos, materiais de higiene e limpeza, que são destinados às famílias dos frequentadores. Valores em dinheiro podem ser repassados por boleto, a combinar pelo (54) 3013.4905 ou contato@apaecaxiasdosul.org.br. Também podem ser feitos depósitos bancários no Banco do Brasil: agência: 0089-2; conta: 102863-4.