Um processo envolvendo prestadoras de serviço de anestesiologia de Caxias do Sul foi julgado pelo Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) na última quarta-feira (26). Sob denúncia de formação de cartel instaurada ainda em 2014 pelo Ministério Público Federal (MPF), uma cooperativa e três clínicas, que atuavam regionalmente na ocasião, foram condenadas, com aplicação de multas que totalizam R$ 3,5 milhões.
Conforme publicação feita pelo Cade, as investigações concluíram que a Clínica de Anestesiologia (Can), a Anestesiologistas Reunidos de Caxias do Sul (AR) e a Sane Nordeste Serviço de Anestesiologia (Sane) agiram de maneira coordenada para fixar preços e condições de oferta de procedimentos anestesiológicos a hospitais e operadoras de planos de saúde.
De acordo com o Conselho, a cooperativa Cooperativa dos Anestesiologistas da Região Nordeste do Rio Grande do Sul (Carene) também teve envolvimento na atuação, promovendo e coordenando processos de negociação coletiva, o que, segundo o Cade, influenciava o comportamento dos associados e favorecia o cartel.
Segundo dados publicados no site da Carene, a cooperativa conta, atualmente, com adesão de 108 médicos e sete clínicas cooperadas.
O QUE É CARTEL?
Qualquer acordo ou prática concertada entre concorrentes para fixar preços, dividir mercados, estabelecer cotas, restringir produção, adotar posturas pré-combinadas em licitação pública ou restringir ou eliminar a concorrência de qualquer outra forma. (Fonte: Roteiro de Atuação no Combate a Cartéis do MPF - 2019)
Práticas ocorriam desde 2002
O Cade afirma que as condutas anticompetitivas investigadas tiveram início em 2002, sendo o processo administrativo instaurado pelo MPF a partir da denúncia de médicos da área que não conseguiam atuar em cirurgias locais em função do domínio praticado ilegalmente pelas clínicas.
— Essas associações que prestam o serviço dominava mercado e detinha, inclusive, equipamentos em hospitais. Elas escolhiam o médico que atuaria nos centros cirúrgicos, permitindo somente profissionais que integravam as associações. O médico cirurgião não tinha liberdade de escolher, por exemplo — explica o procurador da República Fabiano de Moraes, que deu início às apurações referentes ao caso na cidade e instaurou a ação junto ao Cade.
O procurador relata que, na ocasião da denúncia, as prestadoras apontadas tinham atuação em hospitais de Caxias do Sul e também da região, em cidades como Farroupilha, Flores da Cunha e São Marcos.
— A formação de cartel é comum na Saúde, sobretudo quando envolve a atuação de anestesiologistas ou pediatras, por terem poucos especialistas — comenta Moraes.
Empresas já tinham sido notificadas
De acordo com o Cade, as prestadoras envolvidas no processo chegaram a firmar Termo de Cessação de Conduta (TCCs) com o Cade em 2017, mas as condições impostas nos acordos foram descumpridas, o que motivou a retomada das investigações. A conselheira do Cade, Paula Azevedo, afirma que o descumprimento foi motivado em razão da filiação das clínicas à cooperativa após a assinatura do termo.
Além do pagamento de multa, o Cade determinou que as clínicas e a Carene abstenham-se de promover negociações coletivas que visem a uniformização de preços ou condições de serviços de anestesiologia. Os representados também devem deixar de promover, apoiar ou fomentar movimentos de boicote e paralisação coletiva de atendimentos aos beneficiários de planos de saúde ou descredenciamentos em massa.
Por fim, o Tribunal estabeleceu que as condenadas disponibilizem síntese da decisão do Conselho em seus sites, de forma visível e legível, pelo período mínimo de 90 dias. Também devem divulgar o teor da decisão aos filiados e clientes, comprovando o cumprimento da determinação ao Cade dentro de 15 dias (a contar da decisão).
CONTRAPONTOS
Procuradas pela reportagem na tarde desta segunda-feira (31), a Carene e Sane ainda não haviam dado retorno até as 17h30min.
Embora tenha sido condenada pelo Cade, a Clínica de Anestesiologia (Can) afirmou não ter relação com o processo e disse que o assunto deveria ser tratado exclusivamente com a Carene. A reportagem não conseguiu contato pelos telefones da AR.