Pelo menos no mês de maio, Alexandre Lima, 51 anos, terá desconto na mensalidade que paga pelo ensino da filha Júlia, 7. É que a escola em que ela estuda no segundo ano, a Caminhos do Saber, em Caxias, adotou uma tabela de descontos que varia de 5% a 30%, conforme a faixa etária e consequente ano escolar. O percentual é maior para os pequenos do maternal e crianças de até três anos de idade e decresce conforme vai aumentando ano escolar até o Ensino Médio.
Para Alexandre, o desconto veio em boa hora. Com a suspensão temporária das aulas em função do distanciamento social por causa da pandemia causada pelo novo coronavírus, ele teve de parar totalmente a atividade que desempenhava de motorista por aplicativo e se dedicar ao cuidado da filha em casa. Ou seja, teve a renda reduzida a zero. Além disso, a esposa, que é farmacêutica, teve redução de 25% na carga horária e, portanto, no salário. Dessa forma, a mensalidade de R$ 868 da escola passou a ter um peso bem maior do que os 20% que tinha no orçamento da família.
A situação de muitas famílias diante do dilema de como pagar as mensalidades dos filhos fez surgir um movimento de pais em Caxias. Ele ganhou força na semana passada com a realização de uma reunião da Comissão de Educação da Câmara de Vereadores que tratou da questão com direções de escolas particulares, pais, Ministério Público e Procon.
– Muitos pais não ficaram satisfeitos com o que foi dado (percentual de desconto). Não vou dizer que foi o ideal, mas acho que foi um grande feito, porque muitas escolas não iam dar nada, e acho que o movimento acabou fazendo com que elas se mexessem e dessem alguma coisa. Então, acho que foi uma vitória, sim – ponderou Alexandre, que integrou o grupo de pais na reunião.
Segundo o vereador Paulo Périco, proponente do encontro no Legislativo, entre as escolas que já haviam encaminhado aos pais algum percentual de desconto, seja linear (igual para todos os alunos) ou diferenciado, e as instituições que apresentaram índice depois da reunião, estão o São José, Carmo, Pastorinhas, Madre Imilda, Caminhos do Saber e São Carlos. Algumas como Murialdo e São João Batista disseram na reunião que não estabeleceriam desconto único e que avaliariam caso a caso.
Para o coordenador do Procon de Caxias, Dagoberto Machado dos Santos, as escolas deveriam se sensibilizar mais com a situação dos pais e poderiam ir além dos descontos propostos.
– Não foi o que esperava, mas tivemos avanços, uma abertura de negociação – avaliou.
Escolas adotaram medidas diferentes para conceder descontos
As escolas que vão dar descontos nas mensalidades dos alunos encontraram maneiras diferentes de reduzir despesas. A Caminhos do Saber, por exemplo, adotou a medida provisória do governo federal que possibilita redução de carga horária com redução de salário para servidores. O quadro de professores não foi alterado, 100% estão trabalhando, conforme a direção, e 26% dos colaboradores dos setores de apoio, como manutenção e cozinha, entre outros, estão com redução de jornada ou suspensão. As coordenações pedagógicas, gestores, setor financeiro, secretaria, departamento pessoal e de tecnologia estão operando totalmente também. Mesmo assim, segundo a diretora Maristela Tomasi Chiappin, haverá também corte de investimentos para poder emparelhar as contas.
Já a La Salle disse que concedeu férias para alguns funcionários, mas que, pelo menos até esta segunda-feira, estava mantendo quadro e salários e absorvendo o desconto uniforme de 20% que dará no mês de maio aos pais. De acordo com Patricia Dall'Oglio, supervisora administrativa do La Salle, a escola já estava trabalhando na revisão da planilha durante o mês de abril, por isso, só foi possível dar o desconto em maio.
O Colégio São José também vai dar desconto linear de 20% para os quase dois mil estudantes no mês de maio. Segundo a direção, com o passar do tempo, se as aulas não forem retomadas, a situação será reavaliada. Não foi informado o impacto que a medida terá no estabelecimento de ensino.
De acordo com o Sindicato do Ensino Privado (Sinepe) RS, a orientação é para que cada escola negocie de forma individual com os pais conforme a necessidade cada família, mas a entidade também entende e respeita as negociações coletivas. Uma pesquisa realizada pelo sindicato no final de abril com 120 instituições de diferentes regiões do Estado apontou que 50,4% já estavam oferecendo descontos e outras 26,7% afirmaram que ainda pretendiam conceder.
Governo do Estado avalia possibilidade de retorno das aulas
O governo do Estado deve concluir até o final desta semana os protocolos para que alunos, professores e servidores possam retomar as aulas na rede privada com segurança. As exigências serão lançadas com todas as regras de funcionamento para as atividades econômicas.
Por enquanto, em caráter transitório, as aulas nas escolas particulares seguem suspensas assim como nas demais redes de ensino. Porém, conforme o governo, é possível que haja uma antecipação da retomada, o que pode ocorrer ainda em maio. Isso dependerá das condições das instituições de atender o que ficar estabelecido nos protocolos. No caso da rede pública, o governo precisará do mês de maio para se preparar com aquisição de equipamentos e insumos para o retorno projetado para junho.
Ministério Público pediu informações sobre ganhos e gastos às escolas
Para a promotora Janaína de Carli dos Santos, da 1ª Promotoria Especializada, e que trata de casos de defesa do consumidor, houve avanço na questão envolvendo escolas particulares e famílias porque foi estabelecido diálogo entre pais e estabelecimentos. A promotora também notificou 20 instituições de ensino para que encaminhassem à promotoria informações sobre as planilhas de gastos e receitas que justificassem a cedência ou não do desconto.
– Pedimos que as escolas reavaliassem as suas planilhas e fossem transparentes com as famílias, indicando qual desconto poderia ser dado ou se não poderia ser dado nenhum desconto e o motivo. O que queremos é atuar como intermediadores entre as partes – declarou a promotora.
A promotora regional de Educação, Simoni Martini, acompanha a questão das aulas não presenciais que foram adotadas pelas instituições de ensino para repassar os conteúdos aos alunos. Ela lembrou que o Conselho Nacional de Educação validou as aulas não presenciais como horas aulas. Além disso, já havia previsibilidade pelo Conselho Estadual de Educação de contabilizar ensino domiciliar como aula presencial.
– Há amparo legal para que as escolas possam fazer as aulas não presenciais, até porque não se sabe quando serão retomadas as aulas, em que condições – considerou a promotora Simoni.