Ovacionados nas redes sociais, os profissionais da saúde vivem o paradoxo da cobrança no trabalho e da indiferença. Se muitos relatam dificuldades para ter acesso a equipamentos de proteção individuais (EPIs) contra o coronavírus, outros sentem-se desvalorizados, caso da enfermeira Tassiana Cancian, 42 anos. Há pouco mais de duas semanas, ela prestou atendimento para um paciente que, dias depois, foi diagnosticado com covid-19 em Bento Gonçalves. Na ocasião, a pandemia não era realidade na Serra e os protocolos de segurança atuais não haviam sido implantados.
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Alguns dias após o contato com o paciente, Tassiana passou a ter sintomas suspeitos como tosse e dor de garganta. Uma semana depois, veio a falta de ar, dores no corpo e uma diarreia, indicativos de que pode estar com coronavírus. No sábado, dia 28, procurou atendimento médico num hospital de Caxias do Sul, onde tem plano e reside, e foi surpreendida com a negativa da instituição em ofertar o teste.
- Fiquei surpresa quando disseram que para coletar eu tinha de ser da saúde ou estar internada. Mas eu sou da saúde e imaginava que tivesse prioridade. Me mandaram voltar segunda-feira para pegar um painel viral para ser enviado para exame no Lacen (Laboratório Central de Saúde Pública, em Porto Alegre), mas tinha o custo de R$ 220 - descreve a enfermeira.
A profissional manteve contato com a Vigilância Epidemiológica de Caxias por telefone e soube que não seria possível fazer o exame, pois já haviam passado sete dias desde o início dos sintomas e ela não se encaixava nos critérios. Foi um baque. No mesmo período, Tassiana havia solicitado desligamento do hospital em Bento Gonçalves e recebeu a notícia de que seria monitorada à distância.
Se antes a enfermeira já mantinha distância dos dois filhos e outros familiares por prudência, agora esse isolamento é total.
- Já faz um mês que estou isolada. Fiquei com medo de trazer para casa. Deixei um filho com minha mãe, um filho com o pai (ex-marido de Tassiana).
Sozinha, ela tenta tratar os sintomas sem saber se é ou não uma vítima do coronavírus.
- Sem um exame, se eu morrer, ninguém vai saber que tive a doença. Só estou usando dipirona e paracetamol. Me senti muito desvalorizada, atuei na epidemia da H1N1. Sou enfermeira há 12 anos e acontece isso. É muito triste - desabafa Tassiana.
A diretora das Vigilâncias em Saúde de Caxias, Andréa Dal Bó, esclarece que realmente não é possível fazer um teste depois que já passaram sete dias dos primeiro sintomas.
- Até sete dias é o momento oportuno, mas após esse prazo pode dar resultado negativo. Gostaria de fazer, mas esse é o critério do Estado - explica a infectologista.
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