Passado quase um mês desde que a pandemia do coronavírus afetou diretamente a vida de todas as pessoas, muitas situações do cotidiano começam a ficar mais claras. Entre essas análises, uma que chama a atenção e que pode ter reflexos depois das restrições impostas para conter o contágio da covid-19 é o home office. Um estudo do coordenador do MBA em Marketing e Inteligência de Negócios Digitais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), André Miceli, prevê crescimento de 30% do teletrabalho no Brasil após a pandemia.
— O home office já se mostrou efetivo. Aliado a isso, você tira carros da rua, desafoga o transporte público e mobiliza a economia de outra forma. Você faz com que as pessoas tenham mais tempo para cuidar da saúde e que elas possam usufruir de coisas que lhes dão prazer sem que a empresa tenha redução das entregas e do faturamento — destaca o professor, em entrevista à GauchaZH.
O teletrabalho virou uma realidade para vários profissionais para evitar as aglomerações em escritórios. No entanto, a modalidade, conhecida também como trabalho remoto, tem mostrado que algumas profissões e funções podem ter um desempenho igual ou até melhor com os profissionais trabalhando em casa. A ideia de que uma atividade poderia ser realizada à distância já era quase consolidada para muita gente. Porém, durante o último mês, tem mostrado que isso pode se aplicar para muito mais gente.
Será o fim dos escritórios lotados?
"Acredito que é possível manter o trabalho remoto, mas não 100%"
Atuando no marketing de uma empresa de TI, Luana Rios, 23 anos, completará um mês trabalhando de casa neste domingo. A sua função, especificamente, exige comunicação, mas a área de atuação da empresa facilitou que o home office se tornasse uma realidade.
— Por trabalhar com tecnologia, nossa empresa não foi tão afetada. Todo mundo está conseguindo atuar de casa. Mas tem diferença. No escritório, temos um computador melhor, uma internet mais rápida e a questão da ergonomia. Em casa, a gente sabe que não é assim. E a relação com as pessoas muda. Antes tínhamos um convívio de uns 30 colegas e, agora, fazemos reuniões virtuais — diz Luana.
Para quem no dia a dia precisa encontrar respostas de mercado para melhor forma divulgar a marca da empresa, as adaptações ao desafio motivaram Luana. Para ela, achar a maneira adequada de realizar isso com o pouco tempo que as empresas tiveram para se reestruturar, é positivo:
— Uma coisa que vi de vantagem é que fomos obrigados a encontrar soluções criativas para resolver os problemas, para dar certo o home office.
Dentro das alternativas, uma rotina foi preciso. Se antes o cotidiano era “automático”, em casa é preciso ter regras.
— Antes, tinha aquela rotina de acordar, ir para o trabalho e ver as mesmas pessoas. Hoje, não. Posso trabalhar de qualquer lugar, com outras ferramentas. E, claro, a comodidade. Estar em casa, seguro, tanto da covid 19, quanto de outras situações — diz ela, revelando um dos principais benefícios, principalmente nos dias mais frios:
— Posso tomar um café agora, estou do lado do fogão a lenha, então está tranquilo. Tu consegue ser multitarefas.
Driblando as adversidades do trabalho remoto e aproveitando os benefícios da adaptação de exercer funções em casa, Luana faz uma reflexão sobre o futuro de sua atividade profissional.
— Minha função tem condições de ser realizada em casa, sim. Estamos conseguindo executar o que necessitamos. Então conseguiria fazer isso por muito mais tempo, não só por ser durante uma crise — diz ela, alertando que ainda há outras situações que evitam que toda a atividade possa ser à distância:
— Temos uma frente mais operacional, mas têm outras que precisamos estar mais presentes e atuantes. Acredito que é possível manter o trabalho remoto, mas não 100% como está hoje. Precisaria realizar ações de marketing presencial e endomarketing. Daí exigiria um contato maior com as pessoas.
Hoje estou mais próximo do meu local de trabalho, literalmente
Para o publicitário e diretor de arte Paulo Henrique Prior, 26, o tele-trabalho determinado por conta da pandemia da covid-19 facilitou a sua vida. Morador de Caxias do Sul, ele trabalha em uma agência de publicidade de Bento Gonçalves. Para cumprir a função, Prior divide a rotina nas idas e vindas entre as duas cidades, seja de moto, de ônibus ou em algum dos grupos de caronas que se formam entre pessoas que fazem o mesmo trajeto, e as noites em que fica na casa dos avós, em Bento, no decorrer da semana. Mesmo com algumas adaptações necessárias com o novo local de trabalho, o publicitário se mostra contente com a pausa temporária nas viagens.
— Nesse sentido, é muito positivo ficar em casa, apesar de sentir esse isolamento, da falta do contato de trabalhar em um lugar com 50 pessoas. Mas não ter o deslocamento é uma parte muito vantajosa. Hoje estou mais próximo do meu local de trabalho, literalmente.
Entre as medidas tomadas pela agência em que Prior trabalha, uma das que mais ajuda na adaptação do publicitário ao trabalho remoto foi disponibilizar os próprios computadores para que os funcionários levassem para casa. Assim, não há perda de tempo com instalação de vários programas ou tendo a adaptação do trabalho de um computador pessoal. De casa, porém, há um risco muito grande de o profissional ficar mais tempo do que o que foi acordado no contrato de trabalho. Até por isso, Prior sabe que precisa cuidar desse ponto para não exagerar:
— Essa é uma questão bem delicada no mercado de agência. Então, foi uma preocupação grande desde que começou esse processo de home office. É muito mais fácil você trabalhar mais porque está tudo muito próximo. Mas sinto que está rolando um esforço coletivo na empresa para termos reuniões no início e no fim do dia para mantermos as coisas dentro do horário.
Outro ponto que as pessoas em casa estão adaptando e precisarão entender caso essa condição temporária se torne definitiva, envolve os barulhos. No caso de Prior, o ambiente de trabalho de meia centena de pessoas foi trocado por ele, o computador e uma infinidade de coisas ao redor tentando tirar o foco.
— Vai de um extremo ao outro. É impressionante como os barulhos de casa são muito menores, mas são muito mais fáceis para distrair, de você ir ver o que é e acabar não fazendo a função, como não acontece quando se está no meio de um monte de gente. Estou pegando o hábito de trabalhar com música, em caixa de som externa, longe dos fones de ouvido, até para preencher o ambiente — admite o publicitário.
Adaptado em casa, Prior sabe que sua função deve ter uma grande adesão ao tele-trabalho após as restrições de aglomeração em diversos lugares. Isso, no entanto, não o assusta:
— A minha função é totalmente passível de home office. A grande maioria dos cargos dentro de uma agência de publicidade podem ser assim. Acho que super funciona e dá para ter um desempenho e uma produtividade tão parecidas quanto estando na agência. Acho que até por essa facilidade vamos tentar manter essa estrutura o máximo possível antes de retornar à atividade normal.