Na semana passada, o Brasil fez reverência a médicos e demais profissionais da saúde. É uma justa homenagem para uma área vital na luta contra o coronavírus. No entanto, outras dezenas de profissionais estão nas ruas para garantir o conforto e a segurança de quem está em casa no isolamento. Eles também merecem o seu aplauso.
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Confira algumas histórias desses personagens anônimos.
O ônibus da empatia
Motorista da Visate, Valmir Chaves, 46 anos, tem visto os ônibus quase sempre vazios.
- A lotação que tem é nos bancos - observa.
Como testemunha do efeito do coronavírus sobre o transporte coletivo na segunda maior cidade do Estado, Chaves e colegas agora levam duas ou três pessoas em alguns horários. Boa parte da cidade está reclusa. Talvez fosse melhor seguir a atitude de grande parte da população, mas Chaves é resistência e mantém a tranquilidade. Precisa conduzir trabalhadores da saúde, do comércio, da limpeza urbana. Motorista agora é função essencial.
Até poucos dias, a vida era outra. Ônibus cheios, paradas com estudantes e trabalhadores, muitos horários a serem cumpridos. De repente, justo na virada do verão para o outono, as ruas esvaziaram e o trânsito deixou de ter a costumeira tranqueira. A empresa reduziu 70% da frota de veículos para evitar a aglomeração. Ontem, a escala tinha apenas 229 motoristas e 11 cobradores, o que corresponde a 21,9% do quadro funcional.
Na nova estação, transformada por um inimigo invisível, Chaves abriu o olhar para o próximo de um jeito especial. Entre anônimos que embarcam e desembarcam, o motorista passou identificar funcionários de hospitais, de supermercados. No tempo sem coronavírus, seriam passageiros comuns. Foi aí que ele se deu conta que as rotas dos ônibus são uma via de mão dupla. Quem presta solidariedade, também merece amparo. Chaves não quer parabéns, quer apenas exercer o seu papel, com segurança.
- A gente fica com receio de trabalhar, mas não adianta. Nossa profissão exige isso porque levamos pessoas que ajudam a população e dependem do ônibus para chegar ao trabalho. Dá para identificar esse trabalhador, geralmente estão de crachá - conta.
Estar num ônibus na companhia de pessoas não significa ser irresponsável. Ele e colegas carregam álcool gel e assumem o posto após a higienização. Pena que há passageiros imprudentes.
- Orientamos para não ficar muito próximo um do outro. As pessoas não vêm conversar tanto de perto com a gente, mas tem muito idoso que não precisa estar na rua e continua por aí.
Do volante, Chaves e colegas enxergam uma cidade se debatendo num terreno desconhecido. Outro dia, Volmar Freitas de Souza, 41, outro motorista da Visate, presenciou um pai em busca de comida para os filhos na esquina da Rua Sinimbu com a Rua Do Guia Lopes. Provavelmente era um algum trabalhador autônomo castigado pela perda repentina de renda.
- No Santa Fé, transportei uma senhora com muita tosse e que estava triste porque não conseguiu atendimento na UPA - conta Chaves.
Nesse vaivém pela calmaria urbana, acompanhada de uma turbulência virtual dentro dos lares, o motorista quer transportar somente esperança.
-- Tudo isso vai passar, com certeza - acredita.
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