Aprovada no vestibular e cheia de vontade de estudar, a aposentada Onira Marcante da Rosa, 54 anos, prepara-se para iniciar o curso de Licenciatura em Sociologia a partir deste sábado (22). A atividade, no modelo de Ensino à Distância (EAD), pela Unopar, será, ao longo dos próximos quatro anos, o foco da moradora do bairro Pio X, em Caxias do Sul.
O ingresso no Ensino Superior representa muito para a estudante que acaba de concluir o Ensino Médio cursado por meio do Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos (Neeja) Caxias do Sul. Depois de uma vida dedicada ao trabalho e à maternidade, Onira não tem intenção de voltar ao mercado, mas sente que finalmente chegou a sua hora de aproveitar o que não teve durante sua juventude: a oportunidade de estudar.
— Agora é a minha vez de fazer alguma coisa pra mim e Sociologia bateu com tudo que eu gosto. Adoro política, essas coisas que a gente não sabe que é manipulado. Sempre gostei disso mas não sabia — afirma a estudante, animada com a grade curricular proposta pelo curso.
Voltar a estudar tornou-se um dos principais desejos desde que Onira abandonou a escola com apenas 13 anos para trabalhar. Ela lembra da época em que, para uma menina do interior, o serviço braçal era mais necessário que o intelectual, o que a fez deixar sua terra natal, no interior de Nova Pádua - que à época pertencia a Flores da Cunha - para trabalhar em Caxias do Sul. Antes de se aposentar, trabalhou no comércio, em salão de beleza e em malharia.
— Casei, tive meu filho e a vontade permanecia, mas a gente acaba dando importância pra outras coisas — avalia Onira.
Em 1990 ela chegou a concluir o Ensino Fundamental, retomando apenas em 2017 os estudos para conclusão do Ensino Médio. O retorno foi desafiador, mas Onira mergulhou de cabeça, sobretudo diante da melhora do filho de 20 anos após o início de tratamentos para a síndrome de Asperger diagnosticada em 2019.
— Realizamos uma série de exames que nunca detectavam o que ele tinha. Sempre teve dificuldade de fazer amigos, de socializar. Agora entrou para a faculdade e graças à terapia ocupacional, está fazendo mais coisas sozinho e eu consigo deixar ele mais livre também — afirma a mãe, que mesmo assim, optou pelo modelo EAD para ficar perto dele; a recíproca desse carinho veio em forma de homenagem com a faixa que o filho fez parabenizando a mãe pela conquista no vestibular.
Nos últimos anos, Onira foi atuante na busca pelo conhecimento, mesmo depois da reestruturação do Neeja, no início de 2018, quando o número de professores foi reduzido e as aulas passaram a ocorrer de forma mais integrada, com diferentes disciplinas sendo lecionadas ao mesmo tempo — algo parecido com o que ela viveu na infância, na escola do interior. A vergonha por todos os anos que ficou sem estudar e outras tantas barreiras que surgem para quem fica longe dos estudos não a desmotivaram. Agora, o desafio digital do curso EAD também instiga a estudante a aprender melhor como usar o computador, ainda que ela faça questão de excluir da sua rotina tecnologias como o aparelho celular.
— Eu prefiro dar o telefone de casa. Parece até que as pessoas têm um amigo imaginário e é gente de todas as idades grudadas no celular. Será que tem tanto assunto assim pra falar que precisa ficar na tela 24 horas por dia? Lembro que telefone era um luxo, agora a pessoa já nasce quase com o celular — analisa a estudante, que já poderia até desenvolver uma pesquisa acadêmica sobre isso.
O tema do trabalho de conclusão, ou ainda uma possível pós-graduação, não foram definidos por Onira; o foco agora é usufruir de todo conhecimento que ela acessar por meio do curso, mas uma conclusão ela já tem:
— É muito bom aprender. Depois que começa a pegar o gostinho, tu não para mais.