Uma discussão que se arrasta há mais de ano e tira o sossego da comunidade parece estar longe de ter uma solução, a situação de precariedade do pórtico de acesso ao bairro Ana Rech, em Caxias do Sul. A empresa Marcopolo até cogitou ajudar na reforma da estrutura que se deteriora a olhos vistos e oferece risco a quem passa pelo local. O serviço, assim como a construção, seria feito em parceria com a Associação Amigos de Ana Rech (Samar). Mesmo com projeto, orçamento e disponibilidade de custeio em mãos, a iniciativa não avançou. O município teria outros planos para o lugar. Extraoficialmente, a prefeitura teria a pretensão de duplicar a Avenida Rio Branco e, para isso, teria que demolir o pórtico. Porém, a administração não confirma a intenção.
Para entender o imbróglio é preciso voltar ao centenário de Caxias do Sul, na década de 1990. As versões atuais sobre os fatos da época divergem um pouco de uma pessoa para outra, mas juntando as informações é possível compor a história do pórtico. Segundo a empresa, o então sócio proprietário da Marcopolo, Paulo Bellini, teria feito uma doação pessoal à Samar, que teria erguido o empreendimento. O atual presidente da Samar, Alberto Sales, corrobora com o relato. Já o secretário de Planejamento da época, Adir Ubaldo Rech, conta que o município não só autorizou a construção, como elaborou o projeto e ergueu a parte de alvenaria. Em maio deste ano, a Secretaria de Obras chegou a emitir ofício dizendo que o pórtico pertence à Marcopolo e, portanto, não pode realizar intervenções na estrutura. Contudo, na última segunda-feira, a prefeitura não respondeu às perguntas da reportagem sobre se tem ou não a propriedade sobre o pórtico, se tem responsabilidade sobre a reforma ou intervenção que garanta segurança dos munícipes, se algum engenheiro da prefeitura ou Defesa Civil já analisou a estrutura que visivelmente oferece risco às pessoas e qual solução será dada ao caso.
Um laudo feito por empresa de engenharia a pedido da Marcopolo atesta que a degradação ocorreu mais visivelmente nos últimos dois anos tendo como causa provável a umidade: partes do revestimento de madeira despencaram sobre a via; também há risco de queda das telhas de cerâmica e do forro externo; a parte de alvenaria apresenta fissuras; existem vários pontos de infiltração que causaram danos visíveis nos materiais usados na construção; e a rede elétrica e as luminárias estão comprometidas. A conclusão do laudo diz que a estrutura não oferece segurança aos pedestres e veículos que transitam sob o pórtico. A queda de materiais agravada pela falta de manutenção, "obriga as partes responsáveis pela estrutura à imediata ação de reconstituição e reforma com alto custo ou demolição total do pórtico". Esta última que, na opinião da empresa que fez o laudo, seria a melhor solução.
Pórtico pertence ao município
Uma das questões que envolvem o caso é a quem o pórtico pertenceria – prefeitura ou Marcopolo – e, portanto, a quem caberia providências. Para o professor de Direito Administrativo, Adir Ubaldo Rech, que também é ex-secretário de Planejamento do município (na administração de Mário Vanin), não há dúvida de que a responsabilidade é da administração municipal.
– Quem fez o projeto foi a Secretaria de Planejamento do município que eu coordenava, à época, e a parte de alvenaria foi construída pelo município. Houve parceria com a Marcopolo para a parte de acabamentos. Mas o pórtico é público. Inclusive, houve, no plano diretor da época, a transformação dessa região em local de interesse turístico. Depois, isso se perdeu no tempo – conta Rech.
De acordo com o professor, esses projetos devem estar arquivados na Secretaria de Planejamento da prefeitura.
– Quem construiu esse pórtico foi a Sociedade Amigos de Ana Rech, na época, com uma contribuição de pessoa física dos controladores da Marcopolo. O pórtico não é da Marcopolo, está na via pública, não temos ingerência sobre ele. Óbvio que com o passar do tempo e falta de manutenção começamos a ficar preocupados. Pedimos o laudo, justamente, para demonstrar o quão importante é uma intervenção urgente. Talvez, hoje, já não seja uma reforma e ele tenha que ser reconstruído – afirmou Rodrigo Pikussa, diretor do Negócio Ônibus Brasil da Marcopolo.
Pikussa conta que, preocupada com a degradação do pórtico, no ano passado, a empresa procurou a Secretaria de Obras que se dispôs a ajudar com equipamentos. A proposta era que a empresa doaria os materiais necessários para fazer a reforma e que a Samar entrasse com o custo de mão de obra. Mas, na época, a Samar não teria condições financeiras. O tempo foi passando e a situação do pórtico piorando.
A atual administração não nega nem confirma que tenha responsabilidade. Disse apenas, por meio da assessoria de imprensa, que "informações semelhantes foram pedidas pela Câmara de Vereadores e, quando forem respondidas à Câmara, poderão ser encaminhadas para divulgação da imprensa".
Quem solicitou informações foi o vereador Ricardo Daneluz (PDT).
O que dizem os envolvidos
"Tenho escritório na frente do pórtico. Estou vendo ele cair todos os dias."
Elias Zapparolli, design de interiores, que fez gratuitamente o projeto de restauração do pórtico e o orçamento da obra
"Havia uma conversa de que se pudesse fazer isso a três mãos, Secretaria de Obras, Marcopolo e Samar para a execução. Caberia à Marcopolo a doação dos materiais, que equivaleria a cerca de 50% do valor. Caberia à Samar fazer a execução. Não nos isentamos de fazer algo. A Marcopolo segue comprometida com ele (pórtico). Só não temos condições de fazê-lo sozinhos."
Rodrigo Pulsa, diretor do Negócio Ônibus Brasil da Marcopolo
"A Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos poderá auxiliar disponibilizando caminhão com cesto aéreo, caminhão guincho e com bloqueio viário em parceria com a Secretaria Municipal de Trânsito, Transporte e Mobilidade. A secretaria não tem atribuição de cuidar dos pórticos da cidade."
Leandro Pavan, secretário municipal de Obras e Serviços Públicos
"Tinha um grupo de empresários que, junto com a Marcopolo, tinha liberado o valor para fazermos a reforma do pórtico. Quando fomos pedir a liberação (na prefeitura) para fazer a reforma, não liberaram, porque alegam que querem duplicar a (Avenida) Rio Branco. Daí, o pessoal (empresas) se retiraram porque não querem se comprometer em fazer um investimento em algo que a prefeitura pode, de uma hora para outra, demolir."
Alberto Sales, presidente da Samar