A falta de profissionais nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) de Caxias do Sul prejudica não apenas os pacientes, mas também o Sistema Único de Saúde (SUS) na cidade. Os pacientes buscam atendimento nos postos de saúde dos bairros, mas sem ter como consultar, eles partem para os serviços de urgência e emergência, como a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) Zona Norte, que lota, e não tem como atender à demanda. Os pacientes, por sua vez, acabam convivendo com a dor e a incerteza do diagnóstico.
Levantamento da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) realizado no dia 18 deste mês, aponta a falta de 31 médicos na rede pública de saúde. Das 49 UBSs, 23 têm algum tipo de restrição no atendimento devido à falta de profissionais (ver quadro). Destas 23, em seis postos faltam mais de um profissional.
No posto do Diamantino, por exemplo, faltam dois clínicos gerais e um pediatra. No posto do Desvio Rizzo, um clínico e um ginecologista. Na UBS Esplanada, a carência é de um ginecologista e um médico de Estratégia Saúde da Família (ESF).
A Secretaria da Saúde esclarece que a ausência de profissionais considera o número necessário para ampliar a cobertura médica na rede básica e melhorar o atendimento à população, adequando a oferta à demanda.
De acordo com o município, nenhuma comunidade está desassistida, já que todas as UBSs contam com ao menos um médico, sendo que a maioria dispõe de um número maior, conforme as necessidades locais.
A situação, no entanto, tem revoltado a população, uma vez que os pacientes acordam cedo para tentar garantir atendimento, e mesmo assim não conseguem consultas. Funcionários dos postos dos bairros Esplanada e Desvio relataram à reportagem que os pacientes têm dificuldades no atendimento.
— Eles buscam atendimento mais de uma vez por semana, e não há médicos. Ficam angustiados, e não sabem a quem recorrer. Muitos desabafam e sabemos que são pessoas que não têm condições de procurar atendimento em outros lugares, que muitas vezes vem a pé até o posto de saúde porque não tem dinheiro para a passagem de ônibus. Como vão ir para a UPA? Eles seguem com dor e a situação se agrava cada vez mais — conta uma enfermeira que tem a identidade preservada.
Outra servidora diz que quem mais reclama são os idosos:
— Eles têm prioridade de agendamento por telefone nas quintas feiras das 13h30min às 14h30min, mas muitos não conseguem vir e optam em buscar atendimento mais cedo para poder consultar. Muitos têm dificuldade para ligar e outros nem tem telefone, daí eles vem cedo para a fila, só que na fila das quintas-feiras, por exemplo, eles não tem prioridade.
No dia 3 de julho, a paciente Geni Salete da Silva, 59 anos, se acorrentou à porta do posto de saúde de Ana Rech em protesto à falta de um clínico geral na UBS. Demais manifestantes portavam faixas e cartazes para reivindicar ao poder público a reposição de profissionais. Ela contou à reportagem que precisa sair de casa, que fica no limite com São Marcos, por volta das 3h30min, para tentar ser atendida. Somente uma profissional atende na UBS, e assim os horários são reduzidos.
O QUE DIZ A SECRETARIA DA SAÚDE
O município argumenta, em nota, que "apesar de o quadro profissional ainda não ser o ideal para prestar uma assistência de excelência aos usuários, a rede municipal de saúde conta atualmente com médicos comprometidos, que cumprem a sua carga horária e registram o seu ponto, como todos os demais servidores.
Sabe-se que, historicamente, antes da administração do prefeito Daniel Guerra, era prática habitual na SMS os médicos não cumprirem a carga horária e ainda terem essas horas, bem como as faltas injustificadas, abonadas".
O secretário da Saúde, Júlio César Freitas da Rosa, afirma que apesar de deficiências, hoje são realizados mais atendimentos do que há dois anos. Segundo ele, isso ocorre também devido ao comprometimento dos servidores que permanecem na rede
— Graças ao servidores que respeitam os usuários, cumprindo com seus deveres, realiza-se mais atendimentos do que há dois anos. Em 2016, por exemplo, 365.684 atendimentos médicos foram realizados na Atenção Básica. Em 2018, foram 428.975. De janeiro a maio deste ano, 249.021 — afirma o secretário.
Ele reitera ainda que o município tem utilizado todas as alternativas possíveis para completar o quadro médico da rede básica.
— Fazemos nomeações, contratos emergenciais e realocações entre os serviços, como ocorreu no ano passado, com a transferência de cerca de 60 médicos que atuavam no Postão para as UBS's. Enfrentamos algumas dificuldades em função das características do serviço público e dos interesses profissionais da categoria. Apesar das nomeações recorrentes de médicos, muitos não tomam posse. Há dificuldade também nas admissões emergenciais — explica.
O secretário aponta que o cargo de médico de Estratégia de Saúde da Família (ESF) para 40 horas semanais foi criado por iniciativa desta administração. O primeiro concurso para selecionar estes profissionais ocorre neste domingo (21) a partir das 14h. Os candidatos inscritos para o processo seletivo sabem as características do cargo e que terão que atuar na rede básica de saúde.
— O fato de não haver no município, até pouco tempo, o cargo de médico de ESF (40 horas semanais), ainda obriga a admissão de tais profissionais por meio de contratos emergenciais. Ocorre que dessa forma, o médico não cria vínculo com o município. A qualquer momento, por motivos pessoais e outros interesses, ele pode pedir desligamento, sem aviso prévio. Observa-se grande rotatividade entre esses profissionais, apesar de os contratos preverem até dois anos de atuação. A expectativa é de uma adesão maior, a partir das nomeações depois do concurso — explica ele.
Neste mesmo processo seletivo, também há vagas para clínicos, pediatras e outros diversos especialistas.
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