Uma construção em formato de tenda, que foge do padrão arquitetônico predominante, à base de concreto, de Caxias do Sul, desperta a curiosidade de muitas pessoas que passam pela Rua Doutor Montaury, em frente ao Parque dos Macaquinhos.
A placa identifica, por isso todos sabem que trata-se do templo da comunidade Cristo Bom Pastor, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). O que poucos sabem, porém, é como esse prédio foi construído e o que ele, de fato, representa para os luteranos da cidade que, neste final de semana, celebram os 50 anos da inauguração do templo.
Ninguém melhor que Seno Schwingel para falar sobre a construção, que iniciou em 1968 e teve o primeiro culto celebrado no dia 15 de junho de 1969. Aos 79 anos, ele lembra de como ocorreu a negociação do terreno para instalação da Igreja, em uma época que a comunidade era presidida por ele e contava com cerca de 50 famílias que se reuniam na Igreja Metodista, localizada na Avenida Júlio de Castilhos.
Inicialmente, o terreno comprado pela comunidade era o da quadra ao lado, onde fica o condomínio Parque do Sol. Foi justamente o projeto de um dos maiores prédios da cidade que fez com que o templo acabasse estabelecendo-se no local atual. Isso após muitas negociações, é claro.
— Era o único terreno vendido fora da propriedade da construtora, já vínhamos fazendo mutirões para remoção de terra e preparação para a construção, quando eles nos ofereceram outro local, fomos negociando e acabamos conseguindo este que é quatro vezes maior — conta Schwingel.
De acordo com ele, o líder da negociação foi o pastor missionário americano Robert Maland, que atuou em Caxias do Sul e também foi responsável pela captação de recursos à construção do templo, provenientes de uma obra evangélica da Alemanha.
A obra iniciou com a construção da casa paroquial e, logo em seguida, a parte de baixo do tempo, que abrange salas, banheiros e um salão comunitário com cozinha, onde a comunidade realiza as confraternizações. O templo, em si, ficou pronto no mesmo ano e foi feito com madeiras trazidas de Porto Alegre.
— Esse tipo tenda a gente não conhecia por aqui. Não tinha nem quem fizesse com madeira compensada, colada, um trabalho bem diferente pra época — relembra.
Um templo que acolhe
O conforto e acolhimento sentidos por quem adentra o local não se dá por por acaso. O templo, que comporta 330 pessoas acomodadas, é considerado uma segunda casa às 270 famílias que integram o quadro de membros da comunidade.
Não apenas nos cultos de domingo, realizados às 9h30min e às 19h30min, crianças, casais, jovens e senhoras contam com programações ao longo da semana, dentro e fora do espaço religioso, fortalecendo o espírito comunitário que, para eles, dá sentido ao evangelho de Jesus Cristo, pregado segundo Martinho Lutero.
Originada de imigrantes alemães, a congregação brasileira foi oficializada em 1968 com a organização de sínodos, formados a partir de comunidades evangélicas que já atuavam no Estado desde 1824. Em Caxias do Sul, o primeiro culto luterano registrado data de 3 de agosto de 1946.
Assim como a originalidade do prédio, também é mantida na comunidade local a essência da religião, que tem menos de 1% de adeptos diante da predominância católica, representada por 76% dos caxienses de acordo com dados de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Com base na fé e na simplicidade, a comunidade local foi a primeira evangélica do Estado a adotar o sistema de contribuição espontânea, em um formato no qual cada fiel deposita um valor por meio de envelope distribuído durante os cultos.
— Cada um contribui conforme sua prosperidade, com o que tiver no seu coração e, por incrível que pareça, isso funciona, nunca faltou dinheiro — relata o pastor André Müller, que atua há 11 anos em Caxias.
O templo e seu simbolismo
Conforme relato publicado no folheto do primeiro culto, o templo luterano de Caxias do Sul é repleto de significados relacionados à crença religiosa. O desenho arquitetônico em forma triangular, remete à Santíssima Trindade.
A semelhança com uma tenda também é proposital, fazendo referência a Abraão e outros personagens de Israel que moravam em tendas. Ainda de acordo com o texto, a cruz predomina na fachada que convida os cristãos a entrarem no templo para adorar a Deus. Uma obra de arte feita de ferro, na parede do altar, representa Jesus como pastor. O púlpito, com 12 colunas, remete aos ensinamentos de Cristo aos 12 apóstolos relatados pela Bíblia.
Nos vitrais, as duas letras gregas alfa e ômega indicam a eternidade divina, enquanto as tábuas lembram os dez mandamentos. No anexo, a rosa de Martinho Lutero.
Cápsula furtada
A pedra angular identificada com a data de início das obras do templo, também funciona como uma cápsula do tempo, onde os fundadores incluíram objetos e documentos relacionados ao período da construção. Em 1989, ano em que o local completava 20 anos, a cápsula foi furtada e um novo depósito precisou ser feito, ainda sem data para ser aberto.
— As pessoas que furtaram devem ter pensado que encontrariam ouro, mas todo luterano sabe que uma das teses que Lutero escreveu em 1517 diz que "o verdadeiro tesouro da Igreja é o santíssimo Evangelho da glória e da graça de Deus", a gente não guarda ouro aqui, nosso tesouro é a palavra de Deus, o Evangelho — destaca o pastor.
:: CULTO FESTIVO
No domingo (16), a Igreja Cristo Bom Pastor terá um culto comemorativo aos 50 anos do templo, com participação da presidente da IECLB, Pastora Silvia Genz, e da pastora sinodal Tania Weimer. O encontro inicia às 9h30min, no templo localizado na Rua Montaury, 1851, em frente ao Parque dos Macaquinhos, em Caxias do Sul.