As pessoas que doaram camas, lençóis, louças, fogão, máquina de lavar e uma lista grande de utensílios num período de apenas três dias para viabilizar a abertura da Casa de Acolhida Papa Francisco, no bairro São Caetano, certamente desconhecem a história de Maria (nome fictício), 18 anos. Mas foi esse gesto de compaixão que reescreverá daqui por diante a vida dela e de outros rapazes e moças que estão prestes a deixar abrigos e não têm para onde ir em Caxias do Sul. A Casa Papa Francisco, sob a supervisão da Associação Mão Amiga, acolherá jovens que completam 18 anos e deixam as casas lares por não terem sido adotados, caso de Maria.
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Jovens de 18 anos que deixam abrigos sem ser adotados terão lar provisório a partir de fevereiro
A estudante do 3º ano do Ensino Médio reside numa casa lar há oito anos. Longe da família biológica desde os 10, ela já teve pais adotivos e não deu certo. Quando completou a maioridade em setembro do ano passado, se viu diante do período mais temido para jovens sem família. Maria deveria deixa o lar provisório e seguir a rotina lá fora por conta própria. Ganhou, porém, um prazo a mais do Juizado da Infância e Juventude, que autorizou a permanência dela até fevereiro deste ano. Não fosse a iniciativa de voluntários para inaugurar a Casa de Acolhida ainda em fevereiro, a jovem certamente estaria numa enrascada. Desempregada e sozinha, não teria condições de achar uma moradia.
— Eu não tinha condições de viver sozinha. Estava planejando pagar aluguel, mas ainda não tenho emprego, então seria bem complicado. Estou muito feliz que vai ter esse apoio — desabafa Maria.
A abertura do serviço só será possível porque moradores de Caxias do Sul responderam com rapidez e abundância aos pedidos de doações. A casa precisava de itens diversos para aparelhar quartos, cozinha, banheiros e sala de estar. O apelo foi divulgado na edição do dia 8 de janeiro do Pioneiro. Conforme o frei Jaime Bettega, o projeto recebeu quase tudo o que necessitava num único dia e ainda há pessoas encaminhando donativos.
Não bastasse isso, 30 voluntários compareceram para um mutirão de reparos, limpeza e pintura no último final de semana, incluindo um grupo de voluntários das empresas Randon.
— Sempre que possível, nós tentamos ajudar — diz Maurien Randon, filha de Raul Randon e uma das pessoas que ajudou a pintar a casa no último sábado.
COMO ERA A CASA ANTES DA AÇÃO DE VOLUNTÁRIOS
COMO A CASA FICOU APÓS OS REPAROS
"Agora, quero me estabilizar", diz jovem
Maria agradece o empenho de tanta gente. A jovem segue a procura emprego e tem experiência na área de logística, onde atuou como menor aprendiz. Com a ajuda da Casa Papa Francisco, ela espera ter chance de conseguir uma vaga no concorrido mercado de trabalho caxiense, conquistar a autonomia e lutar pela guarda de dois irmãos dela, que são menores de 18 anos e vivem em abrigos separados.
— Já tive uma família adotiva, mas não deu certo. Voltei para o abrigo há um ano. Agora, quero me estabilizar para ter meus irmãos ao meu lado, ficar responsável por eles. Tem muitas pessoas que conheci no abrigo e foram embora quando completaram 18 anos, mas enfrentaram muitos problemas por não terem estrutura. Quando chega a hora de sair, tu fica indeciso, não sabe o que vem pela frente — diz Maria.
A seleção dos jovens que serão acolhidos ainda está em andamento. Na casa, eles terão suporte para os gastos com alimentação e outras despesas até conquistarem a independência financeira. Os acolhidos poderão permanecer no local até os 21 anos. O serviço será administrado inicialmente pelo projeto Mão Amiga e terá capacidade para até 15 moradores.
Abertura mantida para fevereiro
Voluntário que se desdobra para abrir a casa, Altair Vaiteroski de Lima garante que a obra será concluída até o início de fevereiro. Nesta semana, estão sendo colocados os pisos e um poste de energia elétrica. A intenção é inaugurar o espaço em seguida, em data a ser agendada.
— A pintura interna e externa está concluída, faltará apenas a ligação de energia. As doações foram muito importantes. Uma só pessoa doou 10 beliches novos — revela Altair.
Segundo Bettega, um dos objetivos é tentar estabelecer uma parceira com o poder público no futuro. O imóvel foi doado pela Associação de Moradores e pelo Clube de Mães do São Caetano.
— É admirável o retorno da comunidade. Caxias encanta pela bondade — agradece o frei.