Seguindo o exemplo de cidades como Pelotas e Porto Alegre, Caxias do Sul deve passar a contar com um mercado das pulgas ainda neste ano. O projeto de lei que propõe a iniciativa foi aprovado por unanimidade na sessão da última terça-feira na Câmara de Vereadores, e agora depende da sanção do prefeito Daniel Guerra (PRB) para entrar em vigor. O nome pode soar inusitado para quem não está familiarizado com o termo. Na prática, porém, esse tipo de comércio é simples: uma feira ao ar livre com venda de antiguidades, artigos para coleção e raridades.
— É estranho o nome, mas quem conhece esse tipo de evento sabe que funciona. Tanto que é bastante tradicional em várias cidades brasileiras e também em outros países — comenta o propositor, vereador Alceu Thomé (PTB).
Um dos exemplos mais conhecidos de mercado das pulgas é o tradicional Brique da Redenção, na Capital. Mundialmente, há famosas feiras em Paris, Lisboa, Nova Iorque, Londres e, mais próximo, Buenos Aires, com a conhecida Feira de San Telmo. Estima-se que o modelo de comércio surgiu nos subúrbios franceses há mais de 130 anos.
Deu-se nome em razão especialmente das roupas de segunda mão que eram vendidas nesses locais e que seriam, supostamente, infestadas de pulgas. Gradativamente, o estilo de venda expandiu-se para diversas capitais e metrópoles e a fama ruim logo se extinguiu, embora o termo pejorativo tenha se consolidado.
Um dos apelos do projeto, conforme o vereador, é que não há necessidade de investimentos por parte da prefeitura. O envolvimento do poder público se limitaria à oferta do espaço — a proposta sugere a utilização da Praça das Feiras, no bairro São Pelegrino — e no processo de cadastro dos expositores, por meio da Secretaria do Urbanismo.
— A ideia seria começar pelos vendedores da cidade e depois expandir para a região. A prefeitura só precisaria apoiar com o espaço e explorar o potencial turístico e cultural — complementa o parlamentar.
Conforme o projeto, a feira aconteceria no último domingo de cada mês, das 9h às 17h30min (ou até às 20h no horário de verão). O proponente do projeto também sugere a participação de artistas e bandas locais nos dias de evento.
Tradicionalmente, em mercados das pulgas costumam ser expostos itens como livros e roupas usadas, utensílios antigos como móveis, talheres e louças, artigos para coleção como selos, moedas, postais, facas, máquinas fotográficas e de escrever, além de discos de vinil e livros, entre outros.
O secretário da Cultura de Caxias, Joelmir da Silva Neto, preferiu não se manifestar sobre o projeto, alegando que antes a proposta precisa ser sancionada pelo prefeito.
Proposta bem recebida por vendedores
Para garimpeiros de antiguidades que já praticam esse tipo de comércio a ideia foi recebida de forma positiva.
De antemão, o comerciante Leomar Emilio Knopp já demonstra interesse em participar do mercado das pulgas caxiense. Ele diz que não tem um local fixo para vender e, normalmente, recorre a parcerias com estabelecimentos ou eventos para conseguir comercializar seus produtos. Por isso, a feira, segundo ele, seria útil para melhorar os negócios.
— É uma proposta interessante. Caxias não tem esse costume e ter um local para fazer eventos mensais é uma boa ideia. Conheço, pelo menos, 10 pessoas que garimpam coisas usadas para venda e que, certamente, teriam interesse — comenta.
Dispondo de talvez o mais expressivo acervo de antiguidades na cidade — atualmente com mais de 15 mil peças —, o antiquário Jonathan Lee Franco também celebra a novidade. Embora conte com um ponto fixo, ele costuma participar de feiras e acredita que a implantação de uma local de referência deva contribuir para incentivar a expansão da prática:
— Em eventos sem muita divulgação, consigo atrair mais de 100 visitantes. As pessoas têm muito interesse nesse tipo de coisa (antiguidades) e quem começa a colecionar não para mais — afirma.
Porém, apesar de se tratar de um comércio de caráter mais livre, Knopp sugere que seja estabelecido relativo controle e organização:
— Seria interessante ter cuidado no cadastramento dos vendedores, estabelecer um mínimo de bancas e exigir a presença dos negócios cadastrados. Não pode deixar que em um mês tenha poucos comerciantes, por exemplo.
"A experiência de Pelotas foi um êxito"
Há cerca de quatro anos, a prefeitura de Pelotas tomou a decisão de instituir o mercado das pulgas na cidade. Embora a iniciativa tenha sido um tanto despretensiosa à época, logo o interesse de comerciantes e da população foi crescendo e, já na primeira edição, o evento foi um sucesso.
— Começamos com 20, 30 expositores. Hoje, tem fila para entrar. É difícil estimar, mas devem passar cerca de mil pessoas todos os finais de semana em nossa feira — comenta o secretário de Cultura de Pelotas, Giorgio Ronna.
O comércio de antiguidades é realizado na cidade todos os sábados, das 10h às 17h, no Largo Edmar Fetter, junto ao Mercado Central. Conforme o secretário, antes sem muita credibilidade junto à população, o local acabou tornando-se referência turística e cultural desde que o evento surgiu. Ali, também acontecem ações culturais, como apresentações de teatro de rua, rodas de capoeira e de samba.
— Começamos a receber pessoas da região desde a terceira edição. Hoje, turistas vêm visitar especificamente o mercado das pulgas. A experiência de Pelotas foi um êxito muito grande — garante.
Nesse tempo, ele também comenta que cresceu a qualidade dos produtos expostos. Atualmente, contanto com 60 vendedores, ressalta que o mercado consolida-se, sobretudo, como um ambiente de integração social.
— É um lugar de convivência e diálogo. Os objetos estimulam a memória e a interação. Você vê um pilão antigo, comenta algo com o vendedor, uma outra pessoa ouve, relata uma história e assim prossegue — salienta Ronna.
Apoio não deve se ater ao institucional
Embora o projeto previsto para Caxias indique pouca participação do poder público, o secretário de Cultura de Pelotas afirma que a prefeitura atuou de forma direta na organização do evento, o que, segundo ele, garantiu a execução eficiente. Conforme Ronna, o poder público estimulou, também, a criação de um grupo de antiquários para articular o planejamento das feiras.
— É preciso ter controle do material para não descaracterizar. Em Pelotas, por exemplo, somos muito exigentes com o tipo de artesanato que é exposto. Não pode ser qualquer item, tem de ter vínculo ou fazer sentido estar dividindo espaço com as antiguidades — comenta.
Ele também sugere a instituição de regras. Em Pelotas, por exemplo, se um vendedor não aparece por três eventos seguidos sem justificar, ele perde a vaga do espaço e precisa entrar na fila novamente. O secretário relata que outra questão que acabou surgindo no início do projeto foi a disputa por espaços.
— É interessante definir locais fixos para não haver conflitos, caso contrário, vendedores às vezes ocupam, sem saber, espaços que já eram utilizados por outros e isso causa algum ruído. Precisa haver também planejamento para evitar que dias de sol excessivo ou própria chuva atrapalhem o evento.
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