A angústia dos mais de 4.451 pacientes que vivem o drama de esperar meses _ e até anos _ por uma cirurgia eletiva (não urgente) em Caxias do Sul ainda está longe de acabar. Tanto a Secretaria Municipal de Saúde quanto o Hospital Pompéia, que realiza grande parte dos procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) na cidade, admitem falta capacidade hospitalar, e, principalmente, recursos para aumentar a quantidade de cirurgias para reduzir o número de pacientes que aguardam na fila.
Leia mais:
Quase 40 mil pessoas esperam por consulta com especialistas em Caxias do Sul
Saiba quais as cirurgias eletivas autorizadas, mas não realizadas pelo SUS em Caxias do Sul
A sobrecarga nos hospitais é histórica, e a demora existe porque não há leitos suficientes, uma vez que Caxias do Sul paga o preço por ser referência para 49 municípios, o que impacta também o orçamento. A prefeitura destina 25% dos recursos para a saúde quando poderia repassar apenas os 15% exigidos por lei, e garante que opera no limite da capacidade financeira. Por mês, são disponibilizados mais de R$ 2,6 milhões a instituições de saúde na cidade.
A situação é a mesma enfrentada nos hospitais Pompéia e Geral (HG). No primeiro, há 1.649 pacientes com laudos autorizados para cirurgia, mas elas não ocorrem em função do teto orçamentário. As duas instituições, inclusive, operam com déficit financeiro _ de R$ 880 mil mensais no caso do Pompéia, e R$ 7 milhões/ano, no caso do HG _ e a capacidade hospitalar está sempre no limite.
A questão passa ainda pela falta de médicos nas unidades básicas de saúde (UBSs), já que sem o atendimento na rede básica o estado de saúde do paciente que chega aos serviços de urgência piora e eles ficam cada vez mais doentes. Um levantamento do Pioneiro aponta que faltam profissionais em 32 das 48 UBSs. Juntos, eles poderiam fazer 3,6 mil consultas por semana.
No ano passado, foram realizadas 7.827 cirurgias eletivas na cidade, mas a demanda aumentou consideravelmente, já que muitas pessoas perderam o emprego, não conseguiram mais pagar planos de saúde e agora recorrem ao sistema público. A secretaria não soube informar qual o número de procedimentos realizados por mês em Caxias.
Mutirões ou a realização de procedimentos cirúrgicos mais simples, e que, portanto, não precisam de internação, poderiam ser agendados à noite ou aos finais de semana para reduzir a demanda, mas mais uma vez, o limitador seria a questão financeira.
Enquanto, isso a longa espera por uma cirurgia ou consulta com especialista que encaminhe para esses procedimentos aumenta a angústia de quem tem dor. E se descobrir uma doença no começo significa vantagem para conseguir o tratamento certo, pacientes que dependem do SUS, como a Enimari Brito de Castro, 46 anos, Patrícia Cappelletti Lopes Cordova, 25, Alexandre Griz, 74, e Terezinha Gramms Hoffmann, 59, que tiveram suas histórias contadas ontem em reportagem publicada pelo Pioneiro, saem em desvantagem porque demoram a ter acesso ao diagnóstico e quando o têm, penam na longa fila de espera pelo cirurgião.
Compartilhamento regional
De acordo com a secretaria, não há dados para comparar se houve um crescimento na demanda por cirurgias ao longo dos anos _ ao contrário da situação das consultas com especialistas, cuja procura vem aumentando. A secretária de Saúde, Deysi Piovesan, porém, ameniza a situação alegando que a lista de espera é por cirurgias não urgentes. E acrescenta que não há alternativas a curto prazo para resolver a situação.
— De imediato, não há medidas a serem tomadas porque temos uma restrição no número de leitos cirúrgicos: para toda a região, o SUS pode usar apenas 34% dos leitos. Por outro lado, pelo menos 41% da população precisaria de atendimento pelo sistema público. O problema é essa desproporção. Embora somos referência para a região, não temos sequer número de leitos suficientes para a população da cidade (Caxias têm 652 leitos pelo SUS). O segundo ponto, e mais importante, é o teto financeiro. O município recebe dinheiro para fazer um determinado número de cirurgias, mas fazemos todas as que estão na lista de espera, necessitando de suplementação extra também para o custeio de anestesistas e demais despesas, conforme o convênio — justifica.
A redução da fila de espera, segundo Deysi, passa também por rediscutir o compartilhamento regional e as referências para atender as necessidades de Caxias do Sul.
— Precisamos ter melhorias e ampliar o acesso da população às cirurgias. Temos debatido o assunto e, no dia 25, inclusive, temos uma reunião com o governo do Estado. Como somos referência regional, os municípios nos cobram para que Caxias faça mais cirurgias, há essa discussão e essa cobrança. Eles querem discutir o fato de sermos referência, mas eu defendo e quero debater as necessidades da população de Caxias e, para isso, é preciso rediscutir o compartilhamento regional (uma espécie de divisão dos gastos entre os demais municípios que utilizam a estrutura de saúde da cidade).