Caxias já teve tradição nos carnavais de clubes. Viu o Carnaval de rua crescer com as escolas de samba e os desfiles na Rua Sinimbu. Agora, vive um novo momento, com a explosão dos blocos. O da Velha, por exemplo, inaugurou essa nova fase carnavalesca em 2011. Os pouco mais de 200 foliões da primeira edição viraram 40 mil no ano passado.
A iniciativa encorajou outros grupos e hoje são pelo menos sete blocos que dão uma nova cara à folia de Caxias. Quem dará a largada da festa serão moradores de rua, que organizaram um grupo para cair na folia na tarde desta sexta no centro de Caxias, com ajuda do Centro Pop Rua, órgão ligado à prefeitura.
— Acompanho desde 2014 e é interessante ver a evolução. O pessoal vai comprando a ideia. Acho que o Carnaval ganhou mais força com os blocos — opina a designer de moda Débora Bregolin, que será coroada Ovelheza 2018 do Bloco da Ovelha, no sábado.
O Bloco da Ovelha, aliás, já deu uma amostra do que vem aí com um ensaio aberto no último domingo, na Praça das Feiras. Bateria e coreógrafos irão transformar a Rua Tronca em Marquês de Sapucaí no próximo sábado. Pré-carnaval seria algo impensável anos atrás. Improvável também seria continuar a folia após a Quarta-feira de Cinzas. Mas o Carnaval será prolongado na cidade. A festa terminará no dia 18, com o MaraCaxias, que promete transformar Caxias em um pedacinho do Nordeste, com o maracatu mais uma vez circulando pelas ruas da cidade — mais um elemento até então estranho ao Carnaval caxiense.
As escolas de samba, que não desfilam pelo segundo ano consecutivo em razão da falta de recursos, também deram um jeito de não deixar a folia morrer. Filhos de Jardel e Incríveis do Ritmo promovem, nos dias 17 e 18, respectivamente, festas em suas comunidades, na rua. Em meio a polêmicas sobre o corte de verbas do poder público aos desfiles, os próprios carnavalescos envolvidos na organização dos últimos eventos exaltam a importância de manter a celebração nas ruas.
— O que importa é manter a existência do Carnaval em Caxias. Embora seja um padrão diferente, de alguma forma as pessoas estão festejando e fazendo as suas manifestações culturais. Fazer com que as coisas aconteçam é o mais importante. Não importa quem está à frente, importa que tem de ser aberto ao público — destaca Elvino Santos, diretor do último Carnaval de rua de Caxias, ocorrido em 2016.
Para os envolvidos na organização dos blocos de rua, não há dúvidas: o ano é de consolidação.
— Começou como uma festa de amigos que não podiam viajar nessa época. Hoje, as pessoas viajam para cá para participar. É um ano para a consolidação do Carnaval. Estão surgindo manifestações de outros blocos e o calendário já está se fixando. Precisamos fortalecer essa diversidade — comenta Germano Weirich, um dos organizadores do Bloco da Velha.
O novo ciclo
Os formatos de festa variam em cada região do país. Porém, talvez o mais emblemático da cultura brasileira seja os desfiles de escolas de samba, que ganharam notoriedade principalmente pelos grandiosos eventos de São Paulo e do Rio de Janeiro. Porém, mesmo nessas cidades, os blocos de rua têm surgido como uma forte tendência nos últimos anos.
— Estamos assistindo um retorno do Carnaval de rua em todo o Brasil. Inclusive, e sobretudo, no Rio de Janeiro. Então, me parece um movimento maior, nacional, que em algum momento, inevitavelmente, acabaria repercutindo em Caxias — afirma o antropólogo Caetano Sordi.
Apesar de o público predominante ser de classe média, Sordi afirma que a celebração também resguarda aspectos históricos:
— O que tem sido dito como fator para esse ressurgimento do Carnaval de rua em todo Brasil é um certo esgotamento da ritualização do Carnaval de escolas e dos desfiles. Portanto, a partir disso, temos o resgate de uma tradição mais antiga do Carnaval brasileiro, que é a folia na rua.
Idealizador do Sucata Sonora, projeto que reaproveita materiais recicláveis para criação de instrumentos musicais artesanais, Waltenisson Luiz Santos de Jesus, o Tonico de Ogun, tem uma perspectiva diferente sobre o Carnaval em Caxias. Quando teve o primeiro contato com a celebração na cidade, em 2016, os blocos de rua já existiam, embora ainda fossem vistos como novidade.
Apesar de não ter vivenciado a época em que os festejos eram promovidos quase que exclusivamente pelas escolas de samba, ele considera um triunfo a celebração ter se expandido a ponto de tomar as ruas da cidade:
— É o resgate de uma influência cultural que é nossa, que é Brasil. Somente ouço relatos de que isso não existia (em Caxias) e é até um pouco estranho pensar nisso. Mas hoje é bonito de ver e só tende a crescer.
Por outro lado, os participantes de blocos lamentam a marginalização que o novo cenário acaba causando ao envolvimento dos núcleos periféricos.
— A gente está excluindo cada vez mais os bairros. É vergonhoso tirar as escolas de samba do Centro. Algumas pessoas acreditam que Carnaval é só um segmento (samba) ou até o fato de se reunir e beber. Mas há um conceito muito antigo em ser a expressão dos povos oprimidos. Conseguimos conquistar bastante coisa nos últimos anos, mas precisamos respeitar as escolas de samba — comenta o integrante do Baque dos Bugres, Bruno Ortiz Chilanti.
O posicionamento é reforçado por Vanessa Carraro, instrutora de dança e coordenadora do projeto De Lá Pra Cá, que também integra o Maracaxias.
— Caxias está se abrindo para novas experiências culturais, mas sinto falta das escolas de samba e dessa integração com as comunidades. Essas atividades nascem nos núcleos comunitários, por isso seria importante fortalecermos essa aproximação comunidade-Centro. Talvez expandirmos para os bairros, afinal, essa festa faz parte da vida de pessoas das periferias.
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