Nunca tínhamos nos visto e o primeiro contato foi com um abraço. Longo. Por entre aqueles braços, que fizeram questão de dar a volta quase completa em mim, senti a pureza daquela senhora de 64 anos, uma das 65 moradoras do Lar da Velhice São Francisco de Assis. Por 1h30min, Terezinha Martins da Cunha desviou o olhar poucas vezes do meu, repetiu histórias, lembrou de momentos que estavam guardados no fundo da memória e transpareceu, com poucos sorrisos, a alegria que tinha de estar viva.
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Órfã e longe dos cinco irmãos que ainda vivem, a catarinense de Santa Rosa do Sul não esconde o sotaque. Em frases cantadinhas, aponta uma mágoa por estar longe dos filhos, Marcelo e Elisana. Eles sabem que ela está ali, mas mantêm pouco contato. Terezinha tentou, inclusive, escrever cartas para a primogênita, mas, sem retorno, resolveu gastar papel e caneta com mensagens para o apresentador Luciano Huck.
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A única moradora do quarto cinco do asilo acorda e dorme cedo, logo depois de assistir Carrossel. Faz questão de se maquiar e só tira os brincos e os anéis que carrega, um em cada mão, ao deitar. Sempre espera ansiosa pelas aulas de artes, já que gosta de atividades manuais desde que aprendeu a bordar, aos 13 anos, antes de ir para um convento no Rio de Janeiro e perceber, anos depois, que não tinha vocação religiosa. Foi dona de casa, mas se afastou de tudo depois de ser castigada com uma depressão, monstro que ainda a persegue.
Terezinha não faz planos de vida. Espera poder estudar, ser assistente social e trabalhar no Lar, sua moradia desde outubro de 2012. Como uma boa ariana, nascida no início de abril, diz estar preparada para o que vier.
* Carolina Klóss é colunista do caderno Comportamento
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