Está se fechando o cerco contra o som alto que perturba moradores, veranistas e comerciantes em Arroio do Sal. Desde dezembro, membros da Associação Arena Automotiva e Brigada Militar (BM) deram as mãos para denunciar e autuar quem desrespeita o sossego na cidade do Litoral Norte muito frequentada por caxienses e moradores de outras cidades da Serra. Até agora, 20 carros já foram apreendidos e motoristas multados pela prática de perturbação ao sossego. Quase metade dos veículos tem placas de Caxias do Sul.
Faz tempo que dormir ao som do barulho do mar é privilégio de poucos no litoral gaúcho. Em Arroio do Sal, dezenas de moradores imploraram por sossego. Chegaram a marcar uma manifestação para sexta-feira à noite, que só não saiu em virtude do mau tempo.
- Antes, a lei exigia que medíssemos o índice do som. Agora é flagrante. Recolhemos o carro na hora e o proprietário responde a processo - avisa o tenente da Brigada Militar Gerson Sadovick.
A insistência em circular com som alto pelas ruas de Arroio do Sal custa caro. Além de ter o carro recolhido por pelo menos uma semana, o condutor desembolsa cerca de R$ 2 mil, dependendo do valor fixado pelo juiz. O veículo só é devolvido depois de ter a fiança paga e o custo do depósito do guincho, onde o automóvel fica retido. Placas que informam a proibição foram espalhadas pela praia. Para a BM entrar em ação, basta flagrar o condutor com som alto.
- As pessoas chegam aqui pensando que na praia pode tudo. Não é bem assim. Quem está em férias quer sossego, e quem mora aqui precisa trabalhar - acrescenta o prefeito de Arroio do Sal, Luciano Pinto da Silva (PDT).
Ainda que a medida já tenha mostrado efeito, os moradores estão receosos. Afinal, o problema afugenta turistas e atrapalha o sono há pelo menos cinco anos, quando o barulho se intensificou. O empresário César Sirto dos Santos, proprietário de dois hotéis, um deles na quadra do mar e próximo da praça central, sente no bolso o incômodo.
- Meus clientes do Réveillon são sempre novos. Quem vem em um ano, não retorna no próximo. Quando me perguntam se tem barulho, já aviso no telefone: tem mesmo. Neste ano, foram cinco dias sem dormir - lamenta dos Santos.
No espaço correto, som é liberado
Uma das saídas encontradas por jovens que desejam escutar som alto sem não incomodar os veranistas (e nem ser multado) foi encontrar um espaço próprio para a prática. A Associação Arena Automotiva de Arroio do Sal alugou um condomínio fechado, ainda sem moradores, onde se encontra aos fins de semana para ouvir som no volume que desejam. Não há casas no entorno, garante o vice-presidente da associação e proprietário de um Fiat Uno munido de caixas de som trio, Alessandro dos Santos, 25 anos. Ele reconhece que a música nem sempre agrada aos moradores, e que com sede própria e distante do Centro é mais fácil se divertir - sem atrapalhar quem deseja descansar.
- Estamos fazendo um teste para ver se dá certo. Nós orientamos os motoristas a não ouvir som alto no Centro. Depois que ganhamos provisoriamente a autorização para usar espaço, firmamos acordo com a Brigada Militar e nossa tolerância é zero. A BM pode atender a ocorrências mais graves em vez de ter que ver som alto - incentiva dos Santos.
O espaço é conhecido como Loteamento Pinus Park e fica no Km 70 da Estrada do Mar, próximo ao acesso do Balneário Atlântico. A entrada custa R$ 10 e mais um quilo de alimento não-perecível.
O que diz a lei
São três os possíveis enquadramentos legais do som alto no carro:
Poluição sonora
:: Previsão legal: Lei 6.938/81 e resolução 001/1990 do Conselho Nacional do Meio Ambiente.
:: O que estabelece: o limite de ruído em áreas habitadas, conforme a NBR 10.151, é de 40 a 70 decibéis durante o dia e de 35 a 60 decibéis à noite.
:: Punição: multa ou até quatro anos de prisão.
Infração de trânsito
:: Previsão legal: artigo 228 do Código de Trânsito Brasileiro e resolução 204/2006 do Conselho Nacional de Trânsito.
:: O que estabelece: é permitido, em veículos de qualquer espécie, o uso de equipamento que produza pressão sonora não superior a 80 decibéis, medido a sete metros de distância do veículo. Vale para carros em circulação ou parados em via pública.
:: Punição: cinco pontos na Carteira Nacional de Habilitação, multa e retenção do veículo.
Perturbação do sossego
:: Previsão legal: artigo 42 da Lei de Contravenções Penais 3.688/41.
:: O que estabelece: a utilização, em área habitada, de aparelhagem de som acima dos limites fixados, independentemente do horário, está sujeita à lavratura de Termo Circunstanciado de Ocorrência.
:: Punição: prisão simples de 15 dias a três meses ou multa.
É preciso formalizar a ocorrência
Caxias também tem dezenas de reclamações todos os meses. O capitão da 2ª Cia da BM Marcelo Constante ressalta que muita gente chama os policiais para coibir a baderna, mas não registra ocorrência, o que prejudica a caracterização de perturbação do sossego.
- Fizemos muitas operações e quando chegamos no local os envolvidos já abaixaram o som. Estar parado numa via não é crime. Para a combater a perturbação do sossego a população precisa colaborar e denunciar no papel - reitera Constante.
Portanto, não basta apenas ligar para a BM e pedir intervenção para a baderna cessar. Para garantir a responsabilização, a vítima precisa formalizar queixa em ocorrência policial e mencionar que pretende representar judicialmente contra o autor identificado pela polícia. Sem confirmar esse detalhe, o caso é encaminhado para a Justiça sem vítima. O juiz pode entender que não houve danos por falta de interessados e absolver o folgado.