A polêmica sobre o asfaltamento da Rua Plácido de Castro, ao lado do prédio da antiga Metalúrgica Abramo Eberle SA (Maesa), já chegou à Justiça. Na tarde desta terça-feira, um dia após o prefeito Alceu Barbosa Velho (PDT) anunciar que asfaltará a via para o desfile do carnaval, foi protocolada na 2ª Vara Cível uma ação popular com pedido de liminar contra a obra. A alegação é que o asfalto afeta o entorno do prédio em processo de tombamento e acaba com a pavimentação de uma rua histórica.
A ação foi protocolada pelo servidor público federal Ricardo Fabris de Abreu, na tarde de ontem. De acordo com ele, há duas questões previstas na Lei Municipal 7.495, de 2012, que foram desconsideradas: a necessidade de preservação do entorno de prédios tombados ou em processo de tombamento histórico e a proibição de alterações em obras com mais de 50 anos sem análise prévia do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Cultural (Compahc).
- Tu não podes modificar qualquer obra pública com mais de 50 anos, muito menos essa que está no entorno de algo que vai ser tombado. Até poderia, mas teria de passar pelo Compahc. Isso não foi feito - afirma Abreu.
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O arquiteto Roberto Fillipini, coordenador do projeto Caminhos da Memória, lembra que o Compahc é uma instância consultiva, mas que a análise da questão depende de bom senso, uma vez que a rua faz parte de uma composição de elementos históricos. Também deve ser considerado o impacto na vizinhança, por se tratar de uma área residencial, e a interferência no clima, já que o asfalto eleva a temperatura.
Membro do Compahc, Valdemor Antônio Trentin é a favor do asfaltamento. O representante do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) de Caxias do Sul acredita que o asfaltamento não tem impacto sobre a preservação do patrimônio. Pelo contrário, é algo benéfico à região.
- Não vai interferir no contexto, porque vai dar utilidade ao lugar. Na minha opinião, o que o prefeito propõe é acertado, porque já vai começar a direcionar um novo uso para aquela área - defende Trentin.
Representante no Compahc do Departamento de Memória e Patrimônio Cultural da Secretaria Municipal de Cultura, Liliana Alberti Henrichs é a favor da obra, mas lembra que em Caxias do Sul a pavimentação já foi preservada em outros trechos. Isso aconteceu durante a reformulação da Praça Dante Aligieri, por exemplo, quando as pedras portuguesas foram mapeadas e recolocadas no fim da obra.
Ainda pela manhã, o grupo Faço Parte Maesa se manifestou nas redes sociais contra o asfaltamento e anunciou uma reunião para debater quais providências seriam tomadas.
- O Faço Parte é a favor de que todo o conjunto seja preservado e obviamente o asfalto vai descaracterizá-lo. A gente espera que a prefeitura tenha uma postura mais participativa sobre o assunto - pede a integrante do grupo, Vera Mari Damian.
- É desnecessário porque o pavimento é muito bom, mas independentemente disso nós sempre defendemos toda aquela área como patrimônio histórico. Esse asfaltamento descaracteriza a região. É uma perda, é lamentável - diz o presidente da Associação dos Engenheiros, Arquitetos, Agrônomos, Químicos e Geólogos de Caxias do Sul (Seaaq), Orlando Michelli.
O que diz a lei
:: O assunto é regido pela lei municipal número 7.495 de 2012, que dispõe sobre a proteção ao patrimônio cultural do município.
:: O artigo 5º define que nenhum prédio, obra, praça, monumento ou cemitério com mais de 50 anos pode ser demolido sem parecer do Compahc. Porém, não há consenso quanto ao enquadramento da pavimentação neste quesito.
:: Já o artigo 22º proíbe que sejam realizadas obras no entorno de prédio tombado sem autorização. No entanto, o trecho faz referência apenas a obras que impeçam ou reduzam a visibilidade do bem tombado, o que não ocorreria com o asfaltamento.
Sem asfalto, sem carnaval
A decisão pelo asfaltamento da rua Plácido de Castro foi divulgada na tarde de segunda-feira, junto com o anúncio da transferência do desfile de Carnaval para o trecho. Para o presidente da Associação das Entidades Recreativas, Esportivas, Culturais e Carnavalescas (Assencar), Elvino Santos, não seria possível realizar o desfile em uma rua pavimentada com paralelepípedos.
A irregularidade das pedras prejudica a evolução das escolas, o samba das passistas e a coreografia das alas, alega Santos. Além disso, acredita que diversos segmentos ligados à cultura se beneficiam com o asfaltamento da rua.
- Caxias precisa de uma via que contemple a cultura popular e de rua. Eu acho que vai somar positivamente. Pensei também no contexto histórico, mas ainda defendo o asfaltamento - afirma Santos, lembrando que outros eventos poderiam ser realizados no local.
Polêmica no Carnaval
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