Quando se fala do Santuário de Caravaggio uma das primeiras palavras que vem a mente é fé. Essa história remonta a 1879, quando Antônio Franceschet e Pasqual Pasa construíram um capitel de 12 metros quadrados, com alpendre na entrada, localizado em frente ao atual cemitério de Caravaggio. De lá para cá, diversos relatos de milagres justificam a devoção à Nossa Senhora de Caravaggio, o que acabou por promover a realização de romarias anuais, mobilizando milhares de fiéis.
No entanto, nas últimas semanas têm se intensificado a disputa pelo espaço no entorno do santuário. Essa atitude expõe uma palavra, que nem sempre combina com a religiosidade, o comércio. Ambulantes e indígenas têm lutado pelo direito e espaço de comercialização. Para evitar um conflito violento e o consequente esvaziamento de fiéis, que em grande número visitam Caravaggio nos finais de semana e feriados, a prefeitura de Farroupilha, em parceria com a administração do Santuário agiram para estabelecer limites.
Os ambulantes sugerem a criação de camelódromo no local para solucionar o impasse. A prefeitura de Farroupilha não descarta a ideia, mas pede, inicialmente, a formalização de uma proposta, que seria estudada posteriormente (veja mais abaixo). Por enquanto, apenas os indígenas estão autorizados a vender seu artesanato na esplanada, em local determinado por acordo com Ministério Público (MP) e prefeitura. Desde o último final de semana (dias 1º e 2 de julho), não é mais permitido o comércio ambulante no pátio e no estacionamento.
No último domingo (2) à tarde, enquanto a reportagem do Pioneiro esteve no local, uma viatura da Brigada Militar (BM) patrulhava o local. Não foi preciso intervenção porque tanto os indígenas quanto os ambulantes estavam respeitando os limites. Contudo, conforme relato de dois seguranças responsáveis pelo espaço, na manhã de sábado (1º) a BM precisou intervir para terminar com uma discussão entre ambulantes e indígenas.
Na reportagem publicada pelo Pioneiro, na última sexta-feira (30), a prefeitura prometia que fiscalizaria o local. Tanto ambulantes quanto indígenas, ouvidos no domingo, confirmaram que um fiscal esteve no local.
— Pediram para a gente se tínhamos alvará para vender nossos produtos e para ver se todos estavam nos lugares determinados — conta Fabiane Conrado, vendedora ambulante, que diz trabalhar com a venda de produtos no santuário há 15 anos.
Indígenas têm espaço delimitado pelo Ministério Público
Os indígenas estão com direito assegurado de venda dos produtos em um local determinado e delimitado, dentro de um dos estacionamentos, mesmo sendo área privada, por causa de um acordo entre MP e prefeitura. Quem controla os indígenas que podem ocupar esse espaço são os caciques das aldeias kaingangs de Farroupilha e Bento Gonçalves.
Na tarde de domingo (2), cerca de 10 indígenas estavam trabalhando na venda de artesanatos e balões infláveis. Eles explicaram que, em outras épocas do ano, esse número chega a dobrar, o que segundo eles, justifica o tamanho da área delimitada.
— Nós vamos respeitar a orientação do padre, que nos permite vender dentro do santuário. Mas, para não criar problema, vamos ficar só neste espaço determinado — explica Daniel Ribeiro, um dos indígenas que estava trabalhando no domingo a tarde, mostrando o documento do MP, que determina a área específica para que eles coloquem suas bancas.
Prefeitura diz que sugestão pode ser analisada
Na tarde de domingo (2), cerca de cinco vendedores ambulantes estavam em um único ponto, na via pública, do lado de fora da área privativa do santuário. Eles estavam a cerca de 10 metros de onde inicia o espaço dos indígenas e cerca de 25 metros do portão de acesso principal.
Durante a entrevista, disseram estar de acordo com um espaço específico para eles, mas desde que pudessem também colocar bancas para exibir o que vendem. No caso, objetos religiosos e balões infláveis.
— A gente também queria poder colocar umas bancas, como os indígenas fazem, para mostrar nossos produtos, porque temos de vender segurando os produtos nas mãos — diz o ambulante Ozório Venâncio dos Santos.
A sugestão apontada pela ambulante Fabiane Conrado é a criação, por parte de uma parceria entre a prefeitura e o santuário, do que ela chama de Camelódromo de Caravaggio.
— Sabe que na maioria dos santuários que existem tem um lugar para a venda de produtos, um camelô do santuário? Então, se a gente tivesse um lugar como esse, poderíamos expandir um pouco mais, e não vender apenas balões ou produtos religiosos. A gente poderia até vender brinquedos, por exemplo.
A secretária municipal de Turismo, Regina Ducati, destaca que a sugestão pode ser analisada. Porém, é necessário que os ambulantes formalizem essa proposta.
— A prefeitura sempre estará disposta a dialogar com todas as partes para encontrar a melhor solução para todos. Neste caso, pedimos a formalização deste pedido, da mesma forma que isso deve ser encaminhado também ao Santuário para manifestação — comenta ela.
O padre Ricardo Fontana, reitor e pároco do Santuário de Caravaggio, destaca que na área do complexo não será permitida a colocação de um espaço para a comercialização. Fontana destaca que o Santuário teve as terras doadas pela comunidade com o objetivo de acolher os fiéis e é com este fim que ele vai seguir. Caso haja a intenção de disponibilizar um espaço para camelódromo, o terreno deve ser disposto pela prefeitura de Farroupilha.
— O santuário não vai ser contrário a um camelódromo, se comercializados produtos regularizados, com procedência de origem, enfim todas as normas de fiscalização. Porém, o colegiado definiu em reunião que não deve ser dentro do espaço do Santuário — explica Fontana.
O colegiado, segundo o reitor, é composto por integrantes da comunidade de Caravaggio, sacerdotes, Conselho para Assuntos Econômicos, comando da Brigada Militar e Secretaria de Turismo. O grupo se reúne com frequência para tomar decisões sobre o complexo.
Comércio no entorno
Atualmente, há uma loja oficial no santuário, que comercializa livros e objetos religiosos, além de artesanato. O espaço funciona de segunda a sexta-feira, das 8h30min às 12h e das 13h45min às 17h. E, aos sábados, domingos e feriados, das 8h30min às 12h35min e das 13h45min às 16h45min.
No lado de fora dessa área, há um tradicional estabelecimento, o Bem Te Vi, localizado na avenida principal, que é hotel e restaurante e também vende artigos religiosos e artesanato, cujo prédio fica a poucos metros de onde estão os ambulantes e os indígenas.