Com cerca de 140 integrantes, a Associação Caxiense de Apicultores (Ascap) permite analisar um extrato importante da produção do mel no município mais populoso da Serra. Por ano, a entidade processa 10 toneladas do produto, segundo o presidente David Vicenço. Isso inclui, de acordo com ele, tanto o processamento para associados da região quanto para apicultores que fazem uso da estrutura pagando uma taxa.
Não há dados específicos de quantos apicultores, cujo o dia é lembrado no sábado (22), há em Caxias do Sul – muitos deles criam abelhas, mas exercem outras atividades – e nem de qual é a produção total na cidade, mas Vicenço estima que cerca de 50 toneladas de mel saiam de propriedades da Região Metropolitana da Serra Gaúcha por ano.
— É um mercado bastante competitivo, porque tem aquele pequeno produtor que faz o processamento em casa e vai e vende em potes plásticos ou em vidro de café sem rótulo. Na associação, cumprimos uma série de regras, tem fiscalização de uma veterinária e análise trimestral — explica.
Para o processamento, as melgueiras são levadas para a associação onde é feita a centrifugação (para extração dos favos), a decantação (para expelir as impurezas), o envasamento e a rotulação. O apicultor Antônio Viapiana, da área técnica da Ascap, destaca que a diversidade da flora da Serra abastece as abelhas com uma matéria-prima única, que impacta positivamente no produto que chega ao consumidor.
— O mel da nossa região da Serra é considerado um dos melhores méis do mundo pela diversidade botânica e de florada, que nós temos aqui. A mistura dessa florada toda, que a abelha acaba fazendo, faz com que o nosso mel seja muito saboroso em termos de análises químicas, físicas, biológicas, também é muito rico. Ele é tudo de bom, pela diversidade — avalia Viapiana.
No entanto, o apicultor lamenta que o consumo de mel no Brasil ainda seja baixo. Um estudo Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste apontou que o consumo per capita no país está entre os menores do mundo: em 2017, foi de 70 gramas, por pessoa, por ano, enquanto que em países como a Alemanha é superior a 1 quilo.
Histórias de família e afeto
A imagem de um apicultor pronto para colher o mel, diante das abelhas, passa uma sensação de pavor. Os equipamentos de proteção individual (EPIs) necessários têm o objetivo de garantir a segurança às pessoas, já que esses insetos são capazes de dar ferroadas, como forma de protegerem-se, a fim de evitar a invasão do seu habitat. Por isso, talvez você se espante ao saber que existe uma relação até de certa forma afetiva entre quem as cria e as abelhas.
É o caso de Enio Otavio Brambatti, 64 anos, morador de Caxias do Sul, que mantém colmeias no Distrito de Vila Seca há cerca de 20 anos. Mas a história dele com a atividade começa bem antes, ainda na infância, quando acompanhava o avô de longe na colheita do mel produzido então pelas chamadas abelhas europeias.
— Com cinco anos, acompanhava meu avô, que tinha em torno de uns 10 enxames de abelha europeia, bastante dócil. Ele fazia um pouco de fumaça com os panos, ia lá e tirava o mel e, as abelhas, não atacavam. Tiravam alguns favos de mel por caixa, era uma produção bem rústica. Eu sempre gostei do mel, de passar no pão como se fosse passar a chimia, e também se usava muito o mel no inverno para fazer chás para combater a gripe e os resfriados.
Em 1964, o avô dele faleceu e o pai não quis dar sequência à produção, porque costumava ser “perseguido” pelas abelhas, conta Brambatti. O apicultor lembra ainda que, na segunda metade da década de 1960, começaram a chegar à Serra as abelhas africanizadas, mais agressivas, que cruzaram com as europeias e deram origem ao tipo que existe hoje na região, as chamadas africanizadas. Com isso, elas passaram a ter uma agressividade intermediária, mas ainda assim existe uma precaução: as 25 colmeias da propriedade de Brambatti em Vila Seca ficam a cerca de 800 metros de casa, porque elas rapidamente reagem a sons, por exemplo. Mesmo com essa característica assustadora para alguns, o apicultor conta que mantém um sentimento de cuidado com esses animais.
— Eu sempre defendi a causa das abelhas, tanto é que quando eu faço a colheita do mel, sempre tem uma ou outra que se esconde no meio do caixilho, procuro sempre libertar elas, nunca esmagar. Pego duas colherinhas e solto, porque se tu pega com a luva, ela pica a luva mesmo sendo de couro, e o ferrão gruda no couro, mas faz com que a abelha morra — revela Brambatti.
No quinhão tinha uma colmeia
O sentimento é parecido com o do representante comercial Luciano Cambruzzi, 47 anos, que também é apicultor. A proximidade dele com o mel e as abelhas começa ainda na infância, com o avô. A apicultura permaneceu sendo desenvolvida na propriedade no Rio Burati, em Farroupilha, pelo pai de Cambruzzi, mas foi interrompida quando ele morreu, em 2012. Foi após a divisão de bens da família que a atividade foi retomada.
— A gente fez uma partilha entre os irmãos e, no meu quinhão, tinha uma colmeia. Estava abandonado e quando fui lá para limpar, achei aquela colmeia e acabei então renovando ela e foi ali que aflorou a vontade de ter mais colmeias — conta o proprietário do Apiário Ruy Cambruzzi, nome dado em homenagem ao pai.
Hoje, são 35 colmeias instaladas no local e, assim como no caso de Brambatti, boa parte é para consumo próprio, enquanto o restante é vendido.
— O apicultor tem que ser uma pessoa muito respeitada pela coragem que tem, porque as abelhas são os insetos que têm a sua defesa. Normalmente, tu vai invadir o habitat delas, elas vão defender a colmeia. Mas a gente aprende muito com a abelha — comenta Cambruzzi, ao destacar a importância desses animais para a polinização, que permite a produtividade e perpetuação das plantas.
Saiba mais
:: O Dia do Apicultor foi instituído para homenagear o profissional que maneja abelhas. É celebrado em 22 de maio porque é no mesmo dia de Santa Rita de Cássia, conhecida por ser padroeira dos apicultores.
:: Muitos acreditam que a apicultura teve início em 2.400 a.C., praticada pelos antigos egípcios. Com o avanço de muitos povos em territórios ainda não conquistados, o mel passou a se disseminar pelo mundo, assim como o manejo de apiários. Hoje, as abelhas são criadas preferencialmente em caixas de madeira removíveis, nas quais as abelhas operárias constroem os favos, onde depositam o mel.
Associação Caxiense de Apicultores (Ascap) fica na Av. Per. Bruno Segalla, 9223 - Pio X, Caxias do Sul. Telefone: 3223-8780