Conhecida e reconhecida por sua vocação industrial, Caxias do Sul é também destaque no agronegócio, porém, com um perfil diferente. O nosso agro não é o mesmo das lavouras de soja e dos grandes rebanhos de gado, por exemplo. Mas tem características que orgulham — e muito — os produtores locais. Ser o maior produtor de hortigranjeiros do Estado é uma delas.
E não se trata apenas de quantidade, mas de variedade. São pelo menos 28 diferentes culturas cultivadas em solo caxiense, entre elas, claro, a uva, com uma produção anual de 80 mil toneladas. E embora a fruta seja símbolo da cidade, quem lidera atualmente o ranking de produção é a maçã, com 130 mil toneladas por ano. O tomate também é destaque, com 40 mil toneladas anuais.
— Tem anos como seca, chuva, geada, como esse ano, e a produção consegue se manter por causa da tecnologia. No caso do horti, por exemplo, se produz muito em estufa — destaca o secretário municipal da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Smapa), Valmir Susin.
A produção caxiense de hortaliças abastece, conforme a administração municipal, cerca de 80% do Rio Grande do Sul. Caxias é a principal abastecedora da Ceasa Serra e uma das principais da Ceasa Porto Alegre. Além disso, fornece para vários municípios do país — Campinas, em São Paulo, e Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, são apenas alguns deles.
— Tem produtor daqui que vende só para fora — conta Susin.
Com fatia menor, mas não menos importante, a pecuária também se destaca em Caxias. O rebanho é estimado em torno de 45 mil cabeças de gado, número, conforme o secretário, maior que o de muitos municípios da fronteira do Estado.
— Muita gente nem acredita que tem tanto gado aqui — brinca. A cidade ainda tem criação de bubalinos, galinhas, codornas, suínos, ovinos, equinos e caprinos.
Os dados comprovam que a cidade tem um setor bem estruturado, opina o coordenador da diretoria de Agronegócios da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias do Sul, Evandro Lovatel. Por isso, ele entende que precisa ter o mesmo respaldo que outros segmentos.
— O agronegócio é forte, funciona. A origem de Caxias foi o agronegócio, não se perdeu esse vínculo. A indústria se desenvolveu para suprir necessidade do agronegócio, das vinícolas — recorda.
Embora já bem desenvolvido, Lovatel acredita que o agro pode avançar ainda mais em Caxias com políticas públicas voltadas ao setor. Manutenção das estradas para escoamento da produção e bom sinal de telefone e internet para os agricultores são questões básicas para o crescimento.
— Quando se tributa algo que não era tributado, abre espaço para outros mercados. Por questão de centavos, tu deixa de ser competitivo —acrescenta.
E complementa:
— Muito já se fez, mas pode ser feito mais.
Uva é tradição da família Bassanesi
Embora não lidere o volume de produção em Caxias do Sul, a uva é e sempre será o símbolo da cidade. Foi nos parreirais que os colonos italianos apostaram quando chegaram na Pérola das Colônias. Foi a aposta também de Francisco Bassanesi, há mais de 70 anos, em São Gotardo de Ana Rech.
Hoje os filhos João, José, Ivo e Pedro tomam conta dos 12 hectares de parreiras. A família planta somente a variedade bordô, indicada para a elaboração de sucos e vinhos.
— É mais prática para trabalhar, para o manejo — diz José.
A produção anual é vendida para as vinícolas Mioranza e Venz.
— Esse ano teve redução na safra por causa da seca, foi cerca de 20 toneladas por hectare. Mas a qualidade estava ótima. E conseguimos vender tudo e até receber adiantado — comemora.
Desempenho da Ceasa
A Ceasa Serra deve fechar o ano com números similares ao de 2019, apesar da pandemia e dos fatores climáticos, como seca seguida de chuva excessiva e geada fora de época. Até agosto de 2020, foram comercializados 25 milhões de quilos de produtos, o equivalente a R$ 66,3 milhões. Em 2019, foram 39 milhões de quilos, o que representou R$ 103 milhões. Os últimos meses do ano costumam registrar o maior volume de vendas por causa da safra de frutas.
— É muito positivo diante do ano — diz Valmir Susin, secretário municipal de Agricultura.
No três Ponto de Safra em Caxias, até agosto foram vendidas 2,7 milhões de sacolas de produtos, o equivalente a R$ 5,5 milhões. Em 2019, foram 4 milhões de sacolas, o que representou R$ 8 milhões.
Formando o futuro do agro na Serra
Se muito já se fez até agora, é preciso garantir que esse trabalho tenha sequência — para a sobrevivência das propriedades rurais e para manter a cidade abastecida. Por isso, há sete anos foi criada uma instituição voltada para a formação de novos agricultores. Desde então, a Escola Família Agrícola da Serra Gaúcha (Efaserra) já formou mais de 50 jovens.
— Ela surgiu de uma demanda de pais agricultores. Eles perceberam que as escolas regulares não proporcionavam o conhecimento que eles precisavam. Elas não falavam a língua desses jovens — conta o diretor da Efaserra, Israel Matté.
Por dois anos, a escola teve como sede a cidade de Garibaldi. Desde 2015, está localizada em um prédio na Terceira Légua, no interior de Caxias do Sul. Atualmente, são 170 alunos de 25 municípios matriculados no ensino médio e técnico oferecido.
A maioria é filhos de agricultores que aprende a teoria na escola e aplica na propriedade da família — para isso, permanecem uma semana no colégio, em regime de internato, e uma semana em casa. Devido à pandemia, estão tendo aulas remotas, pelas internet.
A última pesquisa realizada com egressos, em 201, mostrou que 80% dos jovens havia permanecido no campo. Antes, quando frequentavam escolas regulares, a maioria concluía apenas o ensino fundamental e abandonava os estudos no médio.
— É garantia de permanência do negócio e de gestão das propriedades. E mesmo se eles não ficarem no campo, terão um curso técnico e podem ser contratados por uma agropecuária, por exemplo — acrescenta Matté.
A escola é mantida por uma associação formada por produtores rurais. Além da Efaserra, há outras três escolas agrícolas no RS: Santa Cruz do Sul (a primeira do Estado), Vale do Sol e Canguçu.
Duas frentes na Randon
Exemplo de que indústria metalmecânica e agronegócio andam juntos é a Randon. O grupo produz soluções para o segmento agrícola, desde o plantio até o transporte, e também coloca a "mão na terra" com a produção de maçã, queijo, vinho, entre outros produtos.
Dentro das Empresas Randon, o portfólio voltado ao agronegócio é bem diversificado e todo ano ganha novidades. O segmento representa de 35% a 40% da receita da empresa.
— O agro sempre foi forte, relevante. A expectativa é que continue bem. Nosso faturamento está associado ao crescimento da safra e esperamos resultados semelhantes a 2019 — diz Sérgio Carvalho, vice presidente executivo e COO das Empresas Randon.
Na RAR, empresa que completa 41 anos, a expectativa de crescimento é de 26% da receita líquida em 2020 (em relação a 2019 e projeção ajustada após início da pandemia). Mesmo com a pandemia, irá investir neste ano R$ 18,5 milhões em ampliação da capacidade produtiva de queijos, renovação de pomares, maquinários e desenvolvimento tecnológico. Além disso, o e-commerce da empresa registrou um aumento de 567% no volume de vendas no período entre março e agosto de 2020 na comparação com o mesmo período de 2019. Nos últimos 12 anos o crescimento da receita líquida anual foi de 8,7% ao ano na Rasip, 18,3% ao ano na RAR e de 11,4% ao ano no consolidado.
Alternativa mais em conta
Fernando Andreatta é um dos exemplos de agricultores caxienses que abastece o país. Sua produção de pêssego, em São Gotardo de Vila Seca, não fica por aqui: tem como destino as Ceasas de Santa Catarina e Paraná.
A dedicação à fruta, aliás, é relativamente recente. Andreatta começou há plantar a oito anos. Depois de trabalhar com uva, resolveu buscar outra cultura que fosse mais prática para o manejo e menos onerosa.
— Foi pela facilidade na colheita e é mais vantajoso financeiramente —explica.
Em nove hectares, planta quatro variedades de pêssego. Todos são de mesa, ou seja, destinados ao consumidor final e não para a indústria. A estimativa para a próxima safra, que começa no final de novembro e segue até janeiro, é colher 150 mil quilos.
Para manter a qualidade da produção, Andreatta busca formação e conhecimento e também auxílio do governo. Há três anos participa do Programa de Máquinas Pesadas da prefeitura de Caxias _ equipamentos são oferecidos para melhorar a infraestrutura das propriedades rurais. O trabalho é subsidiado pelo poder público, com 50% do custo pago pelo município até 20 horas/máquina e os outros 50% pelo produtor rural.
— A gente pega para fazer benfeitorias e sobra recurso para outros investimentos — diz Andreatta.
Perfil
:: Caxias do Sul é o maior produtor de hortigranjeiros do Estado. É o principal abastecedor da Ceasa Serra e um dos principais da Ceasa Porto Alegre.
:: Caxias possui um dos maiores PIBs agrícolas do Rio Grande do Sul.
:: A produção caxiense de hortaliças abastece cerca de 80% do Estado além de várias cidades do país.
:: Entre os destaques da produção estão a maçã, com 130 mil toneladas por ano; uva, com 80 mil toneladas por ano; e tomate com 40 mil toneladas por ano.
:: O rebanho é estimado em torno de 45 mil cabeças de gado.
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