Planejada desde 2018, a viagem de férias do casal Marina Pieruccini Sangali e Bruno Kriger, ambos com 30 anos, para Orlando precisou ser adiada. Com a crise causada pelo coronavírus no mundo, os dois decidiram não embarcar mais no dia 28 de abril, como previsto. Eles ainda não sabem se e quando poderão realizar o desejo de conhecer a Disney e os estúdios da Universal. A companhia aérea oferece créditos para uma futura viagem, porém, até um ano após a compra do bilhete. No caso de Marina e Bruno, venceria em novembro. Mas eles temem que até lá ainda não seja possível viajar.
— Estou ligando para a Copa Airlines faz uma semana. E sempre dá que os canais estão ocupados — reclama Marina, que é fisioterapeuta em Caxias do Sul.
Além do possível prejuízo com as passagens aéreas (que somariam quase R$ 3 mil), o casal teme não conseguir de volta o valor dos ingressos para a Disney. A empresa tem como opções o adiamento das datas dos bilhetes ou o cancelamento com pagamento de multa. Se não conseguirem o reembolso das entradas, perderão 1,8 mil dólares. A expectativa é de que a Disney mude a política — no Japão, os parque foram fechados e só reabrem em abril.
— A gente não tem a oportunidade de viajar com frequência. Essa foi bem planejada, desejada e é difícil de acreditar que não vai sair e que podemos ter prejuízo ainda — lamenta Marina.
Já os valores pagos pelas reservas em hotel e dos ingressos para os estúdios da Universal serão reembolsados. A esperança dos dois é que a companhia aérea aumente o prazo para a utilização dos créditos para que eles possam realizar a mesma viagem no ano que vem, quando imaginam que o cenário não será mais de riscos à saúde.
— Acho que mais no final do ano que vem já vai estar liberado — espera Marina.
Na última sexta-feira (20), os Ministérios Público Federal (MPF) e do Distrito Federal e Territórios, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) do Ministério da Justiça e Segurança Pública e a Associação das Empresas Aéreas (Abear) assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que estabelece regras para remarcação, cancelamento e reembolso de passagens aéreas em razão da pandemia da covid-19.
Conforme o diretor do Procon de Caxias do Sul, Dagoberto Machado dos Santos, o momento atípico requer flexibilização das relações de consumo. No entanto, ele alerta que o cliente não pode ser lesado:
— Todos vão perder, mas o consumidor é a parte mais frágil. Tem de prevalecer o bom senso.
A luta pelo reembolso
Ana Lurdes Conte, 45 anos, estava literalmente de malas prontas quando recebeu, no dia 10, o aviso que o congresso de odontologia do qual participaria em Washington D.C. havia sido cancelado. A notícia chegou dois dias antes do embarque e levou a dentista e professora da FSG a iniciar uma peregrinação em busca de reembolsos. Não conseguiu devolução das reservas do hotel e da Decolar, site onde comprou a passagem aérea, recebeu a informação que pode remarcar o voo até janeiro do ano que vem — o que não resolve a situação, já que o evento não será mais realizado.
— Alguns conhecidos me disseram para ir mesmo assim, mas eu já tinha lido relatos de algumas pessoas que não estavam conseguindo voltar para o Brasil. E eu estaria transitando nas duas regiões de maior contaminação nos Estados Unidos: Nova York e Washington. Seria uma irresponsabilidade — diz.
Além da frustração de perder o maior congresso da área onde atua no mundo e a chance de apresentar sua pesquisa de doutorado, Ana estima um prejuízo de cerca de R$ 14 mil, que inclui, além da hospedagem e do transporte, gastos com a inscrição para o evento, seguro-saúde e internet para o celular.
A dentista pretende acionar o Procon para conseguir, ao menos, o valor das passagens de volta.
O QUE DIZ O ACORDO COM AS COMPANHIAS AÉREAS
> O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi assinado com Latam, Gol, Azul e Passaredo.
> O passageiro que tiver adquirido passagem até a data de assinatura do termo e possuir bilhete de voo operado entre 1º de março e 30 de junho de 2020 poderá remarcar a viagem por uma única vez, sem qualquer custo, respeitada a mesma origem e destino.
> A exceção é para voos operados em code-share e interline (acordo de compartilhamentos de voos com outras companhias), por companhias que possuam parceria de plano de milhagem e voo charter (efetuado por uma empresa que leva a carga ou o passageiro de uma outra companhia que fica fora da sua operação normal).
> A remarcação poderá acontecer para qualquer período dentro do intervalo de validade da passagem, sem a cobrança de taxa de remarcação ou diferença tarifária.
> Os passageiros com passagens compradas para períodos de alta temporada (julho, dezembro, janeiro, feriados e vésperas de feriados) poderão remarcar a viagem para qualquer data compreendida pelo tempo de validade do bilhete.
> Quem comprou passagens para baixa temporada poderá remarcá-las gratuitamente para voos a serem operados também em baixa temporada. Caso o consumidor queira remarcar para datas de alta temporada, deverá pagar diferença tarifária. Também é possível remarcar a viagem para outro destino, com pagamento de diferença da tarifa.
> As passagens adquiridas até a data de assinatura do TAC, entre 1º de março e 30 de junho de 2020, poderão ser canceladas sem custo adicional. O valor pago será mantido como crédito válido pelo período de um ano, a contar da data do voo.
> Ao remarcar o bilhete, a companhia aérea poderá cobrar eventuais diferenças de valores ou tarifas, sendo vedada, contudo, a cobrança de multas e taxas de remarcação.
> No caso da solicitação de reembolso da passagem, poderão ser aplicadas multas e taxas contratuais. Além disso, o valor pago pelo usuário será ressarcido em até 12 meses, sem correção monetária e sem multas, a contar da data do pedido.
> Quando o atraso ou cancelamento do voo decorrer do fechamento de fronteiras, não será exigida da companhia aérea o fornecimento aos passageiros de assistência como alimentação, hospedagem e traslado.
> As empresas aéreas devem disponibilizar gratuitamente canais de atendimento telefônico e online para sanar dúvidas e reclamações.
> As companhias também devem estar de forma ativa na plataforma digital consumidor.gov.br. A ferramenta permite a interlocução direta entre consumidores e empresas para solução de conflitos de consumo pela internet.
> As reclamações registradas até 30 de junho em qualquer um dos canais devem ser respondidas pelas aéreas no prazo máximo de 45 dias.
Fonte: Ministério Público Federal