As perdas na agricultura em função da estiagem provocam forte impacto econômico em municípios que dependem da atividade rural. Somente nos três municípios da Serra que já decretaram situação de emergência - Muitos Capões, Paraí e Santa Tereza - os prejuízos calculados chegam perto dos R$ 150 milhões, segundo a Emater.
A maior parcela deste valor corresponde aos prejuízos em Muitos Capões, município de cerca de 3,1 mil habitantes dos Campos de Cima da Serra, que tem perdas no milho, soja e feijão calculadas em R$ 124,13 milhões pela Emater. É cerca de um terço do Produto Interno Bruto (PIB) do município, dado que reúne tudo o que é produzido no período de um ano, tomando como base os últimos levantamentos do IBGE sobre o perfil econômico e estimativa populacional.
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O prejuízo somente no milho, que ocupa 15 mil hectares e teve metade da safra perdida, é de R$ 64,8 milhões. A soja, que cobre a maior parte da área do município, com 50 mil hectares plantados, teve perda de 20%, o que corresponde a um prejuízo de R$ 56 milhões. Também houve perdas no feijão da ordem de R$ 3,3 milhões. Também é afetada a pecuária para produção de leite e gado de corte. Uma parte menor da agricultura do município, com cultivos de maçã e uva, também foi atingida pela estiagem, com quebra de até 15% na safra da uva e 30% na safra da maçã.
Ao todo, são 70 mil hectares de agricultura e pecuária em Muitos Capões. Além do prejuízo neste momento para o município, que é basicamente rural, com a atividade industrial existente associada à agricultura, a menor arrecadação vai resultar em perda da fatia que o município recebe do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) daqui a dois anos, porque ela é calculada a partir do desempenho em anos anteriores.
— Acreditamos, com base no laudo da Emater e Secretaria da Agricultura, que teremos, em 2022, 20 a 25% de queda na arrecadação por conta da perda na fatia do ICMS — destacou a prefeita em exercício de Muitos Capões, Elenise Alves Cabral, em entrevista ao programa Gaúcha Hoje da rádio Gaúcha Serra na manhã desta quarta (15).
Segundo Elenise, em 30 dias de estiagem, foram abertas pelo município 42 aguadas, que são pequenos açudes para o gado, porque a água já tinha terminado em outras fontes.
Em Santa Tereza, município com menos de 2 mil habitantes e que depende bastante da agricultura, o maior problema foi nos parreirais. Conforme o secretário da Agricultura, Ernani Michelon, 90% do prejuízo no município, calculado em R$ 7,6 milhões, foi nas uvas, e o restante atingiu o milho e hortaliças. Houve ressecamento de fontes como cisternas e açudes.
Só nas lavouras de uva, a perda em geral foi avaliada em cerca de 40%, sendo que esse percentual é maior em algumas áreas e menor em outras devido à distribuição irregular das poucas chuvas que ocorreram. O relatório de perdas também inclui prejuízos no transporte de água com caminhões pipa para a população.
Segundo Michelon, o principal entrave para soluções de irrigação a longo prazo que evitem problemas quando há falta de chuvas é o alto recurso financeiro necessário em função do relevo acidentado, o que encarece os custos para transportar água da sede do município aos pontos mais altos.
— No ano passado, abrimos dois ou três poços nas comunidades de Linha Graciema e São Valentim, que ficam em pontos mais altos do município. Mas, a uma profundidade de até 300 metros, não foi encontrada água. Precisaríamos de mais recursos para fazer uma escavação mais profunda e arcar com os custos de energia para bombear a água de uma profundidade maior — afirma.
Em Paraí, município de 7,6 mil habitantes que gera metade das riquezas com a agricultura, o maior prejuízo foi com os grãos. Só com o milho, a perda chegou a 70% em 3,1 mil hectares, o que corresponde a R$ 12,4 milhões. As perdas na soja foram calculadas em mais de R$ 2,4 milhões. Ao todo, o prejuízo ficou em quase R$ 16 milhões no município.
Conforme o secretário de Administração, Valcir Luiz Trento, nove famílias estão recebendo água com caminhões pipa. A prefeitura tem um programa para auxiliar os produtores rurais a abrirem cisternas no interior, mas seriam necessários mais recursos para aumentar o alcance desse trabalho. Essas medidas, no entanto, serviriam para garantir o consumo humano e também dos animais, e não para a agricultura. Para ampliar a irrigação, o investimento, segundo o secretário, teria de ser muito maior.
— O custo é uma das principais questões para a irrigação, porque teríamos que utilizar como fonte um curso d'água. O rio Carreiro, no limite do nosso município, tem uma distância grande para puxarmos a água até as regiões produtivas, e tem muito morro na região, o relevo é ruim — explica.
Com os decretos de emergência desta semana, os municípios esperam facilitar a obtenção de indenização de seguro pelos agricultores e que os produtores possam renegociar mais facilmente os financiamentos junto a bancos. Se vierem recursos do Estado ou União, poderiam ser utilizados para eventuais trabalhos emergenciais de abertura de poços ou reposição de prejuízos com o desabastecimento de água, que também atinge a população humana e requer gastos com caminhões pipa para estes locais, especialmente os mais altos e afastados das sedes municipais.