Aos 64 anos, formado em Engenharia Mecânica, pós-graduado em marketing e com ampla experiência como executivo, para o empresário e consultor Edmour Saiani, ainda assim, a lição de vida que ressoa como principal ideal foi aprendida quando era um jovem vendedor.
— Aprendi duas coisas na vida: uma quando me formei em engenharia e, com o exemplo do foguete, percebi que só se dá bem quem tem fogo no rabo; e a outra vendendo sapatos com meu pai, quando aprendi a ajoelhar para o cliente.
Palestrante do 2º Simpósio Estadual do Varejo, programação do Sindilojas Caxias que ocorre hoje, Saiani falará sobre a sua maior especialidade: conceitos da excelência no atendimento do varejo. Em entrevista ao Pioneiro, ele antecipou alguns dos tópicos da apresentação. Confira:
Como se diferencia o bom do mau atendimento? Não é algo muito relativo?
Edmour Saiani: A maior parte dos atendimentos tem três naturezas. Um é o atendimento "interesseiro", que é aquele que só visa fazer a venda instantânea e tirar o máximo do cliente. A maioria das empresas mede vendas por indicadores. Tem também o atendimento "interessado", que é aquele que tenta resolver genuinamente o problema do cliente e tem o "interessante", que se aproxima do cliente e se destaca. Um dos maiores erros é atender o cliente como você gosta de ser atendido. Caramba, a única pessoa que gosta de ser atendida que nem você, é você. O resto tem um jeito de ser atendido e temos de trabalhar isso. A diferença entre atendimento bom e ruim é quando você realmente está interessado no cliente e não quer apenas vender para ele, quer causar uma boa impressão para que saia dali falando sobre você. O ideal é que o atendimento seja tão bom que viralize, que a pessoa passe para frente o relato da experiência de uma maneira positiva.
Quando a atenção em um atendimento se torna excessiva e inconveniente?
Atendimento é que nem corrida de Fórmula 1: você usa a zebra (limite entre a pista e a área de escape), mas não passa dela. Se não usar a zebra e tentar se aproximar do cliente, você não tem nenhuma intimidade com ele, mas se você ultrapassar a zebra, extrapola a intimidade. Para entrar na vida do cliente, precisa haver permissão. Tem aqueles casos de as pessoas entrarem na loja e o atendente já pergunta "qual o seu nome?". Calma, ainda não é o momento. Daqui a pouco a pessoa fica mais confortável. É preciso sair do zero e ganhar confiança. Depois que ganha essa confiança, ele não só permite que ligue, como gosta que você ligue, até para avisar dos produtos que chegaram à loja. Passou daí, exacerbou. Tudo tem a ver com a conquista da confiança gradativa.
Carisma é necessário, obrigatório ou o principal é estar apto a fazer essa leitura do cliente?
Primeiro empatia, depois simpatia. Se eu tentar ser simpático antes de ser empático posso desagradar o cara que entrar na loja e não quer contato. Se ele entra na loja e eu digo "bem-vindo, estou aqui para ajudar você", pronto, a partir daí deixo a pessoa dar pistas de como quer ser atendida. O carisma em si é meio que um mito, principalmente essa ideia de que o vendedor tem de ser falante. O melhor vendedor na verdade é o que ouve. Depois, quando ouviu, percebeu o que precisa, precisa passar uma informação entusiasmante. Mais do que o carisma é, portanto, reconhecer que pessoas são importantes e precisam ser cuidadas, e ter conhecimento do produto que vende, de maneira que conecte o que a pessoa precisa e o que você pode dar para ela.
É preciso então haver sensibilidade do vendedor para se adaptar ao perfil do cliente. Isso é possível de ser ensinado?
O que é mais importante? Contratar ou treinar? Claro que contratar bem. A pessoa, se foi criada por pais que a ensinaram a se importar com as pessoas, ela vai dar certo. Se não foi criada dessa forma, não vai ter treinamento que ensine ela a se importar com as pessoas. O treinamento é para você dizer para a pessoa como espera que ela atenda no seu negócio. Chegou o cliente, se aproxime, saúda, não aborde, saúda. É o chamado script, mas não é roteiro obrigatório. É o mínimo que se tem de fazer. Ninguém gosta de ser atendido no "padrão", primeiro que padrão é chato, é um só, e cada pessoa quer ser atendida da maneira dela.
Ao mesmo tempo que exige um bom atendimento, é preciso que o empresário dedique um bom tratamento aos funcionários?
Se trata bem, é quase que automático que o vendedor trate bem o cliente. Se não tratar bem o seu pessoal, por que diabos vão tratar bem o cliente? A maioria das empresas tem um problema sério, o dono não se interessa genuinamente nas pessoas que trabalham nela. O cara contrata uma pessoa ruim ou contrata uma pessoa boa e não trata ela de uma maneira que se sinta inspirada a atender bem. Portanto, às vezes a pessoa está num ambiente tão ruim que acaba não se dedicando ao cliente.
Subestima-se o impacto do mau atendimento nos resultados?
Existe uma pesquisa da Forum Corporation que informa que 15% dos clientes vão embora de uma loja por um produto melhor, 15% por preço menor, 21% porque não foram atendidos e 49% porque entraram na loja e foram mal atendidos. Ou seja, 70% têm a ver com mau atendimento.
Na "cartilha" do bom negócio todos sabem que bom atendimento é essencial, mas nem sempre essa virtude é praticada. Por que é tão difícil tirar do papel?
Porque donos não têm interesse genuíno em pessoas. Os donos de negócio em varejo se preocupam com o aspecto físico, que são o produto e a loja, e o digital, que é quase pecado hoje em dia não investir. Eu costumo dizer que a segunda coisa mais difícil em um negócio é achar gente, e a coisa mais difícil é achar gente boa. Então, trate de procurar e merecer que as pessoas queiram trabalhar com você.