O baixo preço pago pelo litro de leite aos produtores está afetando e, em muitos casos, inviabilizando os negócios do setor na Serra Gaúcha. Desde maio deste ano, os valores estão despencando. Dados da Emater RS-Ascar apontam que o maior valor pago em julho deste ano foi de R$ 1,25 o litro. Em julho do ano passado, chegou a R$ 1,50 _ ou seja R$ 0,25 a mais. Parece pouco, mas para quem produz 20 mil litros por mês, a queda no total recebido no final do mês é de R$ 5 mil.
É o caso do produtor de Nova Petrópolis Jocemir Boone, 51 anos, que herdou dos pais e avós o gosto para lidar com gado leiteiro.
— Está difícil de trabalhar. Dá vontade de largar tudo — reclama.
Em sua propriedade, no interior do município, a família de seis pessoas vive do leite tirado duas vezes ao dia das 29 vacas que mantém na lavoura. A produção chega a 650 litros por dia - cerca de 20 mil/ mês. Em julho do ano passado chegou a receber R$ 1,40 o litro. Este ano, o valor caiu para R$ 1,18. O impacto negativo no mês foi de R$ 4,4 mil.
Dados do IBGE apontam que, em 2017, a Serra tinha 4,8 mil produtores vinculados às indústrias. Em dois anos, pelo menos 500 famílias largaram a produção de leite e migraram para outros setores da agricultura. No Rio Grande do Sul, o instituto registra 65 mil produtores. De 2015 a 2017, 19 mil agricultores abandonaram a função.
— E continua diminuindo — alerta o gerente técnico adjunto da Emater/RS-Ascar, Jaime Eduardo Ries.
O que mais indigna Boone é o volume de trabalho que a produção de leite exige versus a baixa remuneração e valorização. A lida com a ordenha das vacas começa às 6h e termina após as 21h.
— Nenhum outro setor trabalha tanto. Não temos finais de semana e tampouco feriados para amenizar a força física — observa.
A redução no valor pago pelo litro do leite impacta diretamente nos investimentos da propriedade.
— Meu projeto para este ano era ampliar a estrutura e adquirir novos equipamentos. Mas, não vai dar — lamenta Boone.
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A incerteza do cenário fez ele frear os planos, pois antes de tudo é preciso garantir a sobrevivência da família.
— São seis pessoas que dependem do leite. Não dá para arriscar, pois não sabemos quanto vamos receber no final do mês — justifica.
Ele se refere à forma de parceria entre produtores e cooperativas. O valor a ser pago só é definido no final do mês, depois que toda a produção foi entregue.
Outra preocupação de Boone e a esposa, Gessi, é como manter o filho, Moisés, de 17 anos, no campo e dar continuidade ao trabalho. Ele está cursando técnico agrícola e pretende se formar veterinário.
— Mas, se o cenário não melhorar, vai acabar indo para a cidade — lamenta o pai.
O valor mais baixo dos últimos 4 anos
O atual preço pago pelo litro de leite no Estado é o menor desde 2015. As planilhas da Emater mostram que o maior valor de referência de agosto é de R$ 1,25. O menor é R$ 0,97 e, a média, fica R$ 1,08 _ variação implica no processo de produção e na qualidade. Preços mais baixos que esses, só foram registrados em 2015, segundo levantamento da Emater RS. Entre as causas está a redução do poder aquisitivo da população que fez o consumo cair.
— O mercado leiteiro só vai aquecer, se a economia do país melhorar — alerta o técnico da Emater RS Jaime Eduardo Ries
Em segundo lugar está a importação de leite de outros países, principalmente do Uruguai e da Argentina.
Se o ritmo de queda vai permanecer? Dados do Conselho Paritário Produtores/Indústrias de Leite (Conseleite), divulgada terça-feira (20), o valor estimado para o mês de agosto é de R$ 1,08 _ 0,08% menor do que o consolidado de julho.
Segundo o professor da Universidade de Passo Fundo (UPF) Eduardo Finamoreo, o RS precisa de um plano estratégico para escoamento de sua produção, tendo em vista que, em breve, deverá concorrer com mais competitividade para enfrentar os mercados externos e até mesmo os nacionais.
— A produtividade das vacas vem aumentando em outras regiões, como Minas Gerais. O Rio Grande do Sul precisa ser mais competitivo ou achar novos mercados para seu leite — prevê.