Após dois anos fazendo intercâmbio na Irlanda, Andrigo Ceconello voltou a Caxias do Sul, em junho de 2017, com uma ideia fixa na cabeça: criar a própria empresa. Por ter trabalhado como empregado no ramo da alimentação na Europa, Ceconello notou que o perfil das lojas de conveniências irlandesas era muito diferente do que existia no Brasil. No Exterior, o cardápio era mais variado, incluindo desde refeições rápidas a alternativas de pratos saudáveis, contemplando do café da manhã à janta. Vendo potencial neste tipo de negócio, decidiu importar o modelo.
Junto com um sócio, Ceconello investiu mais de R$ 250 mil para montar a Like a Deli, em um posto de combustíveis no bairro Nossa Senhora de Lourdes. O estabelecimento abriu as portas em maio e pretende consolidar o conceito de conveniência premium, no qual o cliente, se preferir, pode personalizar os pratos a qualquer hora e nos sete dias da semana.
– Às vezes tu tens que criar as oportunidades, criar uma demanda. É o que estamos fazendo. A gente vê as pessoas saindo de Caxias para ter uma experiência de consumo, então por que não trazer para cá um tipo de experiência? – pondera Ceconello.
A Like a Deli é uma das 4,7 mil empresas que surgiram na cidade entre janeiro e junho de 2019, o maior número de aberturas para um semestre nos últimos cinco anos, de acordo com dados da delegacia regional da Receita Federal em Caxias do Sul. O resultado também representa crescimento de 10% frente a igual período de 2018, quando foram inaugurados 4,3 mil empreendimentos.
O gerente regional do Sebrae-RS na Serra Gaúcha, Tiago Mignoni, explica que a aceleração na criação de negócios na cidade acompanha um fenômeno verificado em todo o país. Como um reflexo da recessão enfrentada nos últimos anos, muita gente recorreu ao empreendedorismo como uma alternativa para obtenção de renda.
– Vivemos uma conjuntura econômica diferente e abrir um novo negócio é um caminho para a busca de renda. Há quem abra o próprio negócio por necessidade. Além disso, outro fator é que a formalização de empresas também é uma consequência das oportunidades que surgem no mercado – afirma.
4 de cada 5 novas empresas são MEIs
Nos últimos anos, a formalização de negócios é liderada em peso pelos Microempreendedores Individuais (MEIs). Em 2019, esse tipo de empresa responde por 3,8 mil dos 4,7 mil números de Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) registrados em Caxias, o que alcança a marca de 80% do total. Ou seja, 4 de cada 5 novos empreendedores na cidade são MEIs.
A economista Maria Carolina Gullo destaca que boa parte desses MEIs são pessoas que perderam o emprego durante a onda de demissões que ocorreu no município entre 2014 e 2017, ceifando mais de 20 mil vagas. Devido às dificuldades de recolocação no mercado de trabalho formal, essa parcela da população decidiu montar o próprio negócio, por vezes até prestando serviços para seu antigo empregador.
– É algo positivo na medida em que essas pessoas estão buscando uma saída digna, de seguir trabalhando. Por outro lado, muitas vezes, elas têm a habilidade (de um ofício), mas não estão preparadas para gerir uma empresa, mesmo como MEI. Por isso, a vida de muitas empresas é pequena – analisa.
A tendência é de que o registro de CNPJs siga em alta. Segundo Maria Carolina, a liberação da terceirização, as modificações realizadas na reforma trabalhista e a iminente reforma da Previdência, que definirá uma idade mínima para homens e mulheres se aposentarem, são aspectos que tendem a levar cada vez mais pessoas a criarem empresas.
Fechamento de empresas cai
Ao mesmo tempo em que a criação de empresas apresentou crescimento em Caxias do Sul ao longo do primeiro semestre, o fechamento de negócios diminuiu de ritmo. De janeiro a junho, foram encerradas 2 mil companhias na cidade, conforme as estatísticas da Receita Federal. No mesmo período de 2018, haviam sido cancelados 5,5 mil números do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) no município. Com isso, caiu 62% a mortalidade de estabelecimentos.
Segundo o delegado da Receita Federal em Caxias do Sul, Nilson Sommavilla Primo, a queda é justificada, principalmente, por uma situação atípica constatada no primeiro semestre de 2018.
– Quando a Receita identifica que as empresas ficam algum tempo sem entregar declarações e não fazem movimentações, elas automaticamente ficam inaptas. Então, no primeiro semestre do ano passado, ocorreu esse procedimento interno (de considerar inaptas diversas empresas) – explica Primo.
O setor que mais teve negócios encerrados na primeira metade de 2019 foi o comércio varejista, com 241 baixas. Na sequência aparecem os ramos de atividades de serviços pessoais (129), atividades de ensino (108) e bares e restaurantes (96).
Ainda assim, entre a abertura e o fechamento de negócios, Caxias teve saldo positivo de 2,7 mil CNPJs nos primeiros seis meses deste ano, o melhor resultado desde o primeiro semestre de 2014. O desempenho também reverteu o resultado do semestre inicial de 2018, quando houve mais estabelecimentos fechados do que abertos, totalizando saldo negativo de 1,1 mil.