O campo vive um impasse. A legislação ambiental, que tradicionalmente privilegiou a preservação de florestas, atentou para a importância ecológica dos campos. A fiscalização apertou e multas milionárias estão sendo aplicadas a produtores que mexem nos campos da região. Negócios estão sendo praticamente inviabilizados, o impacto econômico negativo começa a ser calculado pelos municípios e a própria preservação dos campos de pastagem pode estar ameaçada.
Em São Francisco de Paula, a Operação Campereada, deflagrada pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), deixou pelo menos 35 produtores de mãos atadas, impedidos de produzir. A ação está baseada nas leis federais 11.428/2006 e 12.651/2012, que, entre outros pontos, proíbem o corte ou a retirada do campo nativo sem prévia autorização.
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Quem mexeu no solo este ano está recebendo multas milionárias que, se pagas, vão inviabilizar o negócio. Segundo a legislação, o manuseio do campo só é permitido mediante autorização do Ibama, via Cadastro Ambiental Rural (CAR). Mas, de acordo com os produtores, o órgão nunca autoriza e também não leva em conta que há campos anteriormente alterados pelo homem.
Impacto no desenvolvimento
A presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Chico, Margarete Medeiros Marques, conta que a entidade que representa foi a primeira do Estado a ir até o Ibama pedir o licenciamento para a produção nas áreas de vegetação rasteira. O máximo que conseguiu foi a licença de até dois hectares por propriedade.
– Isso não dá para nada. E o Ibama não mostrou vontade de mudar a situação – reclama ela.
O setor primário é a principal matriz econômica de São Francisco de Paula. Responde por 59,2% da arrecadação do ICMS. A ação do Ibama impede que os produtores façam o manejo no solo do campo nativo para plantar pastagem que alimenta o gado no inverno ou qualquer outro tipo de cultura, como o cultivo de grãos. Essas propriedades representam mais de 8 mil hectares de terra sem produção, afirma a presidente.
– A legislação está impedindo o desenvolvimento do município, da região e do Estado. Quase 60% da renda do município é oriunda do meio rural – garante Margarete.
O secretário da Agricultura de São Chico, Rafael Marques, faz as contas. Em 2016, a agropecuária representou R$ 50 milhões da arrecadação do município, a agricultura, R$ 74 milhões, e a fruticultura, R$ 51 milhões. Ele diz que ainda não tem um levantamento de quanto a medida vai impactar na arrecadação deste ano, mas prevê que o resultado negativo na receita vai ser de pelo menos 20%. Marques garante que o município vai deixar de crescer.
– A lei está equivocada. Faltam informação e apoio governamental. Ninguém quer derrubar árvores. O assunto é campo. Eles (os agricultores) só querem produzir e têm consciência ambiental. Sabem que a água é o maior bem. Está faltando a visão do outro lado da moeda. Afinal, o que e como vamos produzir? – questiona Marques.
O que diz o Ibama
A superintendente estadual do Ibama, Claudia Costa, informa que a lei prevê que não sejam abertos novos campos sem autorização. O CAR, segundo ela, possibilita o caminho para a licença do manejo e que o órgão está apenas cumprindo a lei.
Apesar da presidente do Sindicato, Margarete, afirmar que esteve no Ibama para falar sobre o assunto, Claudia garante que não foi procurada por produtores ou lideranças de São Chico.
Sobre as multas, explica que são valores fechados e que dependem do número de hectares e em que situação a área foi encontrada:
– Eles (os produtores) podem questionar a lei. Estamos fazendo o nosso trabalho.
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Ivanete Marzzaro
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