Depois de 896 dias e 84 mil quilômetros rodados a bordo de um Sandero 1.0, terminou a expedição, do casal de jornalistas João Paulo Mileski e Carina Furlanetto, no último domingo (15), quando chegaram de volta à Bento Gonçalves, na Serra. A aventura, intitulada Crônicas na Bagagem começou ainda em 2019, quando os dois partiram com o objetivo de conhecer todos os países da América do Sul e, na volta, visitar todas as unidades federativas do Brasil.
No entanto, em março de 2020, quando iniciavam a última etapa do trajeto, as restrições por conta da pandemia obrigaram o casal a voltar a Bento Gonçalves, adiando o sonho de conhecer de ponta a ponta o Brasil.
— Nós estávamos nos Lençóis Maranhenses quando fechou tudo, quando iniciou a pandemia. A gente chegou a fazer um passeio lá e, no dia seguinte, fechou tudo. Acabamos voltando para casa, mas sem concluir o objetivo de passar por todos os Estados do país. Ficamos um ano parados até nos sentirmos seguros para voltar à estrada — conta Carina.
O roteiro inicial previa que os viajantes levariam um ano e meio para conhecer todos os estados do Brasil, mas a viagem acabou durando dois anos e meio.
— Subestimamos o nosso país. Conhecer todo o Brasil é impossível. A gente tentou conhecer o máximo que dava mas, tivemos nossas limitações, é um carro comum e tem lugares que precisa de um veículo maior, e tem lugares que só se chega de barco — destaca a jornalista.
Cama improvisada
A bordo do Sandero guerreiro, o casal transformou o carro em casa pelos dois anos e meio que passaram na estrada. Eles tiraram os bancos de trás e improvisaram uma cama no veículo, viabilizada por meio de uma parceria com uma fabricante de colchões. Além disso, instalaram uma bateria extra para que pudessem preparar as refeições em uma panela elétrica.
Foram mais de 700 noites dormindo no carro, seja em postos de combustíveis, praças, praias, beiras de rios, estacionamentos de hospital, de supermercados e pontos de apoio de pedágio.
— O Brasil é um "continente", então cada lugar tem suas particularidades. A gente gostou muito do Norte como um todo, porque é muito diferente da nossa realidade, não só a questão climática. Também gostamos muito do Sertão, no Nordeste e, claro, Brasília, que foi nossa última parada, de forma simbólica, por ser a Capital — relembra João.
Do asfalto à estrada de areia
Entre os muitos desafios enfrentados, o casal destaca o dia em que o Sandero atolou em uma estrada de areia, no Sertão. Naquele momento, foi graças à ajuda das pessoas, até então desconhecidas, que eles conseguiram seguir viagem:
— Nós fomos ajudados naquele contexto por pessoas que viviam numa região onde não tinha rede de energia. Essas pessoas tinham muito pouco e o pouco que elas tinham compartilhavam com a gente, sem pedir absolutamente nada em troca. A gente sentiu isso ao longo de toda a viagem, que as pessoas que menos têm são as que mais estão dispostas a ajudar — salienta João.
Do Sertão à Serra, o casal também enfrentou diferentes desafios climáticos. Em Urubici, Santa Catarina, por exemplo, os dois percorreram a Serra catarinense com neve. Mais tarde, quando chegaram ao Norte, as temperaturas acima dos 40ºC impactaram até o momento do descanso.
— Era muito quente, a gente teve que abraçar um saco de gelo, pela dificuldade que a gente tinha para dormir no Sandero. Em Novo Airão, no Amazonas, também estava muito quente. Nós fomos até uma conveniência e tinha só um pacote de gelo, a gente conseguiu pegar o último e dormimos abraçados nele. No calor, a gente sofria muito. Aceleramos o curso do Rio São Francisco por causa disso — relembra Carina.
A volta para casa
Desde 15 de outubro, quando Carina e João retornaram a Bento Gonçalves, a vida "normal" ainda não começou. O casal conta que escolheu voltar no domingo justamente para poder conseguir reunir a família e as crianças.
— A gente ainda está em movimento, como se estivesse em um barco. Mas, eu acho que é uma questão de tempo para a gente, porque dormimos em quase 350 cidades ao longo desses quase 900 dias, então a cada dois dias e meio, a gente trocava de cidade, então a gente estava em movimento o tempo todo — conta João.
Agora, o plano dos dois aventureiros é de reunir todas as memórias, diários e vivências em um livro. A ideia é lançá-lo em cerca de seis meses, mas tudo depende da quantidade de conteúdo transformada em texto.
— A gente vive num país grande, não só em em dimensões, mas nas diferenças também. A gente fala do Norte e Nordeste, mas no próprio Rio Grande do Sul, na fronteira com o Uruguai, por exemplo, não tem nada a ver com a nossa região aqui. As cidades têm um outro ritmo de de vida.
Daqui pra frente, os dois vão se dedicar ao livro que contará as experiências da viagem, mas não descartam novas viagens, longas ou curtas, para desbravar outros cantos do país e do mundo.