Que tal entrar no clima do Mississippi Delta Blues Festival com uma boa leitura? Às vésperas do festival ganhar a sua primeira edição em Gramado (11 a 13 de agosto), a editora caxiense Belas Letras tira do forno uma biografia do nome mais icônico da história do blues, o cantor e violonista Robert Johnson (1911-1938). A Música do Diabo (tradução para Up Jumped The Devil, lançado originalmente em 2019, nos EUA) dá um mergulho na vida do músico que pouco experimentou do sucesso em vida, mas que até hoje é cultuado e tem suas músicas gravadas no mundo todo.
Apesar do título fazer referência à lenda mais famosa envolvendo Robert Johnson, do pacto na encruzilhada, A Música do Diabo aqui pode ser compreendida num contexto mais histórico e menos mítico. Era assim que as famílias mais religiosas se referiam ao blues em seus primórdios, e por isso muitos tocadores deste gênero, como o próprio Robert Johnson, eram mal vistos nos círculos mais conservadores e assim ficavam relegados a tocar em pequenas espeluncas, as jukes, onde a música normalmente era a trilha sonora não apenas para a dança, mas também para as brigas e todo tipo de azar (como o próprio biografado viria tragicamente a conhecer).
Mas não é por se ater mais aos fatos do que ao mito que a biografia deixa de ser saborosa. Pelo contrário. Com uma pesquisa meticulosa a cartórios e acervos de memória de cidades muito pequenas, o folclorista Bruce Conforth e o historiador Gayle Dean Wardlow reconstituem muitos dos passos dados por Johnson em sua breve trajetória, viajando pelo Mississippi, Tennessee e Arkansas, até finalmente conhecer estúdios de gravação no Texas, onde registraria as 29 músicas que deixou como legado.
Ao tratar com rigor jornalístico a busca por respostas não apenas sobre a vida errante, mas também sobre a habilidade incomum do violonista, que agregou ao blues técnicas que até então eram desconhecidas nos confins do delta do Mississippi, em suas 318 páginas a obra ilumina figuras como Ike Zimmerman, músico que não fez fama, mas que foi o grande mestre de Johnson. O leitor também passa a conhecer um outro lado da figura do bluesman, que passou parte da infância com familiares em Memphis, no Tennessee, onde também teve a oportunidade de frequentar a escola (ao contrário da maioria dos seus contemporâneos). São fragmentos que ajudam a fornecer uma noção mais real sobre o fato de Robert Johnson ter sido um músico que realmente impressionou aqueles que o conheceram em vida.
Para os apaixonados pelo blues, Robert Johnson - A Música do Diabo torna-se parte da bibliografia básica disponível em português, ao lado de B.B. King - A Autobiografia; Blues - da Lama à Fama, de Roberto Muggiatti, da HQ Blues, de Robert Crumb, e de alguns poucos títulos que podem estar escapando à memória. Ao concluir a leitura, fica a torcida para que o lançamento inspire a editora nascida na terra do MDBF a mergulhar mais fundo e traduzir novas biografias blueseiras para o público brasileiro.
Para quem quiser conhecer mais sobre o lançamento, a Belas Letras disponibiliza em seu site as 30 primeiras páginas do livro. Também no site da editora ou nas livrarias, o preço médio é de R$ 75.