Foram apenas cinco anos, porém suficientes para marcar uma época que não irá se apagar da memória de Caxias do Sul. O bar Vôo Livre, que entre 1989 e 1994 foi muito mais do que a casa da boêmia na Rua Vinte de Setembro, ganha um documentário à altura de sua importância para a formação cultural e identitária de tantos de seus frequentadores. Com produção cultural de Cláudio Troian e direção de Le Daros, a estreia será amanhã, às 17h, com sessão gratuita na Sala de Cinema Ulysses Geremia.
Ao longo de 48 minutos, o documentário intercala depoimentos do casal de fundadores, Volnei Mari e Eliana Turbay, com o de políticos, como Pepe Vargas e Ana Corso; jornalistas, como Ciro Fabres, Nivaldo Pereira e Vânia Lain; artistas, como a atriz Zica Stockmans, o ator Jorge Valmini e o escritor Marco de Menezes; os arquitetos Erni Sabedot e Edson Marchioro; entre outras vozes saudosas que somam 23 depoimentos.
Saborosas como os quitutes árabes preparados por Eliana e que arrebatavam a clientela, as memórias remetem ao caráter gregário do bar, que reunia todas as tribos que coabitavam a Caxias naquela época de intensa transformação e de desejos de liberdade, provocados pela redemocratização do Brasil. Essa sinergia fazia o Voo ser tão livre quanto imprevisível: o frequentador muitas vezes chegava ser saber que naquela noite assistiria a um sarau de poesia, uma performance teatral ou uma leitura de cartas de tarot.
_ Um dos vieses do documentário é justamente mostrar que o Vôo Livre, embora não tenha durado tanto tempo, foi um caldeirão, um formador de personalidades em diversas áreas. Existia um clima permanente de criação, de desenvolvimento de parcerias, de querer descobrir coisas novas. Vários depoentes falam dessa troca muito grande que havia _ destaca Le Daros.
Com o auxílio de material jornalístico da época, o documentário também resgata momentos como a criação de um prêmio próprio, o Destaques Vôo Livre. Para muitas personagens que ao longo dos anos seguintes viriam a receber diversas honrarias, aquele singelo troféu foi o primeiro reconhecimento e um impulso para seguir carreira, fosse na arte, no jornalismo ou na política. Outro ponto alto são as memórias de shows marcantes, como os do cantor e compositor Mozer de Oliveira e da dupla canoense Laco e Edson, que se tornariam habitués da casa, cujas atividades se encerraram após uma ação trabalhista movida por um ex-garçom.
Alguns dias após a sessão de estreia, o documentário será disponibilizado na fan page própria (facebook.com/DocVooLivre). O financiamento é da Lei Municipal de Incentivo à Cultura.
Trechos de depoimentos
"Foi o primeiro espaço não convencional onde a gente passou a levar peças de teatro, intervenções e performances, de uma forma muito espontânea. O conceito do Voo Livre de certa forma nos forjou" (Zica Stockmans, atriz e professora de teatro)
"Havia a criação de uma cena cultural. Muitas bandas surgindo, o teatro muito forte, as escolas de dança eram muito ativas. Os bares se tornaram um ponto de referência para a cidade, nesse âmbito da mobilização cultural" (Dinarte Albuquerque Filho, jornalista e escritor)
"O bar surgiu na esteira da campanha das Diretas Já e de outras lutas democráticas da época. O público que frequentava era o que tinha afinidade com essas questões. Não era só o pessoal da esquerda propriamente dita, mas sim todo o campo democrático da cidade" (Pepe Vargas, deputado estadual e ex-prefeito de Caxias)
"Pelo momento político e social que a gente estava vivendo, o bar foi o negócio certo, no lugar certo, na hora certa. Havia momentos em que eu sentia como se estivéssemos em uma nave espacial que tivesse decolado para um outro patamar" (Volnei Mari, ex-proprietário)
"Esses sonhos que a gente acalentou ali, somado ao fato da nossa juventude e do nosso desejo, isso faz com que coloque um filtro no nosso olhar. A gente lembra com saudade do bar, mas também com saudade da gente (Élvio Gonçalves, publicitário e escritor).
Programe-se
O quê: lançamento do documentário Voo Livre
Quando: neste sábado (22), às 17h
Onde: Sala de Cinema Ulysses Geremia, no Centro de Cultura Ordovás
Quanto: entrada gratuita (assentos limitados)