Você já se sentiu adentrando um profundo vazio existencial ao rolar a barra de atualizações de alguma rede social? Já se pegou totalmente perdido ao ficar algumas horas sem acesso ao celular? Ou já tentou ativar um filtro imaginário ao mirar a própria imagem no espelho? A identificação com pelo menos uma dessas sentenças tem se tornado cada vez mais comum e parece embutida no pacote do mundo contemporâneo que atravessamos. Se a internet tem nos proporcionado maravilhas desde sua popularização – facilidades que se tornaram ainda mais essenciais durante o momento de distanciamento social –, muitas problemáticas também estão inseridas nesse universo, principalmente no que diz respeito ao uso das redes sociais. “Nada grandioso entra na vida dos mortais sem uma maldição”, a frase do grego Sófocles (497 a.C. - 406 a.C.) atravessa a história da humanidade para iniciar uma discussão superatual. Ela está na abertura do documentário O Dilema das Redes, sucesso recente da Netflix que vem causando impacto – e certo desconforto – ao revelar detalhes sobre uma engrenagem invisível que controla “escolhas” de muitos de nós.
A produção reuniu vários profissionais que já trabalharam em gigantes das redes muito presentes na vida de qualquer dono de smartphone, caso de Google, Facebook, Twitter, Instagram, Pinterest, etc. Todos os entrevistados carregam uma característica em comum: a preocupação com o rumo tomado pela presença maciça das redes sociais na vida das pessoas. Nos depoimentos, é possível perceber que muitos carregam uma certa culpa por terem ajudado a criar uma força que parece ter saído do controle. Alguns dos entrevistados citam preocupações éticas como motivação para terem largado seus antigos empregos. Aliás, um dos personagens centrais do documentário é Tristan Harris, que exercia justamente a função de designer ético do Google. Em algum momento, ele esbarrou em preocupações ligadas à manipulação dos usuários, tentou realizar mudanças dentro da instituição em que trabalhava, mas acabou ignorado. Foi assim que, em 2013, criou o Center for Humane Technology e se tornou uma voz ativa sobre o poder assustador das redes sociais na vida das pessoas.
Ao contrário de documentários que levantam uma questão e trazem diferentes argumentos prós e contras para debatê-la, em O Dilema das Redes todos os entrevistados parecem alertar o espectador para uma única e clara mensagem: você está sendo manipulado sem saber. Para não tornar o formato maçante, o documentário mescla o conteúdo das entrevistas com trechos ficcionalizados que acompanham a vida de uma família com três jovens filhos: a mais nova é extremamente viciada nas redes, a mais velha é consciente do poder nocivo da internet e o do meio encontra-se um pouco perdido entre um extremo e o outro. É esse personagem do meio que ganha mais destaque na narrativa, servindo como exemplo para o documentário explicar (quase que didaticamente) como pensam e agem as redes nas quais ele está inserido. Numa das cenas mais emblemáticas envolvendo esse personagem, ele sucumbe às tentações das redes sociais enquanto os versos do clássico I Put a Spell on You (na voz de Nina Simone) ganham nova simbologia: “eu coloquei um feitiço em você, porque você é meu”.
Mas quais são as reais ameaças que um simples refresh na linha do tempo das redes sociais pode representar? O documentário apresenta várias. E elas vão muito além da depressão, da ansiedade e do estímulo ao consumo. A democracia também está na corda bamba desde que a polarização tomou conta das redes, e que as fake news passaram a se espalhar descontroladamente. O Brasil, terceiro em uso de redes sociais num ranking de 46 nações, é citado no filme como um exemplo prático de como informações inverídicas que ganharam força por meio de ferramentas digitais podem impactar no sociedade. O caso mostrado é a eleição do presidente Jair Bolsonaro.
Apesar do gosto amargo que o documentário deixa no espectador, O Dilema das Redes parece ter uma mensagem muito mais construtiva do que somente “delete agora mesmo seu perfil em todas as redes sociais”. A maior parte dos entrevistados é otimista em apontar que a força de vontade coletiva pode mudar o rumo das coisas. Nesse sentido, o filme se propõe a um primeiro e importante passo, o de reconhecer o problema.
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