Com que idade se deve desistir de realizar sonhos? Arnaldo Passarin, aos 86 anos, desconhece a resposta. O paulista de Jundiaí, que desde 1954 reside em Flores da Cunha, acaba de capitanear o lançamento do mais novo empreendimento voltado para o enoturismo no Vale dos Vinhedos, a Vinícola Cave do Sol. Às margens da ERS-444, num terreno de 36 mil metros quadrados, a construção une modernidade e bom gosto à tradição de uma família que há quase um século se dedica à vitivinicultura, mas que só agora decide atrelar sua história ao enoturismo.
Já cantava Raul Seixas que sonho que se sonha junto é realidade. Pois foi ao lado da esposa, Arlete, e dos filhos César, Cristian e Cristiane, que Passarin elaborou o conceito da Cave do Sol, erguida em uma área adquirida pelo empresário em 1998, quando o turismo ainda engatinhava neste que hoje é um dos destinos mais procurados do país, em Bento Gonçalves. Também foi naquela época que a família registrou o nome da empresa. Além de estampar o logo da marca, o astro-rei do sistema solar é tema de algumas obras de arte que irão encantar os visitantes.
– Cave do Sol é um nome que sempre agradou à família, por isso garantimos o registro mesmo sem ter a intenção de usá-lo na época. O sol é celebrado em diversas culturas, entre elas os povos incas, que foi a representação que escolhemos para ser o nosso logo – conta Cristian.
Desde o último dia 4 a abertura ao público ocorre em soft opening, atendendo às restrições impostas pela pandemia. Há opção de passeios guiados por enólogos e sommeliers, que contam a história da empresa e da família e discorrem sobre 34 rótulos à venda, entre vinhos, espumantes e sucos. O carro-chefe é o tinto seco cabernet sauvignon Capitão Chico, alusão ao apelido que acompanha Arnaldo Passarin desde a infância. Sobre seus tempos de menino no interior paulista, aliás, o empresário gosta de contar como iniciou a trabalhar ainda muito jovem. A família tinha uma pequena produção de vinhos, de legumes e de leite, e ele era o encarregado de entregar o leite para a vizinhança.
– Minha vida mudou do leite pro vinho – diverte-se Arnaldo.
A saga dos Passarin é contada em texto e fotos numa das paredes da Cave do Sol. Cristiane Passarin conta que seus bisavós, Giuseppe e Caterina, se conheceram e se apaixonaram no navio que os trouxe da Itália para o Brasil, em 1888. Tiveram 11 filhos, entre eles, Guido Passarin, pai de Arnaldo. Guido se casou com Lúcia, mulher que, segundo conta Cristiane, trouxe para a família o faro para o marketing e para o turismo.
– A casa tinha um quartinho para a produção de vinho, e minha avó, para atrair a freguesia, armou um balcão na frente de casa onde ela fazia queijinho frito, linguiça, polenta, com degustação para quem chegava – conta.
Conforme os negócios passaram a prosperar, nos anos 1950 Guido Passarin passou a comprar vinho em terras gaúchas, mais especificamente em Flores da Cunha. Arnaldo, filho caçula e solteiro, era o encarregado das viagens de caminhão desde Jundiaí, que duravam semanas.
Entre as tantas vindas para a Serra, tomou gosto pela região e decidiu empreender em parceria com a família Tonet, adquirindo uma pequena vinícola que estava desativada. Em meados dos anos 1970 conheceu Arlete Tonet, que se tornaria sua companheira inseparável e mãe dos três filhos. Em 1973, o empresário adquiriu a União de Vinhos do Rio Grande, empresa que alavancaria de vez o nome da família. É das pipas que armazenavam o vinho na agora desativada sede da União que foi retirada boa parte da madeira utilizada para a parte de varejo da Cave do Sol.
A mudança da operação de Flores da Cunha para Bento Gonçalves, com o lançamento da Cave do Sol e a realização da vocação turística da mãe, é um acontecimento que Arnaldo Passarin considera só ser possível graças união da família:
– O melhor da vida é a família. E quando temos uma família que compartilha dos mesmos sonhos, tudo fica mais fácil. Ver meus filhos engajados neste projeto é ainda mais realizador – celebra, em depoimento gravado de casa, por conta da pandemia.
Cidadão florense reconhecido pela Câmara de Vereadores em 2008, Passarin é atuante no setor vitivinícola, já tendo exercido cargos na diretoria do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin) e na Associação Gaúcha de Vinicultores (Agavi). Também é idealizador e presidente da Associação dos Produtores de Suco Puro. O filho Cristian, ao comentar sobre a mente tão ágil quanto interessada do pai, brinca que quem sofre com isso é o biógrafo contratado para escrever um livro de memórias do empresário:
– Mesmo com tanta história pra contar, meu pai não gosta de ficar falando do passado. Só interessam a ele o presente e o futuro.
Arte por todos os lados
Ao chegar na Cave do Sol, o visitante não se impressiona apenas pelo tamanho da estrutura, mas também pelo charme do projeto assinado pela reconhecida arquiteta Vanja Hertcert, especializada em arquitetura do vinho. O complexo é adornado por diversas obras de arte assinadas por artistas da região, tanto na parte externa quanto no interior do prédio. Logo na chegada, dá as boas-vindas um “sol negro” de oito metros de altura, feito a partir de um conjunto de oito antigas bombas usadas para processar uvas. À noite, iluminado, a obra é ainda mais deslumbrante.
Também com destaque, no interior da vinícola pode ser conferida a obra As Uvas do Sol, uma escultura em formato de painel que representa um cacho de uva em cobre e latão. Utilizando peças da unidade desativada, em Flores da Cunha, as obras têm a assinatura dos artistas Aido Dal Mass e Rubens Sant’Anna Filho.
Também é imperdível o surpreendente mosaico que forma um sol inca no chão da sala reservada para degustações em grupo. Recebendo iluminação natural por uma pequena abertura no telhado, trata-se de uma representação do sol iluminada apenas pela luz do próprio sol. A concepção é da designer Sirlei Chiminazzo e a criação é da artista plástica Karen Poletto Jacobs.
Cristian Passarin explica que a valorização da arte e dos artistas locais é um diferencial que a Cave do Sol busca em meio a dezenas de vinícolas e cantinas:
– Não faria sentido inaugurar uma vinícola que trouxesse apenas mais do mesmo. Vinho, arte e tradição têm que andar juntos. Ainda queremos trazer muito mais arte pra cá.
Serviço
O quê: vinícola Cave do Sol
Onde: km 20 da ERS-444, no Vale dos Vinhedos
Quando: visitações às sextas e sábados, das 10h às 17h, e aos domingos, das 10h às 16h (soft opening durante a pandemia)
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