Ao longo de quatro décadas dedicadas ao turismo, o empresário bento-gonçalvense Tarcísio Michelon, 70, conta ter se apaixonado pela cultura a ponto de considerá-la indissociável do ramo em que é um dos nomes mais bem-sucedidos do Estado. Ao conversar com a reportagem durante evento realizado na última quarta-feira, para apresentar o projeto do futuro Parque Domadores de Pedras, o idealizador do roteiro Caminhos de Pedra e proprietário da rede de hotéis Dall' Onder fez questão de frisar o ensinamento mais valioso que recebeu da mãe, Josefina Cassol, sobre a atividade turística:
— Não existe possibilidade de turismo que não seja cultural. Uma vez perguntei para minha mãe, Josefina Cassol, que foi hoteleira de 1944 a 1959, o que os turistas gostavam naquele tempo. Com sabedoria, ela me respondeu: "os turistas gostavam de tudo o que é nosso". Nunca desviei um milímetro desse caminho. Tudo o que fiz nesses quase 40 anos foi oferecer ao visitante a nossa forma única de nos relacionarmos com a alimentação, com os animais, com a arquitetura, com a arte.
Viabilizado pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura e previsto para ser inaugurado em março, numa área de 3,8 hectares ao lado da Casa da Ovelha, o parque irá contar com mais de 40 esculturas em basalto e granito, assinadas por artistas de mais de 20 nacionalidades. Algumas já estão instaladas, pois foram concebidas durante as quatro edições do Simpósio Internacional de Escultores de Bento Gonçalves _ evento que serviu de embrião para a criação do parque. Além de escultores gaúchos, podem ser conferidas criações de artistas do México, Costa Rica, Colômbia, Irã, Coréia do Sul, Espanha, Áustria, Grécia, entre outros países.
— Ao ingressar no parque o visitante irá fazer um percurso em que as obras não vão estar organizadas por épocas, materiais ou autores, mas sim de forma a proporcionar uma leitura mais poética, interagindo com a paisagem, e que o faça pensar sobre o trabalho do homem junto à natureza, em seus esforços para domá-la e controlá-la. Uma experiência que não seja apenas estética, mas que provoque uma reflexão sobre a vida e a arte. A curadoria e os arquitetos estão trabalhando muito juntos para construir esse sentido — destaca o escultor uruguaio Mario Cladera, responsável pela curadoria do parque.
Inspirado no Instituto Inhotim (MG), o parque conta com investimento de R$ 1 milhão em sua primeira etapa. Além da área a céu aberto que servirá para o passeio e apreciação das esculturas, uma casa de pedra e madeira construída nos anos 1920, na entrada do terreno, será revitalizada para oferecer atendimento ao público.
— Os imigrantes trouxeram da Itália mais de 70 ofícios e profissões especializadas, e a escultura em pedra, ferro ou madeira é um dos conhecimentos mais espetaculares. Toda essa bagagem dos nossos antepassados nos obriga a sermos pessoas muito preocupadas em produzir coisas especiais. Essa é a essência do turismo na nossa região. Teremos aqui em Bento Gonçalves um dos espaços mais importantes para apreciação da escultura moderna no Brasil — destaca Michelon.
Cultura para financiar cultura
Ainda sem preço definido, o valor do ingresso pago pelo visitante do parque será revertido para manter e expandir as atividades do Instituto Tarcísio Michelon. Fundado em 2008 e voltado para a educação musical, o ITM beneficia atualmente cerca de 200 crianças e adolescentes bento-gonçalvenses em vulnerabilidade social. Além das aulas de música, entre os projetos desenvolvidos estão a Orquestra Filarmônica, o Coro e o Quinteto de Cordas.
— Quanto maior for o sucesso do parque, maior será a arrecadação em prol da formação de músicos e cidadãos no ITM, que, hoje, ainda é muito dependente de projetos de leis de incentivo — destaca Tarcísio Michelon.
Além de servir à formação de músicos, o parque também promoverá capacitações para escultores, como cursos, oficinas e worskshops. A cada nova edição do Simpósio de Escultores, novas obras serão agregadas ao acervo, aumentando também a área ocupada pelo parque no terreno, que é propriedade de Michelon e cuja escritura prevê a ocupação pelo ITM pelos próximos 20 anos. Diretora do Instituto, Angela Martins enaltece a parceria com patrocinadores e apoiadores que abraçam o projeto.
— Num país em que as pessoas brigam pela esquerda e pela direita, temos que contar cada vez mais com pessoas dispostas a olhar para a frente, pois só assim seremos capazes de formar cidadãos melhores — ressalta a diretora.