Um dos principais papéis do Festival Música de Rua é proporcionar o acesso a sonoridades do mundo capazes de levar o espectador por um longo passeio geográfico e cultural sem sair do lugar. Mas a programação, que ocupa o estacionamento da UCS neste domingo, também propõe saborosas descobertas sobre a nossa identidade como brasileiros. Um exemplo disso deve ocorrer no show da amazonense, radicada no Pará, Keila. Pela primeira vez se apresentando no Sul, ela promete espalhar por aqui o calor e a animação do Norte por meio das batidas do tecnobrega, gênero musical mais popular daquelas bandas. Ainda assim, a artista encabeça uma versão mais hi-tech do gênero, atualizando raízes.
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– O tecnobrega que faço tem uma pegada “mundo”, tá tudo misturado, carrego hip hop, funk, kuduro, pagodão, muitas coisas atreladas ao meu tecnobrega e assim consigo dar uma caminhada por outros rumos. Fora do Brasil, ele é muito bem recebido porque é a música eletrônica feita na Amazônia, a gente tem essa carga de trazer a cultura amazônica, os grafismo indígenas que carrego muito nos meus figurinos. Mas eu misturo tudo, é como um grafismo indígena neon, por exemplo (risos) – sintetiza a cantora.
Apesar de muito bem recebido no exterior – Keila já se apresentou em festivais como o South by Southwest nos Estados Unidos, O Transmusicale na França, e o Lusotronics na Alemanha –, o tecnobrega ainda não tem a mesma aceitação em seu próprio país de origem. A cantora de 28 anos arrisca uma justificativa para tal:
– Em Belém, o tecnobrega é música do povão, da periferia. Então, existe essa resistência dentro da própria cidade. A elite sempre resiste ao que vem da periferia.
Talvez justamente por isso, Keila faça questão de valorizar o berço do gênero. No single mais recente, Vai Tremer, ela sentencia a periferia como a essência de seu som.
– É de onde vim, carrego isso no meu visual, na minha dança e na minha arte. Outros sons da periferia acabam se misturando, eu acredito nessas conexões. Tudo é instintivo de cada lugar e cresce de forma muito parecida, como as aparelhagens crescem em Belém com o tecnobrega, tem o funk no Rio com os paredões de som, tem o brega funk de Recife. Tudo com uma característica muito parecida de como as coisas acontecem de forma realmente independente e de como as pessoas fazem o dinheiro circular, de como funciona o mercado – avalia.
Revelada no trio Gang do Eletro, Keila faz parte de uma cena que tem ganhado mais espaço por meio de protagonistas femininas como Gaby Amarantos, Rebeca Lindsay e Dona Onete. A cantora explica que as mulheres sempre estiveram nas cabeças de chave do tecnobrega, a diferença é que agora elas não estão somente em cima do palco, mas também produzindo e auto gerindo suas carreiras.
– Toda carga que carrego no corpo, o fato de ser uma mulher da Amazônia, da periferia, tudo isso me inspira a criar artisticamente, para dar voz a isso – celebra.
Enquanto Keila redefiniu os rumos da carreira após se apropriar do feminismo, cabe ao público gaúcho uma apropriação do tecnobrega como uma manifestação autêntica, e que também é nossa. Então, bóra tremer?
Em Bento: no sábado, o Festival Música de Rua tem atrações em Bento Gonçalves, a partir das 15h, na Rua Coberta. O festival tem patrocínio do Natura Musical.
Programe-se:
:: O quê: Festival Música de Rua, com shows de Slam das Manas (14h30min), RAPajador + Duda (15h), Cuarteto Ricacosa (15h30min), Slam das Manas (16h20min), Ricardo Pita e Convidados (16h40min), Renato Borghetti (17h30min), Tuyo (18h20min) e Keila (19h10min).
:: Quando: neste domingo.
:: Onde: estacionamento da UICS, em Caxias.
:: Quanto: entrada franca.