Seria fácil imaginar que moradores da megalópole que ostenta cartões-postais como o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar, e praias como Ipanema e Copacabana, não se deixassem encantar por qualquer novidade trazida de fora. Ainda mais de uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, que, se não especificar, muitos deles irão confundir com a sua própria Caxias, a do Duque. Porém, quem teve a chance de ver a reação do público ao Mississippi Delta Blues Festival RJ, evento que teve sua edição de estreia no último final de semana, pôde verificar centenas de cariocas hipnotizados pela atmosfera que a cada ano reúne 10 mil pessoas na Serra Gaúcha.
Cidade que tem alguns dos músicos mais importantes da cena blueseira do Brasil, ao Rio de Janeiro faltava um evento que congregasse a maioria deles, unindo-os num line-up abrilhantado por atrações norte-americanas, britânicas e argentinas, além de expoentes da cena gaúcha – que orgulhosamente podemos dizer que não perde para a de Rio e São Paulo. E foi ao oferecer 50 shows em três noites, com apresentações simultâneas em palcos espalhados pelo centro cultural Hub RJ – complexo de prédios antigos que lembra a nossa Maesa – que o MDBF cativou o público local: a enxurrada de música e a deliciosamente agoniante sensação de estar perdendo alguma coisa relevante ao ficar parado são a melhor parte da experiência (e a que melhor faz valer o investimento considerável). Trata-se da importação do modelo dos grandes festivais de blues norte-americanos, que já deu certo em Caxias e agora foi apresentada ao Rio de Janeiro.
Mas fora a parte musical – que teve nos shows de Ale Ravanello Blues Combo, Jefferson Gonçalves e da cantora J.J. Thames os momentos mais arrebatadores –,o MDBF é um parque temático que traz ao Brasil um pouco de tudo o que envolve a cultura do ritmo nascida com os escravos nas plantações de algodão do Sul dos Estados Unidos, apontando aproximações entre as culturas. Não por acaso, tanto a filial carioca do bar quanto o festival estão localizados na zona portuária do Rio de Janeiro, local onde desembarcaram centenas de milhares de escravos e que passa por uma demorada revitalização voltada para o turismo (o sucesso desse processo é uma aposta para alavancar o bar e o festival nos próximos anos). E promover a aproximação do blues com outros elementos da cultura negra, como o samba e o hip hop, foi um dos méritos do festival, que teve a “turma do passinho” dançando em frente ao palco e coreografando o público em diversos shows, além de performances de rappers e grafitagem.
Com pouco mais de três mil espectadores, o público esteve dentro do esperado nas previsões mais realistas, apesar daquele desejo de que poderia ter dado um pouco mais (pois sempre há as previsões mais otimistas). Com as avaliações positivas dos visitantes que presenciaram uma história começar a ser escrita, a expectativa é de crescimento. Idealizador do evento, o empresário caxiense Toyo Bagoso é incansável e promete não medir esforços para levar mais esse sonho adiante. Já comemora o surgimento de propostas de parceria tão logo o festival se encerrou e a certeza de que agora tem em mãos um novo produto, não mais um projeto.
Com novas edições à vista, o MDBF RJ deverá proporcionar mais intercâmbio entre músicos, mais oportunidades para toda a cadeia de produção e levar o nome de Caxias do Sul ainda mais longe como a capital do blues no Brasil, fixando sua principal marca na Cidade Maravilhosa.
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A 12ª edição do Mississippi Delta Blues Festival, em Caxias do Sul, irá ocorrer nos dias 21, 22 e 23 de novembro, no Largo da Estação Férrea. Os ingressos já estão à venda em sympla.com.br
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