"O sol, a claridade. Esta cegueira". Assim, o hamburguense Henrique Schneider abre seu livro mais recente, "Setenta" (não-editora, 156 páginas). O autor recebe o público para um bate-papo e sessão de lançamento nesta quinta-feira, às 19h, na Livraria do Arco da Velha, em Caxias do Sul. "O sol como símbolo, algo bom a esperá-lo quando o pesadelo do erro terminasse e ele conseguisse sair." Esse sol que agora banhava o corpo de Raul, bancário dedicado e um cidadão de bem, personagem central da obra de Schneider, cegava-o, mas metaforicamente abriria a entendimento do jovem.
O romance é ambientando em 1970, em uma época em que militares ou juristas, como Alfredo Buzaid, ministro da Justiça entre 1969 a 1974 diziam: "Não há tortura no Brasil". Hoje sabe-se que havia — e em larga escala.
Na trama de "Setenta" é narrada a história de Raul, um rapaz tímido e acomodado, de 25 anos, que mora com a mãe no centro de Porto Alegre e nem dá bola para o tenso ambiente político pelo qual passa o Brasil. Nos dez dias desse recorte da vida de Raul, que é sequestrado e torturado por engano, muitas lições pode ser extraídas. Será que a relação com o nosso atual momento político é mera coincidência?
— Acho que se fala menos do que se deveria sobre a ditadura brasileira — defende Henrique Schneider, nascido em 1963, às portas do Golpe Militar, que conduziu o Brasil, de 1964 a 1985 para os tais anos de chumbo, apesar de vez ou outra o país ser taxado de Pátria de Chuteiras, termo cunhado por Nelson Rodrigues, em livro homônimo, com crônicas entre 1950 e 1970.
Olha aí, mais um elemento simbólico para o livro "Setenta".
— O livro foi escrito entre 2014 e 2015, ao longo das convulsões de rua que culminaram com o golpe, alguns chamam de impeachment, mas está cada vez mais claro que foi golpe, no governo de Dilma Rousseff — explica.
Esse clima de medo, misturado com a tristeza de ver gente defendendo a volta da ditadura, revela Schneider, sintetizam o porquê do livro.
— Por paradoxal que possa parecer, um dos temas principais do livro é a liberdade. É um livro em que a prisão e os porões clandestinos de tortura, que existiram em Porto Alegre, são panos de fundo muito presentes. Tudo é muito angustiante, no livro, e é ali, na escuridão úmida e no sofrimento da prisão, que aparece com mais força a importância vital da liberdade — defende Schneider.
Para o escritor liberdade é a palavra mais importante da língua portuguesa.
— Não por sua beleza em si, pelo som, mas pela enormidade de seu significado, tanto que eu tenho a palavra "liberdade" tatuada no braço.
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