O Japão da tecnologia, dos prédios altíssimos e das ruas incrivelmente limpas. O Japão dos personagens macabros e das histórias de terror mais aterrorizantes. Ou o Japão super colorido dos mangás e das harajuku girls. Nenhum desses clichês sobre o país habita a história de Assunto de Família, estreia desta quinta-feira (21) na Sala de Cinema Ulysses Geremia, em Caxias. Representante do Japão na categoria Filme Estrangeiro do Oscar 2019 e vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes 2018, o longa dirigido por Hirokazu Kore-eda (do aclamado Pais e Filhos) centraliza seus personagens num ambiente periférico cercado por entulhos e sufocantes espaços. Presos a essa espécie de casulo doméstico, os personagens conduzem um ensaio sobre a concepção dos laços familiares, um assunto cada vez mais explorado no cinema.
A cena de abertura de Assunto de Família mostra pai e filho furtando produtos de um mercado. Nesse primeiro momento, o diretor conduz sua história de maneira a causar afeição do espectador com a dupla de ladrões, afinal, é fácil perceber que eles são pobres e estão apenas tentando sobreviver. Esse sentimento fica ainda mais forte quando a dupla decide levar para casa uma menina que se encontra em estado de vulnerabilidade (maior que o deles, no caso). É inverno e a família composta por avó, um casal, uma moça recém-saída da adolescência e uma criança logo se afeiçoa pela ideia de amparar um quinto elemento. A menininha frágil, assustada e com ferimentos de violência doméstica parece ter encontrado seus salvadores num lar que tem condições precárias de sobrevivência, porém, afeto de sobra.
O inverno se transforma em verão e o incômodo estético conduzido pelo diretor agora surge com o sufocamento ainda mais claustrofóbico da apertada casa. Aos poucos, a história também vai mostrando a rotina de cada um dos integrantes da família quando não estão juntos. O emprego que mais chama atenção é o da jovem Aki (Mayu Matsuoka), que tira a roupa por dinheiro em cabines eróticas. Mas logo o roteiro vai pincelando cenas que revelam fragilidades veladas para cada um dos personagens, até cavar uma discussão final sobre as armadilhas contidas entre o que é certo e o que é errado.
O peso dos acontecimentos que conduzem a última meia hora de Assunto de Família parece se contrapor ao clima quase leve proposto anteriormente. O desfecho deixa a condição social enfrentada pelos personagens em segundo plano para focar em suas escolhas morais. A opção pelo formato de depoimento – o espectador vai descobrindo verdades enquanto os personagens respondem a interrogatórios policiais – pode soar um pouco preguiçosa se comparada a riqueza de detalhes que habita o resto do filme. No entanto, o corrido desfecho não é capaz de desvalorizar o olhar contemporâneo e demasiadamente humano de Kore-eda sobre o seio familiar e sobre que tipos de laços são capazes de conectar as pessoas.
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