A mensagem da edição 91 do Oscar começou a ser moldada já a partir da escolha dos indicados. Reunir entre os possíveis vencedores da categoria principal um filme falado em espanhol e filmado no México, a cinebiografia de uma estrela da música que lutou contra tabus envolvendo sua sexualidade, além de três longas com forte temática ligada a questões raciais – incluindo um blockbuster de super-herói – já deixava bem clara uma certa preocupação da Academia com o discurso da representatividade. Mas mais profundo ainda, o que prevaleceu foi um discurso a favor do amor.
Infiltrado na Klan, um dos filmes mais poderosos e antiTrump , venceu somente uma (melhor roteiro adaptado) das seis categorias em que foi indicado. Mas seu diretor, o ativista Spike Lee, fez valer a subida no palco para fazer um chamamento político aos americanos. “As eleições de 2020 estão chegando, vamos pensar nisso. Vamos nos mobilizar, estar do lado certo da história. É uma escolha moral. Do amor sobre ódio. Vamos fazer a coisa certa”, esbravejou o cineasta, fazendo referência ao título do filme pelo qual ficou famoso em 1989.
Mesmo não sendo tão contundente quanto Infiltrado na Klan ao traçar um paralelo com a contemporaneidade abordando a temática da segregação racial, Green Book - O Guia venceu como melhor filme, outra escolha carregada de atitude política. A obra, que narra o nascimento da amizade entre um músico negro e seu motorista racista na década de 1960, também rendeu ao ator Mahershala Ali sua segunda estatueta de melhor ator coadjuvante – ele é o primeiro negro a ganhar dois prêmios nesta categoria. Por falar em representatividade, Hannah Bleacher foi a primeira mulher negra da história a ganhar o Oscar de melhor direção de arte, por Pantera Negra. Dois feitos importantes.
Depois de movimentos como o MeToo e Time’s Up, surgidos em edições anteriores, falar da força feminina no Oscar virou até lugar comum. Neste ano, 52 mulheres foram indicadas em categorias que não fossem de atriz. Muitas delas chamaram atenção com discursos interessantes. Caso da dupla de cineastas vencedora na categoria melhor curta documental pelo filme Absorvendo o Tabu. “Não acredito que um filme sobre menstruação ganhou o Oscar”, brincou Rayka Zehtabchi, ao que a produtora Melissa Bertone acrescentou: “que nenhuma menina tenha sua educação interrompida por conta de algo tão natural”.
Mas a maior mensagem de amor e união do Oscar ficou mesmo por conta do longa mexicano Roma e suas imponentes três estatuetas conquistadas: fotografia, melhor filme estrangeiro e melhor diretor. Alfonso Cuarón fez um filme intimista, lento e em preto e branco retratando suas memórias de infância. A protagonista é uma empregada/babá de origem indígena. “Eu quero agradecer à Academia por reconhecer um filme centrado em uma mulher indígena, uma das 70 milhões de trabalhadoras domésticas sem direitos, uma personagem que historicamente foi relegada a segundo plano no cinema. Como artistas, nosso trabalho é olhar para onde os outros não olham”, disse o diretor.
Mas nem só de discurso viveu o Oscar, também teve Lady Gaga e Bradley Cooper cantando o hit Shallow de rosto colado e enlouquecendo os espectadores. Porque de amor inventado, a gente também gosta.
Os vencedores
Melhor filme: Green Book - O Guia
Direção, Alfonso Cuarón, por Roma
Ator: Rami Malek, por Bohemian Rhapsody
Atriz: Olivia Colman, por A Favorita
Atriz coadjuvante: Regina King, Se a Rua Beale Falasse
Ator coadjuvante: Mahershala Ali, por Green Book - O Guia
Roteiro original: Peter Farrelly, Nick Vallelonga e Brian Hayes Currie, por Green Book - O Guia
Roteiro adaptado: Spike Lee, David Rabinowitz, Charlie Wachtel e Kevin Willmott, por Infiltrado na Klan
Fotografia: Alfonso Cuarón, por Roma
Montagem: John Ottman, por Bohemian Rhapsody
Filme estrangeiro: Roma
Documentário em longa-metragem: Free Solo, de Jimmy Chin, Elizabeth Chai Vasarhelyi
Documentário em curta-metragem: Absorvendo o Tabu, de Rayka Zehtabchi
Curta-metragem: Skin, de Guy Nattiv
Longa de animação: Homem-Aranha no Aranhaverso, de Bob Persichetti, Peter Ramsey e Rodney Rothman
Curta de animação: Bao, de Domee Shi
Maquiagem/Penteado: Greg Cannom, Kate Biscoe e Patricia Dehaney, por Vice
Figurino: Ruth E. Carter, por Pantera Negra
Direção de arte: Hannah Beachler e Jay Hart, por Pantera Negra
Edição de som: Nina Hartstone e John Warhurst, por Bohemian Rhapsody
Mixagem de som: Paul Massey, Tim Cavagin e John Casali, por Bohemian Rhapsody
Efeitos visuais: Paul Lambert, Ian Hunter, Tristan Myles e J.D. Schwalm, por O Primeiro Homem
Trilha sonora original: Ludwig Göransson, por Pantera Negra
Canção original: Shallow, de Lady Gaga, Mark Ronson, Anthony Rossomando e Andrew Wyatt, de Nasce Uma Estrela