Quais são as atribuições de uma esposa? Vibrar com as glórias do marido, segurar os casacos do marido, organizar a agenda (seja a de compromissos ou a de remédios) do marido, apaziguar ânimos nas brigas familiares, e sorrir. Sempre sorrir. É claro que essa é uma definição um tanto exagerada sobre uma visão antiquada do papel da mulher no casamento, mas todas essas "tarefas" permeiam o dia a dia da personagem Joan, protagonista vivida com maestria pela atriz indicada ao Oscar Glenn Close no drama A Esposa. Estreia desta semana na Sala de Cinema Ulysses Geremia, o filme disseca a pergunta que abre esse texto de forma a refletir sobre os lugares de fala que assumimos ao longo da vida — muitas vezes não condizentes com a força de nossos discursos.
O roteiro de A Esposa, dirigido por Björn Runge e baseado no livro homônimo da autora Meg Wolitzer, acompanha o casal Joan e Joe (Jonathan Price) a partir da notícia de que ele ganhará o prêmio Nobel de literatura, honraria máxima concedida a um escritor em vida. A história se passa durante a viagem dos dois a Estocolmo, justamente para que Joe receba o Nobel. É lá, com todas atenções voltadas ao marido, que Joan decide olhar para a própria história. Com a mãozinha de um biógrafo enxerido (Christian Slater), que deseja descobrir detalhes sórdidos da vida de Joe, a esposa acaba refletindo sobre suas escolhas até então.
Apesar de a narrativa colocar Joan numa posição de certa submissão com relação ao marido, o espectador entende rápido que se trata de uma personagem cheia de camadas. Nem de longe Joan assume o papel da mulher que não se opõe ao companheiro jamais, pelo contrário, há um conflito aparente desde o começo, como se fosse uma bomba relógio esperando o momento certo da explosão. Talvez por isso a atuação cheia de nuances de Glenn Close (que merece o Oscar bem mais que Lady Gaga) impressione tanto. Atento ao domínio expressivo da atriz, o diretor explora bastante os planos fechados em seu rosto, sempre um acerto.
Joe, o escritor premiado cheio de ego em também ótima performance de Jonathan Price, faz questão de agradecer a esposa em todos os seus discursos. Uma espécie de bajulação forçada que, aos olhos de terceiros, reforça a imagem de um homem humilde e dedicado à Joan, tudo que Joe não é. É como se fosse esperado de "um grande homem" que ele agradeça ao apoio incondicional da companheira, mas até isso acaba por expor o papel secundário feminino, o da mulher que não protagoniza e sim ampara. É interessante como o filme faz o espectador se dar conta disso.
A Esposa é desses filmes que se tornam objeto para várias discussões atuais e pertinentes. Mas talvez o mais interessante do longa seja discutir o lugar de fala da mulher sem ser panfletário ou abusar dos clichês. É como se o diretor tivesse ouvido o recado que a própria Joan dá ao biógrafo do marido durante o filme: "por favor não me descreva como uma vítima, sou muito mais interessante que isso".
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PROGRAME-SE
:: O quê: estreia do drama A Esposa, de Bjorn Runge.
:: Onde: Sala de Cinema Ulysses Geremia (Rua Luiz Antunes, 312).
:: Quando: estreia nesta quinta (7) e fica em cartaz até o dia 17, com sessões de quinta a domingo, sempre às 19h30min.
:: Quanto: R$ 10 e R$ 5 (estudantes, idosos e servidores municipais).
:: Duração: 101min.
:: Classificação: 12 anos.