Quero que me permita o destino partir dessa vida antes de perder o que nela tenho de mais precioso, essa capacidade de me comover com o que é belo e com o que é triste. Recusaria-me a chamar de vida uma existência em que me botasse inerte diante do meu próprio sofrimento ou das agruras alheias, assim como das minhas pequenas conquistas ou das vitórias das pessoas que amo.
Acredito não haver doença que provoque mal maior do que a apatia. Ter o corpo saudável, mas perder o impulso de se emocionar. Achar banal a felicidade e conformar-se com a tristeza (enquanto estado permanente e não a mera melancolia dos dias cinzentos). A beleza que reside na tristeza, melhor traduzida nos versos de Vinicius de Moraes em Samba da Benção: "a tristeza tem sempre uma esperança de um dia não ser mais triste, não". Que não caiba em nós qualquer tristeza que não queira deixar de ser triste.
No necessário exercício diário da descoberta do amor próprio, que jamais esqueçamos de valorizar a capacidade de ainda derramar lágrimas. Afinal, onde há lágrimas, de felicidade ou de tristeza, há a emoção que justifica estarmos por aqui consumindo oxigênio.
Que em nossas escolhas não haja lugar para o tanto faz, nem em nossas atitudes caiba a indiferença. Que em nossas relações jamais vingue o marasmo. Que celebremos sempre nosso ímpeto de reagir e estar verdadeiramente presente. "A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem", escreve Guimarães Rosa num dos trechos que sublinhei de Grande Sertão: Veredas. E poderia a vida nos pedir bravura maior que a de encararmos o que sentimos? Deixar morrer a alegria e a tristeza é sucumbir à covardia.