Antes que uma tela preta com a inscrição com o nome do filme (A Festa) invada a visão do espectador, uma transtornada personagem feminina abre a porta de casa e aponta uma arma para a câmera, posicionada de forma subjetiva no lugar do convidado que chega. A cena inicial da obra escrita e dirigida pela premiada britânica Sally Potter tem um forte poder de comunicação: é fácil prever que as coisas não terminarão muito bem na tal festa. O longa, que estreia na Sala de Cinema Ulysses Geremia nesta semana, escancara a intimidade de um grupo de amigos convocados, a princípio, para celebrar uma vitória política. Mas uma série de revelações importantes vai acabar desestabilizando cada personagem e instaurando o caos no ambiente.
A anfitriã da festa é Janet (Kristin Scott Thomas), que caba de conquistar o almejado cargo de ministra da Saúde britânica e decide comemorar ao lado do marido, o apático Bill (na pele do ótimo Timothy Spall), e de mais três casais de amigos. A câmera naturalista da diretora percorre ambientes para ir revelando aos poucos os segredos de cada personagem. Entre os convidados, há o casal que vive uma relação abusiva, há o casal que descobre que vai se tornar uma família (e isso gera mais insegurança do que felicidade) e há o casal pela metade (só um está presente fisicamente enquanto o outro é uma presença em todas as conversas, mas não se materializa). Mas são mesmo os anfitriões que vão liderar a escalada de acontecimentos inesperados da festa, principalmente depois de Bill fazer duas revelações que colocam em risco seu casamento e sua saúde.
A narrativa traz alguns interessantes pontos de vista femininos atrelada a si. Enquanto cozinha para os convidados, Janet escuta de uma amiga "de avental, você cuida do Ministério, de um modo pós-moderno pós-pós-feminista do século 21". Brincadeira sobre uma mulher recém empossada em um cargo de poder que naquela ocasião também habita uma cozinha, terreno por muito tempo ligado à passividade feminina. Há outro momento ainda, menos bem-humorado, no qual a posição de "mulher ocupada" da protagonista é usada como justificativa para deixá-la de fora de uma situação importante que diz respeito ao seu próprio casamento _ como se fosse socialmente impossível para uma mulher ser bem-sucedida na vida privada e na profissional.
Filmado em preto e branco, o longa tem uma atmosfera mais solar no início e, conforme as revelações vão tomando conta da narrativa, a câmera da diretora chega mais próximo dos personagens, passando por vezes uma sensação de sufocamento. As metáforas também ajudam a criar esse clima de conflito: a comida que queima e enche o ambiente de fumaça, a moça que passa mal no banheiro enquanto os outros convidados vomitam verdades na sala, etc. A própria casa, único cenário do filme, poderia representar os limites de espaço dos personagens, todos aprisionados de diferentes formas em suas armadilhas pessoais.
Rápido no gatilho — tem apenas um 71 minutos de duração —, A Festa é um registro visceral sobre as relações humanas e os espaços que habitamos. A deliciosa trilha vinda direto dos discos de blues e jazz, que o personagem Bill coloca para tocar, amenizam a explosão iminente do encontro.
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PROGRAME-SE
O quê: drama britânico A Festa, de Sally Potter.
Quando: estreia hoje e fica em cartaz até o dia 9 de setembro, com sessões de quinta a domingo, sempre às 19h30min.
Onde: Sala de Cinema Ulysses Geremia (Rua Luiz Antunes, 312).
Quanto: R$ 10 e R$ 5 (estudantes, beneficiários ID Jovem, idosos e servidores municipais).
Classificação: 14 anos.
Duração: 71min.
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